A vida na Vila de
Curador
José Pedro Araújo
O que
podemos afirmar com certeza é que bem antes de 1896, a vila do Curador
começou a se organizar. Talvez nos idos 1877, período da grande seca que
assolou o nordeste, atingindo parte do Maranhão também. Então, aproveitando-se
da faixa de terra mais elevada localizada entre a lagoa do Curador, o riacho
Firmino e o rio Preguiça, que a transformava na nossa Mesopotâmia, os pioneiros
foram construindo suas casas rudimentares obedecendo ao sentido Leste-Oeste, a
partir das imediações da dita lagoa, e rumando para o pequeno outeiro, lugar
onde hoje se situa a praça da matriz de São Sebastião.
Á falta de material cerâmico,
utilizavam-se da palmeira do babaçu abundante, da madeira farta e da ótima
qualidade do barro existente para erigir as taipas e cobrir os primeiros
prédios residenciais.
As casas
espaçadas ficavam separadas umas das outras por currais, capões de mato ou
sítios, e foram sendo construídas subindo o pequeno morro até o largo da
igreja, serpenteando, sem muitos cuidados em seguir uma reta ou alinhamento bem
definido. Nesse largo, que se tornaria o ponto central da vila, além da
rudimentar capela, erigida em intenção a São Bento - construída a princípio de
taipa e coberta de palha de babaçu – surgiram rapidamente por volta de dez
casas, construídas no mesmo padrão da capela. Neste local, nos primeiros anos
do século 20, aconteceu um grande incêndio que reduziu à pó cerca de sete
residências, constituindo-se no maior sinistro ocorrido no princípio da vila.
Esta capela, construída inteiramente a
expensas da comunidade, mais tarde ruiu, para desgosto dos devotos e iniciados.
Mas novamente os moradores a levantaram. Dessa vez de adobe cru, mais sólida,
seguindo padrões de maior segurança e conforto.
São Bento
foi o padroeiro escolhido para dar nome a ela, não por uma devoção fervorosa da
senhora que a levantou em primeiro lugar, mas em decorrência dos variados tipos
de cobras e animais peçonhentos que infestavam aquele morro. Depois,
desconhecendo-se o compromisso de quem primeiro habitou essa região, quando a
capela simples foi demolida para dar lugar ao majestoso templo que hoje temos,
o nome do santo padroeiro também foi substituído. Passou-se a homenagear São
Sebastião.
Situado à cerca de 100 quilômetros do
município sede, aos poucos esses desbravadores foram construindo também os
acessos para outros lugarejos, em trilhas abertas na mata por onde os tropeiros
tangiam seus animais. Tratava-se de simples caminhos para tropas de animais,
despretensiosas picadas que ao longo do tempo foram ganhando uma feição mais
alargada, lisa, já possibilitando o tráfego de carros-de-boi.
Foram longos anos de total isolamento,
quando uma viagem à cavalo até Barra do Corda durava muitos dias, varando a
mata fechada. Era preciso transpor os vários riachos e rios que obstaculizavam
o caminho. Esse tempo de viagem caiu depois para menos de dois dias, um avanço
considerável. Construíram-se caminhos para Caxias também, centro mais
desenvolvido situado a leste, e ponto de irradiação para os sertões. Fazia-se o
percurso em quatro a cinco dias, desde que os animais não estivessem
transportando carga muito pesada. Já a capital, São Luís, ficava em lugar
inatingível, tão distante que apenas uns poucos cidadãos a conhecia. Tratava-se
de privilégio para poucos ir à capital de todos os maranhenses.
Todas essas dificuldades, contudo, não
se constituíam em impedimento para as centenas de cidadãos que começaram a
chegar de todos os lados, para juntarem-se aos que aqui já se encontravam, e
trabalharem com afinco até construírem o lugar de seus sonhos.
O registro civil, o registro de
imóveis, ou atividades equivalentes, só podia ser realizado na sede do
município, Barra do Corda, o que, pela distância obrigava muitos pais de
famílias a manterem seus filhos sem registro de nascimento até a idade adulta.
Por conta disso, a identidade dessas pessoas não era do conhecimento das
autoridades nos levantamentos realizados junto aos cartórios. Ficavam fora das
estatísticas oficiais para o bem e para o mal.
Acorreram também para a vila que se
formava outros desbravadores que já exploravam diversas fazendas situadas na
região, formando-se logo uma comprida rua, nesse local sem acidentes naturais,
como riachos, ou morros muito elevados. Foi nesse período que começaram a
aparecer também as casas de negócios. Atribui-se também à senhora Luvandoura
Melo, prima em primeiro grau de D. Marica Melo, e que viera para a região
acompanhando o casal de parentes, a abertura da primeira casa comercial do
vilarejo. Ao que parece, seu comércio não chegaria a prosperar como era de se
prever, e logo outras pessoas também abriram pequenas casas comerciais,
iniciando-se o que é hoje o maior centro comercial da região do Japão.
Como foi dito anteriormente, foi a
senhora Luvandoura Melo quem também erigiu a primeira capela no povoado.
Construção rústica, que com suas paredes de taipa e cobertura de palha,
protegia um piso simples de chão batido, e um altar humilde sem a solenidade do
existente nas igrejas importantes. Contudo, o local logo passou a ser procurado
por um grupo de pessoas da comunidade para rezar, suprindo a falta de um templo
melhor erigido.
A povoação
tomava novo impulso à medida que as secas se abatiam sobre os nordestinos de
outros estados nordestinos. Grandes contingentes dos chamados “retirantes”,
chegavam à região em lombo de animais ou a pé, a princípio, e depois nas
carrocerias dos caminhões, os conhecidos “paus-de-arara”, em busca de lugar
seguro que os abrigasse da seca que lhes açoitava duramente na terra natal. Foi
assim nas grandes secas de 1915 ou 1932. Ou nas que sucederam estas. Sempre que
faltava chuva por lá, aumentava consideravelmente o número de habitantes daqui.
Para mostrar as dificuldades enfrentadas
pelos pioneiros, como viviam e se alimentavam, discorreremos sobre alguns
aspectos que são do conhecimento de muitos que ainda estão entre nós, mas, que
são obscuros para os mais jovens, ou para os que virão no futuro a habitar
essas terras. Que fique claro que não se constrói uma cidade em uma região de
difícil acesso como a nossa sem uma dose acentuada de coragem, e certa atração
pelo desconhecido. Homens destemidos e valorosos saíram de suas terras já
colonizadas para reconstruírem suas vidas em uma região onde a natureza se
mostrava receptiva, mas os problemas da falta de infraestrutura eram
gravíssimos, a começar pela falta de estradas de acesso e de todos os demais
serviços públicos. No próximo post
trataremos sobre usos e costumes na vila.
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