terça-feira, 19 de agosto de 2025

O Terreiro de Mãe Toinha: Mistério, Fé e Destino em Presidente Dutra!

 

Montagem fotográfica do autor


Por: Orfileno Gomes(*)

 Durante minha última visita a Presidente Dutra, em abril de 2025, o acaso — ou quem sabe um chamado ancestral — conduziu-me a um encontro singular. Estava na (deckconvenienciapk), quando fui informado pelo atendente, que havia na parte externa do ambiente, uma senhora de modos humildes que se identificou como filha de Mãe Toinha, célebre liderança espiritual da cidade que desejava falar com o Rapozão (alcunha quando fui candidato em 2012) sobre o aniversário de existência de 94 anos de sua mãe.

Com naturalidade e humildade foi permitida sua entrada para formalizar o convite especial para conhecer o terreiro fundado por sua mãe — um espaço envolto em mistério, consagrado às tradições do Tambor de Mina, Terecô e Macumba. Aceitei o convite com respeito e, como exigia o ritual, preparei-me com vestes inteiramente brancas. Fui só. Mãe Toinha havia solicitado que eu comparecesse desacompanhado.

O terreiro, localizado na periferia de um grande bairro de Presidente Dutra, não é fácil de encontrar — e essa dificuldade parece fazer parte do processo espiritual. A localização exata, aliás, é mantida em segredo por determinação da própria Mãe Toinha, o que reforça o caráter reservado e sagrado do lugar. Terreiros como esse, enraizados nas matrizes africanas e nas heranças indígenas do Maranhão, costumam se manter em silêncio discreto, guardando com zelo sua ancestralidade e resistindo à intolerância histórica.

Cheguei ao local por volta das 18h30, no dia 22 de abril. Fui acolhido com seriedade. No centro do terreiro, uma cadeira confortável havia sido especialmente disposta para mim, diante de um altar rústico, mas cuidadosamente ornamentado com elementos das divindades ali cultuadas.

Mãe Toinha, embora de idade avançada, apresentou-se com firmeza, identificando-se como um Espírito de Luz. Nas mãos, segurava um ramalhete perfumado. Com voz serena, pediu que eu depositasse sobre a mesa todo o dinheiro que havia levado. Antes de ir ao terreiro, retirara R$ 500,00 no Banco do Brasil, e pretendia deixar apenas R$ 300,00 como oferenda. No entanto, percebi que ela sabia exatamente quanto eu carregava — e ali se confirmou que, naquele ambiente, nada se oculta aos olhos do sagrado.

À sua frente, repousavam recortes de jornais com fotos de diversas figuras da política local. Reconheci os rostos: Valeriano (a quem ela chamou de Vavá), Lindomar Lucena (apelidado de Vira-lata), Remy Soares (o Rei do Gado), Joaquim Figueiredo (Tião Galinha), Irene Soares (a Pipira), Juran Carvalho (o Pato) , Raimundo Carvalho — apelidado de Cururú) e, para minha surpresa, também havia uma foto minha, com a alcunha de “Rapozão”.

Segundo Mãe Toinha, esses apelidos que o povo concede aos políticos não são simples brincadeiras, mas dons espirituais. São sinais de predestinação. “Ninguém recebe um apelido sem que isso tenha origem espiritual”, afirmou ela. Com um gesto lento e firme, estendeu o ramalhete sobre minha cabeça e declarou: “Você será ungido prefeito.”

Disse mais: que já recebera, de seu guia espiritual, a revelação do ano do meu mandato e até da minha morte — a qual, segundo ela, virá em idade avançada. Recusei-me a saber tais datas. Que o futuro cumpra seu papel no tempo certo, sem precipitar ansiedades.

Logo em seguida, manifestou-se no espaço o Espírito Eliodoro, patrono do terreiro. Um homem negro, de voz mansa, que serviu em vida ao Coronel Honorato Gomes, segundo ela, como seu ajudante de ordem. Em sua manifestação, revelou lembranças da minha infância — citando com precisão gestos de afeto e generosidade que eu, menino, dedicava a ele e à sua família. A memória veio viva: Eliodoro, quando passava pelo pequeno comércio do meu pai, sempre me presenteava com doces antes de seguir para o antigo terreiro…

(*)


Orfileno Gomes, é poeta, administrador de empresas, jornalista, advogado e concluinte do Curso de Medicina.


sábado, 16 de agosto de 2025

MINHA TERESINA

 

Imagem do Google


                                           Luiz Duailibe Fernandes (*)

Teresina, Teresina!

