quinta-feira, 14 de abril de 2022

RETORNO ÀS ORIGENS

Imagem extraída do Google

 

José Pedro Araújo

 

Com certeza foi esse o meu período mais longo de ausência da minha querência. Cerca de dois anos. Nem mesmo quando estudava em Recife passei tanto tempo sem retornar ao meu chão querido. Efeito da perversa pandemia de Covid que assolou o mundo inteiro e nos manteve distante das coisas que gostamos de fazer e ver. É bem verdade que não cortei completamente o contato, uma vez que quase diariamente usei as redes sociais para me inteirar das novidades, como também lancei mão de fotos e vídeos que retratam o meu velho e bom Curador para minorar um pouco a saudade crescente.

Enfim, o grande dia chegou. Logo cedo da manhã meu sobrinho, Dr. Andrey Araújo passou na minha casa e me levou junto na viagem que ele empreende todas as semanas para prestar seus serviços de médico na cidade berço da sua mãe.

Viagem iniciada, deliciei-me com as paisagens da estrada tão minha conhecida, mas por onde não andei por longos dois anos, como já afirmei. Enquanto o automóvel desenvolvia a sua velocidade e engolia a distância, admirei cada árvore, cada vale e morro que ia sendo enquadrados pelo meu olhar sequioso através da janela do veículo. Enquanto isso, o coração ia ficando acelerado à medida que ia me aproximando do meu objetivo, que era lançar olhos sobre o casario simples e conhecido, sobre as pessoas da minha terra saudosa, afinal.

Como tomamos a BR 226, a primeira visão não foi a do campanário da matriz de São Sebastião, primeira imagem que se tem da cidade, como quando se faz o trajeto pela outra rodovia. E assim tem sido nas últimas vezes, já que o percurso pela já citada rodovia é mais curto e melhor. Pode-se dizer que entramos pela outra ponta da cidade, pela sua saída do sul.

De qualquer forma, chequei e a emoção tomou conta de mim como já esperava. Estar de volta é delicioso.

Após retirar a bagagem, que deixei na casa de meu irmão Jônatas, onde me hospedei, logo já estava dando as primeiras pernadas pelo trecho da cidade tão conhecido para mim. Ia em busca da casa em que nasci, e que guarda tantas lembranças vivas de pessoas queridas que já não habitam lá. É sempre doloroso o retorno àquela velha casa em que nasci e passei os primeiros quatorze anos da minha vida. Lá, agora, reside meu irmão Josélio com a sua família. Mas a casa é a mesma, fez ele questão de não alterar muito a sua decoração. Os móveis também ainda são os mesmos. Assim como os bibelôs sobre eles, também os quadros nas paredes, decoração simples que ainda tem a mão e o gosto da minha mãe. Na sala de estar ainda permanece na parede aquele quadro pintado a óleo pela minha saudosa prima Rute Barros com a imagem do meu pai elegantemente trajado, cabelo alinhado de lado e o olhar sereno e doce. Preciso ainda me acostumar com minhas perdas. Os primeiros momentos são de profunda nostalgia.

Depois, saio para a rua novamente e vou me entretendo com as novidades e os novos acontecimentos e transformações por que passa a pequena cidade.

Na rua Grande, ou Magalhães de Almeida, onde ficava a nossa casa, por exemplo, lojas e mais lojas substituem os antigos lares e seus moradores foram trocados por trabalhadores do comércio. Os antigos chefes de famílias já não se encontram mais neste plano terreno, a não ser uns poucos que ainda resistem à passagem do tempo. Desses que se foram, muitos deles eram meus parentes. Uma vez que os membros da grande família Barros moravam muito próxima uns dos outros.

Tios, tias, primos, primas, amigos diletos, que até alguns anos atrás encontrávamos ao caminhar pela rua conhecida, não encontro mais na minha caminhada. Agora, pouca gente do meu tempo ainda transita por ali, e sou eu o desconhecido que passa admirando as mudanças ocorridas. E por conta disto, quase ninguém me cumprimenta e eu prossigo como um anônimo pelos três quarteirões longos que me levam até a praça da matriz, ponto central da cidade.

Contudo, muita coisa ainda permanece igual. O lindo céu ainda é o mesmo. De um azul esplendoroso que me cativa. O ar amigável e o prazer de caminhar pelas suas ruas também permanece o mesmo. Cidade polo de uma região que se desenvolve com relativa velocidade, as mudanças ocorridas são grandes, isso é fato. E eu ainda não tenho certeza se gosto disto. Afinal, juntamente com a chegada do tal progresso, vieram também as suas mazelas mais conhecidas, como a insegurança e os costumes estranhos. A nossa simplicidade foi embora para nunca mais retornar. Hoje já respiramos um certo ar cosmopolita e tentamos desfrutar das boas coisas que a modernidade trouxe.

Que os novos tempos sejam magnânimos conosco e não nos tire a nossa liberdade de ir e vir, de conversar nas esquinas das ruas e sorrir com a boca escancarada e os dentes à mostra, sem o tapume de tecido na cara que nos impede de mostrar a felicidade estampada apenas através dos olhos.

Logo estarei de volta! Espero em Deus!  

 

Um comentário:

  1. Meu amigo, sua crônica me fez viajar e sentir a mesma emoção que você ao retornar a nossa terra natal para rever os parentes, amigos e reviver lembranças e sonhos que ainda estão bem presentes nos recônditos do seu coração, um sentimento que Carlos Gardel e Alfredo Le Pera descrevem muito bem no poema abaixo:

    Retorno
    Eu posso ver o piscar
    Das luzes à distância
    Estão marcando meu retorno
    São as mesmas que iluminaram
    Com seus pálidos reflexos
    Muitas horas de dor.

    E apesar de não querer voltar
    Sempre se retorna ao primeiro amor
    À antiga rua onde o eco disse
    Que a vida dela é sua, e é sua o seu amor
    Sob o olhar zombeteiro das estrelas
    Que com indiferença hoje me vêem voltar.

    Voltar com a testa franzida
    As neves do tempo pratearam minhas têmporas
    Sentir que se é um sopro de vida
    Que vinte anos não são nada
    Que os olhos febris, vagando nas sombras
    Te busca e te chama
    Viver com a alma apegada
    A uma doce memória
    Que choro outra vez.

    Tenho medo do encontro
    Com o passado que regressa
    Para enfrentar a minha vida
    Tenho medo das noites
    Que povoadas de memórias
    Envolvem meus sonhos.

    Mas o viajante em fuga
    Cedo ou tarde para de caminhar
    E ainda que o esquecimento, que tudo destrói
    Tenha matado minha velha ilusão
    Guardo escondida minha esperança humilde
    Que essa é toda a fortuna do meu coração.

    Voltar com a testa franzida
    As neves do tempo pratearam minhas têmporas
    Sentir que se é um sopro de vida
    Que vinte anos não são nada
    Que os olhos febris, vagando nas sombras
    Te busca e te chama
    Viver com a alma apegada
    A uma doce memória
    Que choro outra vez.

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