Veneza vista do alto do Campanário de San Marco(foto do autor)
VENEZA (Parte 1)
José Pedro Araújo
Q
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uem nunca sonhou conhecer Veneza,
andar de Gondola por seus canais, dar milho aos pombos da Piazza de San Marco, ou
simplesmente se sentar naquelas cadeirinhas multicoloridas para degustar um
Capuccino? Pois isso era voz corrente entre o nosso grupo. Todos estavam
ansiosos por conhecer La vecchia citá, aquela
que emerge da laguna. Chegamos a Mestre, a parte continental de Veneza, no final
da tarde e fomos logo preparando-nos para a visita noturna. Visita que faríamos
ao centro da cidade, localizado em uma das ilhotas no meio da laguna. Após as
formalidades iniciais, trocamos de roupa rapidamente e embarcamos em nosso
ônibus que nos levaria até a margem do mar lacustre. De lá partiríamos em um
barco de dois andares que nos deixaria em um píer localizado no outro lado da
cidade. O primeiro contato com o centro de Veneza é algo indescritível. A
primeira pergunta que nos ocorre é: será que eu estou aqui mesmo?
Seguindo pelo
Grande Canal (Gran Canal), íamos avistando o esplendor daquela cidade bela e
inconcebível, que desafiou a inteligência dos engenheiros da época, pois
tiveram de erguê-la em terreno lamacento e instável. Fizeram uma obra incontestável
e de uma beleza inigualável. A sombra da noite escondia um pouco alguns prédios
comerciais, mas as luzes dos palácios refletidas nas águas davam um aspecto de
contos de fada àquele primeiro contato com a Veneza dos filmes de amor e de
encantamento. As luzes no interior dos prédios à margem do canal realçavam a
beleza das construções que foram sendo erguidas por mercantilistas e
endinheirados de todos os naipes em um regime de competição acirrada para se
saber quem fazia a melhor e mais bela moradia. Para isto, não regateavam e mandavam
buscar os mais renomados arquitetos da época dourada que inflava o comércio de
Veneza e enchia as suas burras de
dinheiro. Saudável competição de egos. Fizeram um dos mais belos lugares do
mundo em meio a uma laguna insalubre.
Logo que o Vaporeto ancorou no cais descemos
apressadamente para pisar naquele solo sagrado com as emoções aflorando por
todo o corpo. A noite escondia o semblante de todos nós, mas, ao me tomar como
referência, posso interpretar o sentimento dos demais membros do nosso grupo.
Estávamos pisando as pedras seculares da velha Citá que externa o luxo e o
esplendor de uma era comercial em que os navegantes venezianos dominavam o
mundo com os seus navios mercantes. Deste ponto, partiam em busca de riquezas
para aquela pequena ilha da fantasia. Caminhado apressadamente, chegamos ao
ponto essencial da cidade: a Praça de San Marco. À noite ela parecia ainda mais
bela. Inebriados nos metemos pelas vielas do centro e fomos até a Ponte do
Rialto, ponto também culminante. Passamos ali bons momentos ouvindo o nosso
guia discorrer sobre a história daquela pequena ponte em formato de arco de
modo a permitir a passagem das gôndolas e demais pequenas embarcações sob ela. Primeira
travessia a ser construída sobre o Gran Canal, ela também ambientou tantos
filmes, que virou nome de cinema em diversas partes do mundo.
Depois das
fotos de costume, voltamos pelas vielas estreitas e sinuosas até a praça central,
aquela dedicada a San Marco. Observamos que nos muitos bares e cafés no entorno
da praça as mesas estavam muito vazias. Logo saberíamos o porquê.
A
visita foi curta. Deveríamos voltar para o Vaporetto que retornaria a Mestre às
nove e quinze da noite. Era isto ou passar a noite na ilha. Resolvemos não
arriscar e voltamos apressadamente para o lugar aonde havíamos deixado o nosso
barco. No dia seguinte voltaríamos para a famosa praça e visitaríamos os monumentos
mais importantes que naquela hora já estavam fechados. Por outro lado, o corpo
já estava fatigado e pedia o aconchego de uma cama limpa, macia e quente para
descansar do puxado dia. Buonasera, Veneza!
Como já
dissemos, ficamos hospedados em Mestre, parte continental, situado a 10 km de
distância da ilha famosa. A paisagem do entorno não é propriamente o que se
espera ver da Bella Itália. A depressão do terreno é recoberto por água sempre
que a Laguna se eleva obedecendo o ritmo das mares. E por isto, a vegetação
rasteira apresenta-se cinzenta e desfolhada, tornando a paisagem feia, um tremendo
contraste com a beleza das obras erigidas pelo homem há séculos. Talvez seja
este um dos poucos exemplos em que a natureza esteja suplantada pela mão humana
em sua beleza comparativa. Assim, manhã ainda fria, embarcamos novamente para
conhecer as belezas que a cidade famosa tinha para nos mostrar. O passeio de
barco já é uma aventura indescritível. Visitávamos Veneza em todo o esplendor
do sol da manhã, agora cintilante.
À medida que
avançávamos pelo Grande Canal, a beleza ocultada pela escuridão da noite anterior
ia se mostrando por inteiro na exuberância de um lindo dia de sol, no seu afã
de sempre se superar a cada instante. E assim fomos navegando pela laguna, sempre
contornando o centro da ilha. Estávamos em busca de Murano, outra das ilhotas
que compõe a colcha de retalhos que é a grande Veneza. No cais fronteiro à
oficina escolhida para visitarmos, o simpático gerente do empreendimento nos
recebeu com o hit “Delicia, delicia,
assim você me mata, ai se eu te pego!” Foi o máximo. O nosso anfitrião era,
de fato, um lídimo representante dos grandes comerciantes venezianos. E com a
sua simpática acolhida, deixou-nos mais a vontade ainda para começar aquele dia
e acalentar o nosso sonho. É lógico que ele também tiraria proveito daquilo,
pois conseguiu nos vender uma boa quantidade dos produtos de Murano.
Fomos
introduzidos em uma espécie de anfiteatro para assistir a fabricação das
inigualáveis peças de decoração com a marca Murano. Depois da demonstração de
habilidade, veio a parte que mais gostamos de fazer quando em viagem:
adentramos à loja da fábrica para nos encantarmos com uma infinidade de peças
de cristal, cada uma mais bonita que a outra. Como sair de um lugar como aquele
sem gastar mais do que havíamos previsto? Bom, sem encontrar uma resposta para
a pergunta, largamos de lado o receio e compramos algumas peças para levarmos
conosco. Nesse instante não dava para dizer quem é mais gastador, homem ou
mulher. A algazarra que fizemos envolvia indistintamente os dois sexos. Depois
nos arrependeríamos um pouco, pois teríamos que carregar com o máximo cuidado
aqueles cristais em todo o restante da viagem. Bem que o nosso orientador,
Henrique, nos havia avisado. Mas, como provar depois que havia estado em
Murano? Sei, sei. Havia as fotos, mas isso não era bastante para nós. Depois,
hoje, podemos olhar para essas peças adquiridas e a felicidade daquela estada
na ilha famosa volta a habitar o nosso dia a dia. Valeu a pena, mesmo que fosse
somente por isso.
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