Cidade Verde – Menina -

Princesinha do Brasil!

Fonte de luz e calor,

Berço de paz e amor

Terra de belezas mil!

 

Teresina, eu te saúdo,

Eu te saúdo por tudo

Que diz tua tradição...

Pelo teu calor tão quente,

Que tosta a pele da gente,

Palpitando coração!

 

Pelo teu céu azulado,

Mais lindo, mais estrelado

Da Constelação Divina;

Donde o sol - com mais fulgor –

Derrama luz e calor

Por sobre ti – Teresina!

 

A lua plena, bonita,

Da passarela infinita

As noites vai clareando!

E a chapada cor de prata

Sua beleza retrata –

O agreste – prateando!

 

Pelo piscar do corisco,

Brilhando no céu – em risco...

Chuva em temporal caindo!

A Capital irrigando,

A população rezando,

Proteção a Deus pedindo.

 

Pelos trovões malcriados

Que quando são disparados

Treme a terra n’amplidão

Num eco triste... profundo...

Parecendo que o mundo

Vem caindo sobre o chão!

 

Pelos rios caudalosos

Que te abraçam...vagarosos

Correm correm para o mar...

O Parnaíba, o Poty,

Orgulho do Piauí,

Riqueza imensa – sem par!

 

No calor do teu abraço,

Na verde paz do regaço

Comemoram lindo feito!

O Poty, vindo de longe,

Encontrando o “Velho Monge”,

Adormeceu no seu leito!

 

Tesouro que a Natureza,

No seu poder de grandeza

Deixa-te como legado.

E desse enlace que fascina,

Tu nasceste Teresina -

Capital Verde do Estado!

 

Diferente das demais

Litorâneas Capitais

Do Nordeste brasileiro.

Lindamente planejada

Sobre esta verde chapada,

Num projeto pioneiro.

 

Ruas, praças, avenidas,

Previamente definidas

Com detalhes de riqueza,

Aviventando a cultura

Na arte da arquitetura,

Num cenário de beleza!

 

Teresina eu te saúdo,

Eu te saúdo por tudo

Que quis dizer mas não pude...

Por tudo que há de novo

Pela proteção do povo,

Na cultura da saúde

 

Pelo verde da esperança,

Do progresso, da bonança,

Verde que te faz brilhar

Pela força do calor,

Do trabalho e do amor,

Que o Piauí sabe dar!

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(*)

Luiz Duailibe Fernandes é poeta, piauiense de Gilbués, formado em Direito pela Faculdade de Direito do Piauí, Contador, formado pela UFPI, Procurador Federal da UFPI, aposentado.


domingo, 3 de agosto de 2025

O silêncio é um luxo

 

Imagem extraída do Google


Luiz Thadeu Nunes e Silva(*)

Em um mundo cada vez mais barulhento, há silêncios que não são rendição, mas escolha. Escolher entre gritar, se posicionar, se fazer notar, ou permanecer calado, apenas a observar seu entorno. Nem sempre quem cala é fraco ou sem argumentos — às vezes, está apenas cansado de gritar para quem não ouve. Falar para ausentes, para quem não quer entender o que se quer dizer. Inúmeras vezes, mesmo sabendo que estamos certos, pregamos no deserto. Quantas vezes mostrando o óbvio, o interlocutor não quer ouvir.

É preciso coragem para não reagir, sabedoria para não se explicar a todo instante,

e maturidade, para deixar o que não merece resposta seguir seu rumo.

O silêncio fala. O silêncio diz muito. E, muitas vezes, diz exatamente o que precisa ser dito: que a paz vale mais do que o orgulho, que nem toda guerra vale a batalha, e que a melhor resposta é a leveza de quem segue em frente.

O mundo em que nos insere é dual: complexidade e aparente simplicidade, um enigma tecido em camadas de transparência e opacidade. Há, sob a aparente banalidade do cotidiano, uma profundeza abissal, quase metafísica, que exige do sujeito uma escuta rara, uma atenção quase contemplativa, para ser intuída. A realidade, portanto, não é aquilo que se mostra à superfície, mas aquilo que pulsa por baixo dela, um subterrâneo de significados que só a sensibilidade desperta é capaz de decifrar. Viver é, nesse sentido, uma arte hermenêutica, que exige interpretação, nuance, abertura ao mistério. Viver é arte do compreender, do aceitar o que não se pode mudar. É saber ressignificar o dia a dia, mesmo diante das circunstâncias. Viver é remendar o tênue do tecido da vida, continua e permanentemente. “O que a vida quer de nós é coragem”, Guimarães Rosa.

Somos simultaneamente espectadores e agentes do real, atores em um palco que se dobra sobre si mesmo, onde o enredo se escreve enquanto o representamos. Neste duplo estatuto de ser e perceber, desenha-se a gênese da autoconsciência. Não nos compreendemos como entidades isoladas, mas como seres móveis e mutáveis em uma rede de forças simbólicas e afetivas, que nos atravessam e nos constituem.

Há um mundo que sobrevive sustentado por ilusões frágeis, tão frágeis que um sopro de consciência é suficiente para fazê-las ruir. Ilusões que não se sustentam por sua beleza, mas pela covardia que teme confrontar o concreto. Nesse mundo, o que se sonha não se crê, o que se deseja não se assume, e o que se pensa se disfarça de leveza para não carregar o peso do comprometimento.

A arte, nossa salvadora contumaz, não é apenas ornamento, mas resistência. É o grito que o silêncio entoa quando não há mais espaço para o óbvio. Cada palavra escrita, cada forma moldada, cada nota composta, constitui um ato de desobediência contra a ditadura da normalidade. A rotina é a liturgia do conformismo, e a repetição, seu cântico fúnebre. Mas, quem pensa, dança fora do compasso, tropeça de propósito, cai em abismos voluntários, apenas para encontrar, lá no fundo, uma verdade que escapa aos olhos acostumados à luz rasa. Porque pensar, também, é ato de transgressão.

O isolamento, longe de ser clausura, é um espaço mágico. Não é fuga, mas mergulho. Um retorno a si, ao âmago onde a dúvida germina como semente fértil. Ali, o ser se reinventa, e o pensar não é mero exercício cognitivo, mas sacerdócio interior. A dúvida, então, não é veneno, mas elixir que alimenta o espírito, o protege da decomposição pela rotina.

Em tempos de muitos decibéis, de máxima exposição, o silêncio é um bálsamo.

(*)




Luiz Thadeu Nunes e Silva é 
Engenheiro Agrônomo, escritor e Globetrotter. Autor do livro “Das muletas fiz asas”.

Instagram: @luiz.thadeu

Facebook: Luiz Thadeu Silva

sexta-feira, 18 de julho de 2025

CÁ ENTRE NÓS

Foto do autor por ocasião 40 anos da turma de 1972

Aroucha Filho (*)

 

Agosto de 1972, passado as festividades alvoroçadas dos trotes, evento de praxe para receber os calouros do curso de Agronomia, chegou o dia, de reunidos em sala de aula, iniciarmos o nosso S1.

A primeira leitura que fiz dos colegas, em rápida observação, era de jovens ávidos e interessados pelo curso que escolheram.

De outra banda, o perfil de cada um, eram contrastantes, no vestir, no corte do cabelo, etc....  Uns tímidos, outros extrovertidos, apresentavam uma grande heterogeneidade, de indumentárias e de comportamentos.

Ao correr do tempo, a socialização natural da turma foi expandida, formaram-se equipes de estudos, no entanto o entrosamento era amplo e unificado.  No entretenimento, na prática do futebol, foi formado um time forte em valores individuais e coletivo.

Nos tornamos uma turma homogênea e fisiologicamente orgânica, talvez tenha contribuído para isso as soluções químicas com dosimetrias de NOLETO, aliada à fisiologia da Professora DULCE.

O curso seguia, e todos inspirados nos ensinamentos de TRAJANO, já desenhavam seus futuros. O tempo, senhor do destino, com a facilidade didática de VLADIMIR, era possível vislumbrar como tempo firme, sem previsões de trovoadas.

As metas eram fixadas, o norte de cada um era guiado pela topografia de JOSÉ ROBERTO. Sim, nesse seguir rumo ao norte da vida, seriam necessárias várias deflexões, ora à direita, ora à esquerda, conforme a necessidade do momento para corrigir rumos.

No avançar dos períodos, definidos por S1, S2....S8, o estudo das probabilidades indicava: seria um percurso sem grandes desvios padrão, onde a moda se mostrava clara no gráfico de desempenho da turma, dedutível pela percepção estatística tão bem ensinada pelo REINALDO LIRA.

Pisávamos forte o solo em nosso caminhar, conhecíamos seus horizontes, sua acidez, sua fertilidade, se alguma aridez surgisse, os ensinamentos de CÉSAR VIANA nos proporcionariam ferramentas para torná-lo fértil.

A época de produzir com o nosso labor se aproximava com rapidez, tínhamos que ser firmes e competentes. É certo, que nessa hora vem a timidez, a insegurança, daí é preciso sem temor buscar os experimentos do JAIME, os cultivos da TOINHA, a precisão matemática do MUNIZ, e nada poderia ser afetado pela patologia do GILSON. Por isso, uma boa genética, lembremos CARROCA, faz a diferença.

Na zootecnia de MOREIRA LIMA, definiria o plantel como de pelagem variada, porém de caráter PO.

Agora a colheita, as flores, não esqueci a taxonomia do Dr. PLINIO, que me permite, de maneira sistemática classificar essa robusta árvore formada pela TURMA DE JULHO/76, com morfologia perfeita, bela anatomia, excelente genética e de hierarquia linear e horizontal.

Dos ramos que já se desprenderam, minhas saudades e o meu póstumo afeto.

Aos galhos que persistem, florindo e frutificando, o meu carinho, o meu forte abraço e, a minha alegria de compor com humildade essa grande árvore. 1

7/JULHO/2025.

(*)


José Ribamar Aroucha Filho é engenheiro agrônomo aposentado do INCRA, cronista e compositor.

    


 

sexta-feira, 11 de julho de 2025

Não sabemos a força que temos até precisarmos dela

 

Imagem extraída do Google


Luiz Thadeu Nunes e Silva(*)

“A vida é aquilo que acontece, enquanto estamos ocupados fazendo planos”, disse John Lennon, assassinado em 08 de dezembro de 1980, em frente ao edifício Dakota, onde morava em NY. O ex-Beatles, foi morto a tiros pelo fã que o perseguia, Mark David Chapman. Lennon não esperava que perderia a vida, de forma trágica, aos 40 anos; ele estava vivendo bom momento da vida, e certamente, não constava em seus planos, morrer tão jovem.

Conto essa história para falar de como as coisas mudam, rapidamente, sem que possamos ter alguma ingerência sobre elas. Papai do Céu não nos deu o dom de sabermos o que vem pela frente.

Manhã de 11 de julho de 2003, abri a janela do apartamento em que hospedava, com vista para o mar, em João Pessoa, PB, e agradecido, fiz uma oração por tudo de bom estava acontecendo. Tomei café, rumei para rodoviária; embarquei para Natal. Meu destino final naquele dia seria Fortaleza, CE.

Ao desembarcar em Natal, o ônibus que me levaria a Fortaleza passara. Fiquei alguns minutos aguardando o próximo ônibus. Começou a chover, embarquei em uma van, na esperança de pegar o ônibus que perdera. A van quebrou e tive que pegar um táxi de linha, comum na região. Próximo da cidade de Mossoró, RN, na BR 304, o motorista do táxi atendeu uma ligação telefônica, perdeu o controle do carro, jogando-o para o lado onde estava sentado. Colidimos com uma carreta, que vinha em sentido contrário. Ao acordar, após o acidente, todo quebrado e ensanguentado, não tinha ideia de que minha vida mudaria para sempre.

