Turma do CPD 1969 - O autor é o último da esquerda para a direita |
José Pedro Araújo
Ontem, em entrevista concedida ao
programa Sarau 16, da TV Assembleia, fui instado a falar pelo entrevistador, o
notável Otávio César, sobre os motivos que me levaram a escrever sobre a minha
terra querida. Quase não paro mais de elencar as várias razões que me levaram a
fazer isso. Ainda muitos motivos ficaram sem espaço em decorrência da brevidade
do tempo de uma entrevista, mesmo tão alongada como foi esta. Antes disso, a conversa
se deu, ainda fora do ar, sobre os valores do velho Curador, cidade que o
entrevistador afirmou ainda não conhecer. Hoje pela manhã, ainda acordando
lentamente de uma noite bem dormida, passei a rememorar tudo aquilo que
conversamos. E então me veio à mente os meus últimos dias de residência na
minha querência, os momentos de insegurança e de saudade antecipada que me
envolveu naqueles dias de dezembro a março de 1969.
O meu tempo na minha terra estava
se esgotando rapidamente, pois sabia que talvez não voltasse mais a morar por
ali. E isso de fato ocorreu. Até agora, pois não costumo fazer tentativas de premunir
o futuro. Depois das festividades da formatura, que aconteceu no salão paroquial,
veio-me aquela sensação de desamparo, de ruptura com os meu pretéritos quinze
anos vividos em meio a minha família, aos meus amigos, ao meu habitat, enfim. Tudo isso permeado com uma grande indefinição:
aonde iria para dar continuidade aos meus estudos? Essa pergunta se arrastou por
muitos dias. Até que meu pai bateu o martelo e falou que o meu destino seria
Teresina, capital do seu estado natal, e onde possuía muitos parentes e amigos.
Decidido isto, certo dia ele
partiu em viagem à capital piauiense para tentar me matricular em algum
estabelecimento do curso secundário. Meu pai era muito decidido e não costumava
recuar frente aos problemas que lhes apareciam. Naquela época, atravessava uma
grave crise financeira, uma vez que tivera que encerrar as suas atividades
comerciais, fechando a sua loja de tecidos. Já em Teresina, foi em busca de
alguns parentes para solucionar o primeiro problema: a minha matrícula em um
colégio público, onde pudesse eu estudar gratuitamente. Bateu às portas do
Palácio de Karnak, sede da governadoria do estado, em busca de um primo em
segundo grau, Coronel Aurino Nunes, que desempenhava as funções de secretário
do governador Helvídio Nunes, também seu parente. E de lá já saiu com um
bilhete endereçado ao diretor do Liceu Piauiense (Colégio Estadual Zacarias de
Góis), uma solicitação para que aquele diretor providenciasse uma vaga para mim
naquele estabelecimento de ensino.
Ao ser recebido pela maior
autoridade do colégio, deu-se a conhecer e falou sobre as razões do pedido da
sua audiência. O Diretor respondeu rapidamente que sentia muito, mas o período das
inscrições, e até mesmo para os testes para ingresso no colégio, já tinham
acontecido dias antes. Portanto, não havia mais o que fazer. Meu pai sacou do
bolso o bilhete enviado pelo Secretário do governador e o entregou para ele,
que o leu rapidamente, e depois retrucou: “por que o senhor não me entregou
logo o bilhete? Isso aqui é uma ordem, apesar do cuidadoso e educado termo de
solicitação!”
E de imediato chamou uma senhora
da secretaria para solucionar o problema, ou seja, realizar a minha matricula.
Mesmo fora dos prazos, mesmo sem fazer os exames obrigatórios para ingresso no
colégio. Antes que façam algum juízo sobre o acontecido, devo dizer que o meu
pai não tinha muitas opções naquele momento, e o meu ingresso no colégio, mesmo
tomando um atalho, não prejudicou a ninguém, posto que não ocupei a vaga de
nenhum outro aluno que tenha seguido os trâmites normais. E eu honrei cada aula
assistida, dediquei-me com afinco aos estudos e logrei bons resultados naquele
estabelecimento de ensino.
Na hora da matrícula, surgiu um
problema: meu pai havia se esquecido de levar as duas fotografias 3x4 que eram
necessárias para serem afixadas nas fichas de matrícula. Mas a senhorinha
encarregada pelo diretor resolveu o problema rapidamente: apanhou na sua bolsa
duas fotos de um neto mais ou menos da minha idade e pregou-as nas fichas.
Pediu ao meu pai que, quando eu viesse para o início das aulas, trouxesse as
fotografias para ela fazer as substituições. Tanta simpatia daquela senhora lhe
era um atributo que nascera com ela, uma pessoa já idosa, mas muito carinhosa e
de fino trato. Mas havia uma outra razão: logo meu pai descobriu ser aquela
senhora uma sua parenta, descendente dos Araújo de Picos, que também era a sua
terra natal.
Vencida essa etapa, que
comemoramos com muita alegria, havia uma questão crucial a ser resolvida: em
que lugar eu iria morar em Teresina? Mas meu pai sempre foi um homem movido à
esperança, além de muito firme nos seus propósitos. Quando perguntado sobre
isso, ele me respondeu: o futuro Deus proverá! E Ele realmente proveu. Através
de um amigo comum, que intermediou a conversa, surgiu o senhor Manoel Pepita,
um nobre servo de Deus que residia nas imediações da ponte metálica de
Teresina, e que me acolheu até que eu encontrasse um local para ficar. Passei
com a sua família os primeiros quatro meses da minha já dilatada residência na
capital piauiense. E o melhor: passei a residir muito próximo ao Liceu, e nem
precisava tomar condução para chegar até lá.
Resolvido todos os problemas para
a minha mudança, restou-me aquela adrenalina aumentada a cada dia que passava e
que se aproximava da data da minha partida para a capital Mafrense. Sabia que,
uma vez saindo de casa pela primeira vez, dificilmente retornaria para lá para
residir definitivamente. Restaria os meus períodos de férias. Eu teria que me
contentar com eles. E isso me trazia muitas tristezas. Até que chegou o dia da
minha viagem, e nesse dia sai pelo quintal da minha amada casa abraçando e
beijando cada árvore que lá existia. Estava com o coração dilacerado por deixar
para trás a minha família, os meu amigos, mais também aquele lugarejo tão
pequeno e tão amado, e de tantas lembranças que carregaria comigo pelo resto da
minha vida.
Havia ainda um problema a ser
superado: da minha turma de concludentes, somente eu iria para Teresina. Os
outros partiriam para São Luís, e alguns outros, por absoluta falta de
condições, continuariam seus estudos na própria cidade, onde restavam duas
opções: os cursos de contabilidade e o de preparação para professor. Menos mal
que no ano seguinte passei a contar em Teresina, na mesma república, com um
grande amigo desde os tempos do grupo escolar Murilo Braga: Jean Carvalho de
Souza. E isso teve um peso positivo grandioso na minha vida, por tudo que
representou para mim a sua amizade. Mas aí já é outra história.
Amigo, pelo texto o senhor prevaricou e usou de uma corrupçãozinha foi cedo
ResponderExcluirEssa crise que o nobre amigo fala, foi decorrente da reforma financeira e bancária feita no governo Castelo Branco e que continuou no governo do presidente Costa e Silva. Sustou o crédito bancário e faliu comércios e empresas em nossa Curador.
ResponderExcluir