José Pedro Araújo
Não
se aflijam com o título acima. Não vou tratar exatamente sobre política
partidária, mas sobre alguns acontecimentos ligados a ela. Mas, como teremos
eleições para diversos cargos importantes da república, vou brincar um pouco
com o assunto. E para comprovar a minha total falta de habilidade em questões
eleitorais, vou citar um caso acontecido que quase me fez perder a amizade de
um grande amigo. Certa feita, um amigo de nome Joãozinho veio me informar que
era candidato a vereador naquelas eleições. Sem saber o que dizer, pois tinha
convicção que aquele meu amigo tinha condições de ser muita coisa na vida,
menos político, fiz com ele uma brincadeira sem graça. Não por lhe faltar
atributos como honestidade e bons propósitos, mas acreditava lhe faltar o
mínimo de traquejo para desempenhar tal função. Achei de levar na brincadeira o
assunto.
E
foi assim que lhe disse no mesmo instante: “Ótimo, já tenho até um slogan para a tua campanha. Veja só que
beleza: ruim por ruim, vote no Joãozim. Que tal, não é uma boa?”.
Meu
amigo arregalou aqueles olhos azuis no meu rumo, demonstrando um misto de
surpresa e decepção, e sapecou em cima da bucha: “esse ai tu usa quando for
candidato a alguma coisa”. Quase perdi o amigo! Joãozinho ficou um bom tempo
chateado com o que considerou uma grande desfeita da minha parte. E eu, depois
da reação dele, não pude nem lhe dizer que aquilo era uma brincadeira, que
estava apenas surpreso com a notícia que ele havia me dado.
Pois
bem, com o orgulho ferido, o meu amigo se lançou em campanha com uma vontade
somente comparada aos famintos quando vislumbram um prato de comida à sua
frente. Percorreu a cidade e o interior do município em busca de votos,
palmilhando caminhos dantes totalmente desconhecidos para ele. Nem uma casa
isolada, por mais distante que estivesse do aglomerado urbano, era razão
suficiente para o meu amigo fraterno deixar de visitá-la. Nessas caminhadas,
além da palavra empenhada em busca de melhorias para a comunidade, sempre abria
a bolsa e deixava alguns trocados para pagar alguns litros de pinga para a
rapaziada. Matou boi erado e distribuiu a carne entre os seus futuros eleitores
e, em certa comunidade, até leiloou uma bicicleta novinha em folha para os
populares. E, enquanto a festa rolava, ele aproveitava para ir repassando
alguns santinhos para a galera, com uma foto colorida que o retratava com uma
cabeleira farta, do tempo em que ainda tinha cabelos. Antes que alguém fale em
crime eleitoral, vou logo dizendo que naquele tempo tudo era possível, não
tinha essa história de caixa dois, doação ilegal de campanha, essas coisas.
Pode-se
dizer que o Joãozinho incorporou o espírito do político caçador de votos, aquele
que só aparece em período de eleição, mas que, quando chega o tempo da corrida eleitoral,
vai com toda a gana em busca dos sufrágios, estejam onde estiverem. Empolgou-se,
abriu as burras - logo ele que não gastava o dinheiro dele com nada nesse mundo
- e partiu para competir com os seus concorrentes mais conhecidos e traquejados
no assunto.
Fiquei
de longe acompanhando o vai-e-vem do novo candidato com o coração partido. Será
que eu era culpado por ele se achar naquela situação? – indagava sem resposta. E
nesses momentos, vinha à minha mente a frase terrível que o havia magoado tanto
e que eu achava que havia sido decisiva na luta que ele empreendia agora.
Com
a consciência pesada, decidi que votaria no Joãozinho. Não só isso: iria
trabalhar para ajudar o amigo na campanha. E foi assim que no dia das eleições
lá estava eu com uma pilha de modelos de cédula eleitoral com o número do meu
candidato em mãos, praticando a chamada boca-de-urna. Outro crime? Pois é!
Havia,
contudo, um problema real, para o qual não me toquei na época: eu era
praticamente um desconhecido naquela cidade. Assim, prossegui determinado no
meu trabalho de cabalar votos e, armado de muita confiança, fui distribuindo as
cédulas eleitorais preenchidas com o número do Joãozinho a todos os prováveis
eleitores que passaram por mim naquele dia. Quando o meu estoque acabava, eu
voltava para casa onde um grupo de pessoas da família estava trabalhando no seu
preenchimento, e apanhava mais material. No final da manhã, eu já havia distribuído
mais de quinhentas cédulas e gasto muita saliva com os prováveis eleitores. Fui
me empolgando também.
Continuei
na parte da tarde com a mesma estratégia: cada pessoa que passava eu pedia que
votasse no meu candidato, e lhe distribuía o papel com o número dele. E, na
maioria dos casos, o simpático eleitor sempre dizia que votaria com certeza,
pois até aquele momento estava indeciso e não sabia ainda em quem votar. Então,
à medida que ia aumentado a minha empolgação, pensei comigo mesmo: “Como é
fácil conseguir votos, rapaz! Se a metade das pessoas que me garantiram votar
no Joãozinho confirmarem a promessa nas urnas, o homem estará eleito com folga!”
Assim,
no final da tarde, um pouco cansado e muito queimado pelo sol inclemente do
verão, retornei para casa com a certeza de que o nosso candidato estaria eleito
com uma excelente votação.
Bom,
para encerrar a história sem mais delongas, esclareço que ficamos todos no
aguardo da apuração que começaria somente no dia seguinte. A confiança na
vitória era total. E quando disse isso ao meu amigo, ele apenas me olhou com
aquele ar de vencedor, como a dizer: “Está vendo ai sabichão, quando acaba você
não confiava na minha grande capacidade política. Quem é bom já nasce feito, meu
filho, aprenda mais essa!”. E eu, humilhado por aquele olhar superior, me
recolhi à minha insignificância, mas continuei achando que estava absolvido da
brincadeira sem graça que havia lhe dito.
Dia
seguinte, finalmente começou a contagem dos votos para vereador. E à medida que
a apuração avançava minha certeza na vitória ia murchando qual balão de gás. Os
votos do meu candidato estavam sumidos das urnas, parecia que quase ninguém
havia sufragado o seu nome. Veio o final da apuração e os votos do Joãozinho
não apareceram. Havíamos sido miseravelmente traídos pelos nossos eleitores.
Apenas 45 honestos cidadãos haviam confiado o seu voto ao meu candidato.
Nem
é preciso dizer que à medida que o tempo ia passando, aquele olhar superior do
meu amigo ia se transformando em uma mistura de decepção e revolta. E eu, mais
acuado ainda do que quando comecei com aquela brincadeira horrorosa, meti a
viola no saco e sai em busca de uma gelada para acalmar o coração e espantar a
decepção para longe.
Candidatos,
não se empolguem muito! Tá mais fácil, nos dias de hoje, caçar Pokémon do que
votos. Eles estão escorregadios, eu diria mesmo, estão mais raros do que
enterro de anão!
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