Havia planejado encontrar com minha mulher, e meus filhos, Rodrigo e Frederico, para jantarmos naquela noite, em Fortaleza. Com o acidente, tudo o que havia planejado, mudou. Acordei e vi que havia sido roubado, tinham levado: mochila, carteira com documentos e dinheiro; até os sapatos. Ao voltar a mim, não sabia da gravidade do acidente, e o que me esperaria pela frente. Minha vida, a partir dali, não seria mais a mesma.

Removido para Natal, durante a madrugada, fui operado. Houve erro médico, que desencadeou uma série de cirurgia. Durante cinco anos fiquei preso a leitos hospitalares: em Natal, São Luís e São Paulo. Usei aparelho Ilizarov na perna esquerda. Passei por 43 cirurgias, transplante ósseo, cem horas de câmeras hiperbáricas, até debelar a infecção na perna.

Em 2009, livre das cirurgias, adaptado às muletas, sai pelo mundo.

Quando que eu, em minha insignificância, poderia pensar que minha vida daria uma mudança de rota tão radical? Nunca estamos preparados para mudanças bruscas em nossa caminhada, mas elas acontecem a todo momento.

Tinha 44 anos quando ocorreu o acidente. Foram anos difíceis, de muitas provações, de inúmeras adaptações. Mas nós seres humanos somos adaptáveis a tudo.

Após os anos de convalescença, criei um novo mundo, e nele sigo em frente. A vida não dá macha ré, só anda para frente.

Não sabemos a força interior que temos até precisar dela. A necessidade é a mãe da precisão. Caro leitor, amiga leitora, caso você não precise de algo novo, não sentirá necessidade de mudar. Basta colocar no piloto automático e seguir em frente. Agora, se precisar, você encontrará um meio de continuar a jornada.

Viver é arte de superação, de se adaptar às coisas, pessoas e situações, que em tempos normais nem lhe passaria pela cabeça.

Como as andanças pelo mundo, já pisei, com minhas inseparáveis muletas, em 151 países em todos os continentes da Terra. Em outubro, com fé em DEUS, vou conhecer onze diferentes países da África. Assim sigo em minha sina de conhecer esse mundão que Papai do Céu criou.

A vida nos surpreendente a cada instante, não tem roteiro, nada é seguro, quem não tem medo do inesperado, tem que ter asas para voar.

(*)

Luiz Thadeu Nunes e Silva é Engenheiro Agrônomo, escritor e Globetrotter. Autor do livro “Das muletas fiz asas”

Instagram: @Luiz.Thadeu

Facebook: Luiz Thadeu Silva

E-mail: luiz.thadeu@uol.com.br


sábado, 28 de junho de 2025

De Curador a Presidente Dutra – uma caminhada longa e difícil.



Curador anos 40

 

José Pedro Araújo (*)

Lá se vão 81 anos desde que o interventor Paulo Martins de Sousa Ramos assinou o Decreto-Lei 820, em 30 de dezembro de 1943, ato que elevava o Curador à categoria de município. Verdadeiramente, o citado ato governamental se tratava de um instrumento oficial emitido a cada quatro anos pelo governo para definir a nova Divisão Administrativa do estado maranhense. Era um ato corriqueiro, então. Nessa resolução administrativa, que tinha validade de 1º de janeiro de 1944 a 31 de dezembro de 1948, muitos municípios foram criados, enquanto alguns outros perderam o status antigo e voltaram a integrar o território de outro município mais importante. Vivíamos o tempo da ditadura Vargas, período em que as casas legislativas se achavam de portas cerradas; daí que a Lei de costume, discutida e votada pelos senhores deputados, havia sido substituída por um decreto-lei que continha apenas a vontade única do chefe do executivo. Mas a luta por reconhecimento do povoado Curador vinha de longe, desde quando os primeiros moradores chegaram por ali na segunda metade do século XIX, e fixaram-se em casebres de pau-a-pique e palha de babaçu.   

