Imagem by Google |
José Pedro Araújo
Na primeira quinzena de maio
próximo passado realizei uma viagem há muito desejada: visitamos Portugal e
Espanha. Em Portugal, país que já havíamos visitado antes, além de Lisboa
fizemos uma viagem pelo interior do país com destino ao norte. Estivemos em
cidades históricas, como Santarém, Coimbra, Braga, Porto, e Guimarães,
conhecemos alguns mosteiros e castelos históricos, tudo na maior tranquilidade,
sem a correria estabelecida pelos guias de turismo. Nós mesmos fizemos o nosso
programa, contratamos o transporte que nos levaria a tantos lugares inesquecíveis,
controlamos, enfim, o nosso tempo e os nossos relógios. Foi uma viagem
incrível, uma das mais apaixonantes entre as que temos realizado. Ao final do
trajeto por terra, estabelecemo-nos na cidade do Porto, a bela e aconchegante
capital do norte. Correu tudo como havíamos planejado. Nada saiu fora das
nossas previsões, nada escapou ao que havíamos planejado.
Terminado o nosso tempo em terras
dos nossos antepassados, seguimos para a Espanha. Mais precisamente para
Barcelona, a estonteante cidade catalã. Foram cinco dias especiais, tudo
transcorrido dentro de um planejamento para nada dar errado. E tudo transcorreu
exatamente como prevíamos. Melhor, acima das nossas aspirações. Quando
iniciamos as conversações para traçarmos o roteiro da viagem, um dos nossos
companheiros, que já tinha estado na cidade de Barcelona, bateu o pé e disse
que deveríamos nos hospedar em um dos inúmeros hotéis situados em Las Ramblas,
a avenida mais charmosa da cidade. Pesquisando os preços dos hotéis, logo concluímos
que os valores praticados naquela artéria eram muito superiores aos cobrados em
outras regiões da cidade. Mas o nosso amigo afirmou que valia a pena. E
justificou: economizaríamos tempo e o dinheiro do transporte para outras
visitas, pois dali dava para fazer a maioria dos trajetos a pé. E foi
exatamente isto o que aconteceu.
Las Ramblas, somente para
esclarecer para aqueles que nunca ouviram falar dela, ou que nunca estiveram
lá, é uma avenida especialmente traçada na região mais bonita da cidade, se é
que dá para escolher uma, pois Barcelona é de uma beleza sem par em todos os
cantos. A avenida é uma espécie de Boulevard, largo e muito arborizado, onde o
pedestre pode caminhar à vontade e apreciar tudo em volta com a maior
tranquilidade. Dizem que é a avenida mais festiva do mundo, pois o seu
movimento é igual em qualquer hora do dia ou da noite. Não dá para descrever
aqui a sensação que nos tomou ao nos vermos sentados sob uma das barracas
postadas ao longo daquela linda via, apreciando o vai-e-vem das pessoas que por
ali passavam conversando alegremente. Gente de todas as partes do mundo são
vistas caminhando e conversando animadamente. Parece uma obrigação local:
conversar bastante, gesticular muito e sorrir escancaradamente. Senti-me como
se estivesse na esquina do mundo, ponto de encontro de todas as tribos. Valeu
cada centavo de euro ter escolhido aquele ponto da cidade.
Pois foi neste em que gente de
todos os lugares da terra se encontra para conversar que foi o alvo do mais
triste, covarde e sangrento atentado terrorista mais recente. Era dia 17 de
agosto deste ano da graça.
Não pude acreditar no que vi no
noticiário. Indivíduos possuídos por um instinto animalesco, haviam atacado com
todos os requintes de crueldade a um grupo de pessoas que nunca haviam visto na
vida; pessoas que não lhe haviam causado qualquer mal ou lhes feito qualquer
ofensa. Mas, foram estas as escolhidas como vitimas do seu bestialísmo. Bestas
humanas acolhidas tão generosamente pela cidade, apossaram-se de uma Van e derramaram
o sangue inocente sobre a calça receptiva de Las Ramblas, lugar sagrado para os
transeuntes de todo o planeta, como já afirmamos. Não vou discutir aqui os
motivos de tal chacina, coisa que deixo para aqueles que gostam de encontrar
motivação ou defendem assassinos terroristas que saem pelo mundo levando a dor
e a tristeza aos lugares mais festivos, e por isso mesmo mais procurados pelas
pessoas que sonham a vida inteira conhecer. Somente gente com perfil nefasto
provoca uma carnificina como aquela, trucidam inocentes, arrastam seus corpos
pelas calçadas, e depois invocam o nome de um pseudo deus. Um falso deus, por
que um Deus verdadeiro abomina a maldade, condena o vil assassinato de pessoas
em qualquer situação. Milhões de pessoas pelo mundo adoram um Deus com o mesmo
nome daquele citado pelos assassinos de Las Ramblas, mas não é o mesmo, com
certeza, apenas são homônimos. Os verdadeiros seguidores do profeta Maomé não
sujam as suas mãos com o sangue de inocentes, e por isso devem ser respeitados
em sua crença.
Quando paro para pensar no
acontecido na tarde fatídica de 17 de agosto; quando a minha mente fica tomada
pelas imagens dos corpos estraçalhados e jogados na Ramblas, não mais recordo que
a menos de trezentos metros do local em frente ao Mercado de La Boquearia,
ficava o meu hotel, e em frente a ele costumava-nos nos abrigar sob uma tenda
que fazia às vezes de bar e restaurante, instalada em plena avenida. Esqueço-me
que lá descansávamos todo final da tarde das canseiras do dia de muita
caminhada pelos incontáveis pontos turísticos situados ao redor, e lá degustávamos
uma enorme taça de cerveja bem gelada, enquanto observávamos o incessante
passar de pessoas para lá e para cá. E como nos sentíamos felizes ao transitar
por aquele pedaço de paraíso terreal!
A pergunta que me faço neste
exato momento é como me sentiria se para lá retornasse. Ainda sentiria o mesmo
prazer que senti ao me sentar naquelas cadeiras, sob as tendas de toldo branco
para observar a movimentação de tantas pessoas felizes que por ali passavam
tagarelando? Provavelmente, não mais. Hoje, com muito boa vontade me abrigaria
em um ponto que me mantivesse imune ao ataque de bestas sanguinárias. Talvez me
postasse sob a proteção do tronco de alguma das inúmeras árvores que enfeitam e
dão um aspecto especial à bela avenida catalã. Somente assim me sentiria
protegido do ataque de outras bestas humanas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário