terça-feira, 30 de outubro de 2018

DONA TERESINHA, NA SUA AUSÊNCIA NÃO HAVERÁ FESTA!

FESTA EM FAMÍLIA - MAMÃE É A 6ª SENTADA À PARTIR DA ESQUERDA


Em um distante trinta de outubro de 1927, em dia de sol brilhante como o de hoje, nascia no Curador uma estrela que iria iluminar a vida de tantos quantos cruzaram o seu caminho. E foi assim por felizes oitenta e nove anos. Naquele feliz dia, como diria o trovador, na música intitulada “Fazenda”, “Tinha sabiá, tinha laranjeira, tinha manga rosa, tinha o sol da manhã... Até vir a noite...”. Não posso lastimar o fato, já que não estás mais aqui, pois Deus sabe o momento exato de todas as coisas. Momento da chegada e também da partida. Mas como sinto a falta da sua presença carinhosa e caridosa! Como sinto a ausência do seu sorriso a iluminar os meus dias! Na minha casa, no quarto em que dormiste, ainda baila suspenso no ar o seu aroma, e o som do seu riso fácil ainda reverbera qual o trinado de um pássaro canoro. Nos dias iguais ao de hoje, sempre encontrávamos uma maneira de ficarmos juntos. Como a senhora gostava que fosse. Deste modo, como se faz ausente a pessoa mais importante da reunião, não mais festejaremos esse dia. Apenas agradeceremos ao Criador pelos anos em que estivemos juntos. O Trinta de outubro nunca mais será festivo para nós, contudo!

quinta-feira, 25 de outubro de 2018

O Ineditismo do Futebol de Minha Terra(2) - Árbitro x Bandeirinha.




Mazaniel Almeida(*)

            Antes de qualquer coisa, devo fazer um elogio ao futebol do Estado Maranhão. Lá não temos clubes homônimos, o que facilita e muito a comunicação. No Brasil se formos contar o número de clubes de futebol com o nome de América, daria para encher um balde. No futebol do Piauí certa feita, tínhamos Flamengo, Fluminense e Botafogo. Por sacanagem a Caixa Econômica Federal colocou na loteria Esportiva um jogo de Flamengo x Fluminense do Piauí e o Brasil todo marcou coluna do meio, ou seja, empate, quando nós sabíamos que o Fla daria uma goleada no Flu.
            Corria o ano de 1968 e o campeonato piauiense de futebol se desenrolava sem maiores atrativos até que veio o último clássico do primeiro turno entre Flamengo x Piauí, no domingo sete de julho.
            Desculpe-me os torcedores do Flamengo carioca, mas o time de vocês não é o único a se beneficiar de arbitragens escandalosas. O Flamengo do Piauí também trouxe essa sina. O Flamengo perdia por 1 x 0 quando o árbitro Antônio Rodrigues SANTA ROSA, validou um gol do Flamengo feito pelo atacante em completo impedimento (offside). O juiz de linha (bandeirinha) permaneceu em pé junto a bandeira de escanteio com a bandeirinha levantada, marcando o impedimento. Imediatamente os jogadores do Piauí E. Clube partiram pra cima do árbitro, apontando a marcação do bandeirinha. O árbitro por sua vez correu para se entender com o juiz de linha, Sr. Jamil Gedeon Filho com quem travou o seguinte diálogo:
Árbitro Santa Rosa: Eu marquei gol. O que você tá fazendo com esse pau duro em pé?
Bandeirinha Jamil Gedeon: Foi gol, mas em impedimento e o pau e meu e deixo como quero. Você não manda em meu pau!
Árbitro: Mas eu estou marcando gol e você assim com esse pau em pé me desmoraliza.
Bandeirinha: Não vou abaixar meu pau, se você quiser que valide, mas         estava de offside. Meu pau não desmoraliza ninguém!
Árbitro: Você e seu pau estão atrapalhando meu trabalho, por isso você está expulso de campo com bandeirinha e tudo.
            A introdução dos cartões vermelhos e amarelos no futebol mundial se deu dois anos depois, na Copa do Mundo de 1970, no México. Nessa copa nenhum jogador recebeu cartão vermelho e o primeiro jogador a receber cartão vermelho numa Copa do Mundo foi o nosso zagueiro de área Luis Pereira, na Copa de 1974, contra a Polônia, na decisão do terceiro lugar.
            Os cartões tiveram como inspiração para a criação, os sinais de trânsito, isso para facilitar a comunicação dos árbitros com os jogadores e também para o entendimento das torcidas, em face da quantidade de idiomas reunidas nos estádios que mais parecia uma imensa Babel. Ainda não havia esse enorme intercâmbio de atletas internacionais, hoje tão comum. Até então, o árbitro ao expulsar de campo um jogador era um tal de assoprar de apito e gestos espalhafatosos que dava dó. Foi o que se viu a seguir com o árbitro Santa Rosa expulsando seu bandeirinha de campo. O bandeirinha Jami Gedeon por sua vez, fez questão de sair com o pau da bandeira em pé, apontando para cima, numa flagrante afirmação de suas convicções.
            Tanto o árbitro Antônio Rodrigues Santa Rosa, quanto o bandeirinha Jamil Gedeon Filho, infelizmente já esticaram as canelas e bateram as botas, indo à viagem sem volta, com passagem só de ida. Bem que eles poderiam assinar esse trabalho. Como pessoas eram excelentes. Cidadãos de primeira linhagem, mas como árbitros de futebol, ofício ingrato e que costuma desagradar as duas torcidas, praticavam lá seus deslizes e protagonizaram esse caso único no mundo. O resultado do placar deixou de ser relevante diante dessa anomalia, ninguém mais se importou com a partida e a expulsão gerou comentários pra mais de mês, pra lá de léguas de comprimento. Carlos Said, o mais conhecido comentarista de arbitragem do Estado, falou tanto nisso que ficou rouco.
            Ah, quase me esqueço! O jogo terminou empatado de 1 x 1 com o gol de impedimento validado.
             Eu estava lá, vi e conto.
             São coisas de minha terra.


(*)Mozaniel Almeida é piauiense, poeta e cronista.

sábado, 20 de outubro de 2018

Suando a camisa para me tornar um craque de futebol




José Pedro de Araújo
Desde que me entendo por gente comecei a pôr em prática o sonho de jogar futebol. Pra falar a verdade, acho até que isso começou antes disso. Mas, desse período não me ficou registros na memória. Portanto só falo aqui do que me lembro. Como muitos da minha geração, a primeira pelota que corri atrás foi uma bola-de-meia. Acredito que quem fabricou o artefato foi a minha mãe, utilizando-se de uma velha meia do meu pai. Digo que acredito porque era ela que, habilidosa e muito dedicada, ajudava-me a confeccionar alguns dos meus brinquedos. Como os papagaios(pipas), por exemplo. Quando engendrei o meu primeiro artefato voador, não sabia como fazer para cobri-lo com papel de seda. Foi ela quem me socorreu mais uma vez e concluiu a tarefa. Fez o grude(cola), à partir da goma de mandioca, e colocou o papel na armação. Quem já confeccionou algum desses bichos sabe que um de seus mistérios é a colocação do papel na armação. Se ficar folgado demais, o bicho não voa. E se ficar muito esticado, também não voará com a galhardia que queremos.
Voltando para o propósito da nossa crônica. Mamãe me fez uma bola-de-meia muito bacana. Preta(a cor da meia), era tão esférica que parecia que algum profissional a havia fabricado. E era verdade. Minha genitora fazia tudo para nós com o maior carinho e cuidado. E, geralmente, ficava tudo uma perfeição. Foi atrás dessa pelota que dei as minhas primeiras carreiras rumo ao estrelato. Depois ela adquiriu na feira(sábado é dia de feira no Curador e todo mundo tirava uma hora para passar por lá. Pelo menos para conferir as novidades, caso não tivesse dinheiro). Uma bola azul, muito pequena, e de plástico, foi o presente que ganhei. Leve demais, não demorou e logo perdeu a sua finalidade ao romper a costura de tanto ser chutada na parede do salão comercial do meu pai.
Para aprimorar a minha carreira de craque, um tio meu trouxe de uma aldeia indígena de Barra do Corda, certo dia, uma bola de borracha, confeccionada pelos índios à partir do látex da Mangaba. A pelota era muito viva, pulava demais, dificultava o seu domínio como um cavalo xucro. Ademais, era quase oval, estava mais para uma bola de futebol americano do que propriamente para uma de futebol bretão. Ficava difícil acertar um chute na vadia. Acredito poder afirmar que essa mal-amada teve o condão de me tornar um perna-de-pau. Sim, porque dizem que “é de pequenino que se torce o pepino”. E eu, naturalmente, perdi-me no tempo.
O nosso estádio( ou seria melhor chamar Arena?), ficava na Praça Diogo Soares, a dois passos da casa paterna, pertinho também das residências dos outros atletas. Grama mesmo só possuía alguns tufos de capim-de-burro, pois os animais que por lá vagavam não deixavam nada escapar das suas bocadas. Chamávamos de Praça o espaço vazio que a municipalidade registrou na sua relação de endereços, mas que, ainda hoje, nunca recebeu uma melhoria, por menor que fosse. Aliás, minto, algum prefeito trabalhou ali para lhe carimbar o nome. E mais não fez. Mais ampla (nesse tempo, porque depois o município entendeu de doar mais da metade daquele espaço para alguns de seus eleitores construírem moradias), o nosso campo de jogo recebia-nos para jogar quando o sol nos permitia: sem queimar o nosso cocuruto, os nossos pés ou dificultasse a nossa visão. Ou sejas: na primeira parte da manhã ou após as quatro da tarde, e até as dezoito, quando ainda era possível ver a bola rolar.
Invariavelmente, jogávamos com bolas de borracha. Não havíamos possuído, até então, uma bola de couro. E é fácil justificar por que. Na cidade não havia uma só loja que comercializasse o artigo. E depois, bola-de-couro era para poucos, estava acima da nossa condição financeira. Mas isso não duraria para sempre. Ganhei do meu pai a minha primeira viagem para mais distante dos limites do meu município. Até então só conhecia os vizinhos: Tuntum e Dom Pedro. Nessas férias acompanharia o meu pai em uma viagem para Teresina, e depois seguíramos até Simplício Mendes, cidade em que residia a minha avó paterna. Estávamos nas férias do fim de ano de 1966. Isso, naturalmente, me encheu de júbilo. Foi nessa viagem que eu me apaixonei perdidamente pela capital de todos os piauienses. Nela havia muitas bancas de revistas. Um sonho. Nunca mais me desgrudei dela.
Empolgados com a viagem de um dos seus membros mais participativos, o time inteiro fez uma vaquinha para adquirir a sua primeira bola de couro. Imaginem a pressão que exercemos sobre os nossos pais para arrancarmos deles alguns caraminguás dos seus apertadíssimos orçamentos. O certo é que juntamos uma certa quantia que deu para adquirir uma bola das mais baratas. Mas haveria de ser de couro. E foi.
Quando retornei da minha viagem de quase quinze dias, encontrei o time inteiro esperando por mim. Melhor dizendo, pelo objeto de imenso desejo: a bola. E mal o ônibus parou na agência Estrela Dalva, na Praça da Bomba, de maneira uníssona os atletas indagaram-me pela pelota. Sem fazer mistério, arremessei-a para as mãos do atleta que se achava mais próximo e ele, ao segurá-la, virou-me as costas e fugiu em desabalada carreira. Os outros moleques seguiram em seu encalço, nem me perguntaram como havia sido a viagem.
A bola-de-couro também não melhorou o meu desempenho como jogador de futebol. O problema não era a bola e sim o atleta, compreendi enfim. Depois disso, corri que nem um desesperado atrás da redonda por campos outros, e em vários outras cidades, sem que a pérfida amada me transformasse em, pelo menos, um jogador mediano. Longe disso. Por conta disso, desde a minha mais tenra idade, quando escolhíamos o time, logo aparecia alguém disposto a me escalar para o gol. E como é do conhecimento público, vai para o gol o pior jogador. Mas eu só considerei essa situação, que teimei muito tempo em aceitar, quando já adulto. A constatação doía muito, podem acreditar. Mas, em contrapartida, diminuiu em muito a minha ânsia para me tornar um jogador de futebol. Depois disto, encontrei uma saída maravilhosa para evitar que me empurrassem sempre para desempenhar o ofício de goleiro: passei a comprar a bola.

quarta-feira, 17 de outubro de 2018

A história do sapo Zé

Capa do Livro infantil "O Sapo Zé".

Elmar Carvalho(*)


Dias atrás veio fazer um trabalho em nossa casa o mestre Ivo Gomes, radicado em Teresina, porém natural de Miguel Alves – PI. Quando, no final do serviço, minha mulher e eu o elogiamos, reconhecendo que ele montara o painel de mosaico com perfeição, ele revelou que passara a noite anterior sem dormir direito, porque a Fátima achara que ele havia errado na ordem de colocação de algumas das peças. Isso demonstra que ele é um operário perfeccionista, meticuloso, o que se percebe ainda no cuidado como ele fez as necessárias emendas, nos locais em que não cabia uma unidade completa.

No decorrer da execução do serviço, ele tomou conhecimento de que eu escrevera alguns livros, que lhes foram mostrados, creio. Ivo, então, nos contou que o seu filho, ainda um menino, era também um escritor. Como lhe indagássemos sobre isso, ele nos contou que o garoto gostava de ler e sempre participava do Salão do Livro do Piauí – SALIPI, tendo publicado um livro infantil por ocasião de uma de suas “versões” anuais.

Falou que o garoto, além do amor aos livros, gostava de desenhar, escrever e era componente de uma banda musical. Acrescentou que o seu filho escrevia desde que tinha cinco anos de idade, sem que ninguém a esse mister o induzisse. Ele próprio fazia as ilustrações das histórias que escrevia.

Perguntei qual a sua idade atual, tendo o mestre me respondido que tinha somente 12 anos de existência. Prometi que, quando ele terminasse o serviço, mandaria uns livros de minha lavra a seu filho, tendo ele me dito que me traria, no dia seguinte, um livro da autoria do garoto. De fato, me trouxe um exemplar, ainda lacrado por invólucro plástico, e, portanto, sem autógrafo, o que parece indicar que o jovem não foi inoculado pelo veneno da vaidade de eventual mosca azul.

O pequeno volume tem o título de “O sapo Zé”, e é todo colorido, da capa à contracapa, o que é conveniente a um livro destinado a público infantil. Li-o com agrado, me recordando dos tempos de minha meninice, em que li com sofreguidão esse tipo de literatura, inclusive vários da autoria do grande Monteiro Lobato, da Condessa de Ségur, de Viriato Correia e vários outros autores, além de inúmeros gibis da marca Walt Disney.

A obra contém belas ilustrações em policromia, que bem retratam o que é narrado, elaboradas por Ângela Rêgo, exímia artista plástica e ilustradora, que já agregou valores a vários livros publicados. Ela é também uma talentosa capista.

Na capa se encontra estampado o nome completo do autor: Railson Cauã Gomes. A pequena nota biográfica informa ainda que ele tem oito anos e que aos cinco decidiu escrever histórias, bem como é estudante de escola pública. Portanto, a história objeto do livro foi escrita, suponho, quando ele tinha apenas essa idade, contudo o livro foi publicado em 2016, conforme folha de rosto. Foi publicado pela Nova Aliança Editora, cujo proprietário é o livreiro Leonardo Dias, coordenador editorial, que relevantes e bons serviços vem prestando à literatura piauiense.

Na pequena nota, a que me referi, é noticiado que o autor “tem o sonho de ser um grande escritor lido no mundo inteiro e por isso continua escrevendo e ilustrando histórias para as crianças se divertirem”. O estilo é claro, direto, objetivo, sem nenhum tipo de rebuscamento, e bem compatível com a idade de Railson Cauã. A história é simples, porém criativa, e apropriada ao público a que é destinada. Por conseguinte, bem diferente de certas histórias infantis, que são, na verdade, uma espécie de contos de terror.

Transcrevo o seguinte trecho, que é revelador de sua inventividade: “O sapo Zé pulava no jardim e a sapa pulava no seu Joaquim.” Nota-se, nesta pequena transcrição, o espírito lúdico e brincalhão do jovem escritor. Por ela se percebe que, se Cauã tiver perseverança e não mudar de planos, continuando firme em sua vocação, em seus estudos e amor à leitura, realizará, decerto, o seu “sonho de ser um grande escritor”.

Afinal, como já dizia Charles Chaplin, “a persistência é o caminho do êxito".    

(*) Elmar Carvalho é poeta, romancista, cronista e membro da APL.

sábado, 13 de outubro de 2018

O Curador e a Violência Política

Praça da matriz de São Sebastião com a mureta original(anos 60)


José Pedro Araújo
Desde menino ouço falar que, em época de eleições, os ânimos se acirravam no velho Curador, a ponto de amigos fraternos passarem meses sem se cumprimentar. Pior, período de eleições era época de muito choro e ranger de dentes para algumas famílias ao ver a vida de algum dos seus filhos ceifada precocemente. Por esse tempo, quando ainda trajava calças curtas, comecei a ouvir dizer que o Curador já havia passado por um confronto sangrento entre duas das famílias de maior destaque na região. E que do embate,  a vida de alguns dos seus membros fora subtraída. Tudo pelo poder de mando de uma comunidade perdida nos sertões mais profundos do Maranhão. Ouvi, por exemplo, que homens armados e violentos se apossavam da cidade e transformavam a sua calma sertaneja em um campo elétrico, onde o menor contato entre as partes poderia se transformar em um mar de fogo. Fiquei assustado quando minha mãe me falou que, certo dia, houve um tiroteio tão intenso na Rua Grande, que as pessoas, mesmo abrigadas em suas casas, tiveram que se projetar no chão e buscar a proteção dos pés das paredes. Apavoradas com pipocar das armas de fogo, procuravam escapar das balas perdidas que voejavam à procura de uma vítima.
Em um desses dias em que o cheiro de pólvora se espalhava pelo ar, no que pode ser descrito como o maior dos confrontos entre os dois grupos familiares já citados no parágrafo anterior, um primo desse escriba, jovem, ainda imberbe, foi atingido por um balaço que lhe abreviou a vida ainda em flor. Havia o irrequieto rapaz tomado partido por um dos lados em disputa. 
Nesse tempo, a grita por segurança bateu às portas do Palácio dos Leões na distante capital, São Luís, e o assunto tomou conta das páginas dos jornais por muitos e muitos dias. A cidade ganhou fama de violenta e sanguinária, e para os Ludovicenses, passamos a ser um povo que cultivava a violência. A má fama nos persegue até os tempos que correm. Por muitas e variadas razões, não podemos nos furtar disso.  
Como ninguém mais aguentava tal situação, o interventor de plantão abriu mão do posto a fim de que o governador do estado pudesse nomear outro mandatário com poderes para pacificar os ânimos durante o pleito eleitoral que se avizinhava. O escolhido foi um Tenente-coronel, ocupante de relevante cargo no âmbito do poder estatal. Este, contudo, mal terminou o período concernente às eleições, retornou para a capital e deixou o velho Curador imerso em suas ensandecidas disputas costumeiras.
No inicio dos anos 60 se instalou na cidade o batalhão de Engenharia e Construção do 2º BEC. Tinha por objetivo a conclusão da BR 226 até chegar ao rio Tocantins. Mas os militares fez muito mais que isto. Debelaram a violência na cidade durante os anos em que ficaram instalados na Praça Biné Soares, em local pertencente à família do senhor Celso Sereno. Patrulhas armadas saíam todas as noites pela cidade com o propósito de proteger a cidade e permitir que os presidutrenses pudessem dormir em paz e segurança. Por esse tempo os políticos também se comportaram e respeitaram as mais básicas regras democráticas.
E foi sempre assim a história política do velho Curador até alguns anos atrás. Como no processo político cabe a apenas um grupo o poder de mando, sempre havia um terrível entrechoque entre aqueles que queriam para si essa primazia. Em épocas nem tão distantes assim, a violência tirou a vida de alguns representantes da mais alta estirpe política local, criando um clima de insegurança que muitos pensavam haver ficado soterrado no passado. Foi, talvez, o período mais doloroso e sangrento desde a época em que o município recebeu a sua emancipação.
Ultimamente as coisas se mostram diferentes. Muito bate-boca toma conta da cidade, que já não é tão pequena assim. E as desavenças, no máximo, chegam aos desforços pessoais, e são resolvidas com alguns murros e bofetões. Mas isso acontece em todo o país. No Brasil, a força da palavra não é o bastante para dissipar as nossas diferenças e/ou desavenças.
No pleito que aconteceu domingo passado, o município elegeu um represente para a Assembleia Legislativa estadual depois de muito tempo. Até onde sei, tudo transcorreu na mais perfeita ordem, na mais absoluta paz. Abandonamos a velha prática curadoense e chegamos, por fim, aos tempos presidutrenses. Que seja assim por séculos e séculos sem fim. Amém!

quarta-feira, 10 de outubro de 2018

O Ineditismo do Futebol de Minha Terra(1)

Imagem by Google


O Maior Placar em um jogo de Futebol.
Mazaniel Almeida(*)

            O futebol do Piauí se não é rico em resultados, se é pobre em craques, se destaca pelo ineditismo. Muitos dos casos fogem do “folclorismo”, do racional, do inimaginável e até do absurdo.
           Poty Velho é o mais antigo bairro de Teresina, localizado na confluência dos Rios Poty e Parnaíba e tinha seu time de futebol amador com o mesmo nome do bairro. Barra das Pombas era um povoado do outro lado do Rio Parnaíba, no Estado do Maranhão. Marcaram um amistoso entre os times das duas localidades que de atrativo não tinha nada, mas uma rivalidade sem controle, daquelas em que se dizia: se vencerem na bola irão perder na porrada. Isso não era apenas força de expressão, pelo menos a emoção estava garantida, não pelo resultado objetivo do placar, mas pelas consequências desse.
            Eu, menino traquino, fui a esse jogo escondido de minha mãe, aproveitando que ela iria para uma procissão religiosa.
            O time do Poty era visitante, num campo de chão batido e graças a Deus sem muros. Jogo sem policiamento, com juiz neutro (pelo menos em tese) e a torcida única armada de cacete. A primeira providência do juiz neutro foi expulsar o goleiro do Poty no primeiro lance do jogo e ainda marcou pênalti a favor do time local. Acreditem se quiser, mas o primeiro tempo terminou: Barra das Pombas 30 x 0 Poty, isso mesmo: trinta a zero. O time do Poty nunca tinha sofrido tantos gols, aliás, time nenhum do mundo passara por aquele vexame. Aquilo era placar de basquetebol.
            A torcida local já nem estava dando bolas paro o jogo, que em dado momento se matou de rir ao ver uma vaca atravessando o campo de jogo na maior malemolência, avacalhando ainda mais um jogo avacalhado.
            O que não se poderia prever, nem o mais estabanado dos gurus do mundo, seria uma reação do time do Poty Velho. Foi diminuído o placar, subindo degrau a degrau realizando o que seria impossível. Inesperadamente, no segundo tempo só os visitantes marcaram gols uns por cima dos outros, de enxurrada até conseguir um empate de 30 x 30, isso mesmo: trinta a trinta.  Faltando cinco minutos para o término do tempo regulamentar, o árbitro no uso de bom senso e bote bom senso nisso, encerrou a partida na iminência de uma virada no placar e com isso aumentar a pancadaria que já não era pouca. Barra das Pombas 30 x 30 Poty Velho, num jogo sem súmula, repleto de testemunhas que entrou para a história do futebol como o maior placar do mundo. Nada visto antes, durante nem depois. Tão surpreendente que, passado mais de meio século, chegando-se à Teresina, desde o mais antigo ancião a um criança de chupeta, caso você pergunte qual o resultado dessa partida, ouvirá as mais escandalosas respostas, coisas como: 100 x 100, 50 x 50, 120 x 120.

(*)Mozaniel Almeida, piauiense, é poeta, cronista e contista.