Esse edito, a que nos referimos no início do parágrafo anterior, foi o passo inicial que conferiu à comunidade, situada no interior mais profundo da região conhecida como Japão maranhense, poderes e independência, desligando-o do seu município-mãe, Barra do Corda. Afirmo que foi o passo inicial porque a solenidade oficial de elevação da Vila à categoria de município somente se daria no dia 28 de junho do ano seguinte, seis meses após a publicação daquele diploma legal. Passou aquele dia a ser considerado como data oficial que ensejou o início da nossa caminhada de maneira independente, desligado que fomos do imenso território barra-cordense; aquele que consideramos o dia primeiro da nossa caminhada solo.

O interventor Paulo Ramos não se fez presente ao ato oficial, talvez porque preferisse participar das festividades de elevação de algum outro novo município mais próximo da capital, posto que muitos outros foram criados naquela mesma data; talvez porque chegar até a sede do velho Curador não era uma tarefa muito fácil. Melhor dizendo, era tarefa das mais difíceis, visto não possuirmos estradas em condições minimamente trafegáveis. Até mesmo para se deslocar de Barra do Corda até a sede da povoação do Curador, naquela época, praticamente só se fazia montado em alimárias, e assim mesmo utilizando-se de um volteio insano que aumentava a distância entre esses dois pontos em quase oitenta quilômetros, comparativamente ao percurso que temos hoje. Estrada sinuosa, como já afirmei, tinha esta via a obrigação de passar por quase todas as povoações mais importantes do município, o que quase dobrava a distância entre os dois pontos que se queria atingir. O relatório emitido pelo governo, em decorrência da viagem de inauguração de várias estradas de rodagem pelos sertões, viagem empreendida pelo governador Magalhães de Almeida, no ano de 1928, registrava que o trecho inaugurado pela citada autoridade entre a vila de Curador e Barra do Corda media longos 176 quilômetros. Mas isso não foi impedimento para o interventor barra-cordense, Jamil de Miranda Gedeon, fazer-se presente à solenidade. Provavelmente havia se deslocado até a Vila de Curador montando em algum animal de sela. Já a autoridade máxima do estado, preferiu enviar o senhor Secretário Municipal da cidade de Vargem Grande para substituí-lo no ato que reuniu toda a população da vila.

Hoje em dia, trafegando pela BR 226, a distância entre a sede do município de Presidente Dutra e a de Barra do Corda não ultrapassa os 98 quilômetros de extensão. Magalhães de Almeida, naquela vigem de inauguração de caminhos que chamava de estradas, foi o primeiro governador do estado maranhense a pisar em terras curadoense. Isso aconteceu no distante ano de 1928, já citado. E para registrar a sua passagem pelo povoado, existem fotografias, talvez as primeiras imagens registradas da região e eternizadas na celulose. Bem-merecida a homenagem àquela autoridade prestada pelos presidutrenses, que deu à sua principal artéria, o nome daquele ilustre conterrâneo.

A fotografia que ilustre o presente texto, e que nos mostra a cidade nos seus primeiros anos após a sua elevação à categoria de cidade, nos dá uma ideia aproximada do que era ela no tempo do seu desligamento de Barra do Corda. A visão que temos é a de uma Rua Grande desnuda, sem calçamento, sem posteamento para rede elétrica, favorece a nossa imaginação e nos leva a pensar que por baixo daquele piso de terra não devia correr água encanada. Sem a mínima infraestrutura de serviço em prol de sua população, mostrava a nossa primeira rua a ser formada pelos nossos pioneiros, as enormes carências pelas quais passava a população naqueles tempos. Nessa época ainda, a educação se resumia a essa escola particular que vemos em destaque na foto, dedicada às estudantes de sexo feminino; e ao colégio São Bento, instituição criada para receber os rapazes da cidade. As duas, implantadas pelos capuchinhos que haviam se instalado pouco tempo antes na região. No mais, a educação se resumia aos mestres-escola que ainda atendiam a criançada da povoação.

Quando criança, andar pelas ruas sem calçamento ou correr por elas durante as chuvas pesadas que desabavam sobre a cidade, trazia-me uma sensação de completa liberdade e enlevo; para mim, nada faltava por ali, pois as brincadeiras de cada período me bastavam. Banhos de riacho no período invernoso, papagaios de papel colorindo o céu azul no período de estio, piões, bolas de gude, chuço, e os jogos de futebol em qualquer período, fizesse sol ou chovesse, completavam as minhas necessidades maiores.  Por outro lado, à noite, as brincadeiras de esconde-esconde ou as estórias de trancoso contadas com excesso de amedrontamento, supriam com folga a falta de energia elétrica.

Mas aí crescemos, e as exigências passaram a se apresentar muito maiores. Já não nos satisfazíamos somente com as brincadeiras.

O aniversário de Presidente Dutra vai além das celebrações; é um momento para refletir sobre os avanços que o município alcançou ao longo dos anos. Investimentos em infraestrutura, educação e saúde têm contribuído para o crescimento da cidade e o bem-estar de seus moradores. Mas ainda nos falta muito. Precisamos avançar em vários campos que ainda estão carecendo de melhorias, como a segurança, a falta de oportunidades para os jovens que chegam à idade em que comumente começa-se a laborar, por exemplo. Além disto, o abastecimento de água e a coleta e o tratamento de esgoto são ainda pontos que deixam muito a desejar em um município que cresce a olhos vistos e que clama pela melhoria desses serviços para se equiparar àqueles que possuem o seu tamanho em alguns estados brasileiros mais desenvolvidos.

Contudo, quem como eu viu as ruas da cidade às escuras, com a poeira levantada pelo vento invadindo as residências; quem, como eu, padeceu da carência de um atendimento médico banal, fato que nos fazia correr para a cidade de D. Pedro em busca do Dr. Armando Leandro, médico amigo e muito conceituado, à falta de profissionais do seu quilate na nossa cidade; há de convir que avançamos muito em vários campos, especialmente neste em particular. Hoje o município já dispões de três hospitais públicos que prestam a maioria dos serviços necessários à população. Ademais, clínicas médicas e odontológicas se espalham por vários pontos da cidade, e a maioria dos seus profissionais são nascidos nela. A cidade se tornou um polo regional importante na região central do Maranhão e é quase autossuficiente no campo da saúde.

Parabéns, Presidente Dutra! Estamos felizes com o que temos, mas queremos mais!

(*)

José Pedro Araújo é engenheiro agrônomo, funcionário público federal aposentado, historiador, cronista, romancista, e coordenador do blog Folhas Avulsas. 

Aviso: Junho é o mês de aniversário da cidade de Presidente Dutra. E por conta disso, por todo este mês estamos realizando uma promoção dos últimos exemplares do livro " Viajando do Curador a Presidente Dutra - história, personalidades e fatos". Se você residir em alguma das cidades onde o livro foi posto à venda, cada exemplar importará em apenas R$ 60,00 reais. Caso seja necessário o envio do livro para qualquer outra cidade do país, acrescentar mais R$ 15,00, que é o valor do frete. Portanto, durante os trinta dias de junho, o livro sairá por apenas R$ 60,00 reais. E poderá ser encontrado em Presidente Dutra, na Complast, em Teresina, nas livrarias Universitária e Entrelivros, e em São Luís, na livraria Amei, no Shopping São Luís. Como já informado, trata-se dos últimos exemplares que ainda dispomos em estoque. E aquelas pessoas que se interessarem pela história da região conhecida como Japão maranhense, tem a última oportunidade de adquirir o livro que traz também, resumidamente, a história do estado do Maranhão.

 

   

sábado, 21 de junho de 2025

Mais uma guerra em um mundo caótico

Teerã - Foto do autor

Luiz Thadeu Nunes e Silva (*)

Em andanças pelo mundo, desembarquei no aeroporto internacional Tehran-Iman, em Teerã, em uma madrugada de abril de 2017. O aeroporto fica a 50 km do centro da cidade, onde ficava o hotel. Para minha surpresa, encontrei uma cidade pulsante, fascinante e surpreendente. Durante cinco dias visitei os pontos históricos e turísticos da capital do antigo império persa. Com 10 milhões de habitantes, Teerã tem a mesma população de toda Israel. Com um povo acolhedor, é governada pelos sanguinários Aiatolás, tendo Israel como seu maior inimigo.

Noite de quinta-feira, 12 de junho. Dia dos Namorados. Após jantar, cheguei em casa e os canais de TV mostravam, ao vivo, o bombardeio de mísseis israelenses sobre Teerã, capital do Irã, em mais um episódio de ira entre os dois países do Oriente Médio. A memória me fez voltar no tempo.

Em um histórico belicoso, Israel e Irã protagonizaram por quatro décadas um conflito latente, com momentos de maior tensão abafados pelos Estados Unidos a fim de evitar uma guerra com consequências imprevistas no Oriente Médio. Mas, com o vigoroso ataque de Tel Aviv em solo persa, as camadas de contenção se esfacelaram.

A decisão do primeiro-ministro Binyamin Netanyahu de deflagrar "ataques preventivos" contra o Irã configura, pela legislação internacional, crime de agressão. Ao Conselho de Segurança da ONU, Teerã os classificou como "declaração de guerra" —exatamente o que o restante do mundo e até mesmo ambos os inimigos cáusticos tratavam de evitar. Se estamos perto de uma guerra de proporções desconhecidas, ainda é cedo para afirmar, mas o mundo está cada vez mais inseguro. Israel com seu poderio militar e precisão logística, durante dias seguidos de ofensiva destruíram alvos precisos e reduziram a capacidade de contra-ataque persa. A instalação nuclear de Natanz foi bombardeada, bases de lançamento de mísseis terra-terra foram atingidas e parte considerável do comando militar iraniana foi morta. A resposta do Irã com drones —a maioria deles abatida antes de atingir os alvos— e cerca de cem mísseis provavelmente não encerra a retaliação.

O Irã inevitavelmente sofreria consequências pelo brutal ataque do Hamas a Israel em outubro de 2023, agravado por sua retórica de destruição do Estado judeu e seu insistente avanço no programa nuclear com fins militares, sem contar os cerca de 200 mísseis lançados contra o inimigo em outubro do ano passado.

Antes, porém, Tel Aviv concentrou-se na destruição do Hamas, na Faixa de Gaza, do Hezbollah, no Líbano, e dos houthis, no Iêmen —grupos terroristas financiados pela teocracia persa.

Quem vê Israel e Irã trocando ataques em uma guerra com alto potencial destrutivo não imagina que os dois países já foram aliados próximos. E não faz tanto tempo assim. O Irã apoiou a criação de Israel, em 1948, e foi um dos primeiros países a reconhecer sua existência, na direção contrária de seus vizinhos árabes. Além disso, nos anos 1960, Irã e Israel viraram parceiros comerciais, exportando petróleo pelo oleoduto de Eilat Ashkelon, com gestão e lucros divididos entre ambos.

Israel e Irã foram aliados até 1979. A queda do xá da Pérsia, após anos de insatisfação popular, intensificados por protestos e greves, levando Reza Pahlavi a fugir do país e deixando o caminho aberto para a liderança de Khomeini.

O Irã se tornou uma república islâmica teocrática, revogando regras internas consideradas ocidentais demais e dando um cavalo de pau na política externa. Estados Unidos e Israel viraram os inimigos. Abraçando a causa palestina como forma de ganhar proeminência entre os países do Oriente Médio, o regime dos aiatolás, em um ato que simbolizava a mudança de postura, tomou a embaixada do estado judeu em Teerã e entregou para a Organização para a Libertação da Palestina (OLP).

A partir de então, o Irã deixou de reconhecer a legalidade de Israel e passou a pregar seu extermínio, financiando grupos acusados de terrorismo como o Hezbollah, no Líbano, e o Hamas, na Palestina.

É São João na Ilha do Amor, tempo de alegria, de arraial, de celebrar os festejos juninos. Tempo de brincadeiras, manifestações folclóricas, muita comida boa. Bomba e fogos por aqui, só de artifícios. Quão bom é estar longe das guerras.

(*)




Luiz Thadeu Nunes e Silva  é Engenheiro Agrônomo, escritor e Globetrotter. Autor do livro “Das muletas fiz asas”.

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