quarta-feira, 27 de julho de 2016

Mania de Livro: Um Tema Por Mim Repisado




Cunha e Silva Filho
Ensaísta, Crítico Literário, Cronista e Tradutor.

     A primeira vez de que me lembro ter ido a uma livraria foi no início do curso ginasial. No primário  não me recordo de  ter ido a livrarias  em Teresina.  Julgo que era  mamãe que me comprava  o material  escolar, o  quase livrinho  da cartilha do  ABC reimpressa tantas  vezes  e por várias  gerações. Daquela primeira vez que fui à livrairia,  cujo proprietário se chamava professor Oscar, já estudante ginasiano, conforme disse, acompanhado estava de meu pai. O que me marcou no fundo da memória foi a compra do primeiro livro de inglês,  o King's English, de Harold Howard Binns. Relatei  essa visita  histórica  no meu livro As ideias no tempo (2010).

       Mas, leitores,  sabe de uma coisa? Desde aquela  época  me tornei  um  entusiasta   de carteirinha  dos livros  de matérias  a que  mais  dava atenção: línguas,  leituras,  literatura, gramática, dicionários.

    Hoje mesmo,  à tardinha,   Elza me chamou para ir até ao Shopping da Tijuca. Confesso que  não queria sair  hoje. Preferia permanecer em casa, lendo o jornal  do dia anterior,  segundo  é meu costume. Não consigo ler o mesmo  jornal num só dia. Meu filho mais  novo não me deu sinal de que estava disposto a comprar o jornal de domingo, já que  queria assistir ao jogo da Eurocopa entre Portugal e França. Daí, não tive outra  alternativa senão  sai.

    Como o shopping fica relativamente perto da minha rua,  lá fomos, Elza e eu,  ao lugar combinado. O tempo não estava nem  quente nem frio. O sol não mais se fazia presente lá fora. Caminhamos com passos  em ritmo  normal.

   Olhamos no caminho  os restaurantes já com poucos  clientes  dentro. Os que examinamos  são especializados em   galeto, com batata frita e farofa - apreciado prato  dos cariocas.

   Entramos no  Shopping. Como sempre,  gente saindo, gente entrando,  inclusive nós. Gente de todas as idades,  caminhantes  que talvez nunca mais  veremos  na vida. São os rostos  dos anônimos, logo esquecidos.

  O mundo é grande. A vida, breve, enunciado um tanto surrado, contudo válido sempre. Da infância à adolescência um pulo; outro pulo, da adolescência à mocidade e assim  em todas as fases, até a última, a velhice. Nesta estamos  Elza e eu já  inseridos,  olhado  mais para o passado, para os tantos  pedaços  felizes  o  tristes, mas, assim  mesmo, não deixando de olhar  para trás. Elza costuma  me dizer que as pessoas estão sempre voltando às lembranças,  boas ou ruins,  do passado.Ela tem  razão. É só observar  o quotidiano  das pessoas, os museus,  as lojas de antiguidades,  as fotos  antigas,  os filmes  passados,  os autores  do passado,  a arquitetura   dos prédios  de antanho.Como  olhar o futuro se ainda não existe? Ficamos, então,  oscilando entre o presente e o passado. Essa é regra  geral. Projetamos  o futuro? Sim, mas  ele apenas é uma possibilidade,   um sonho,  uma utopia,   um algo  por vir prenhe de incertezas  e de ciladas.

    A vida humana é, na velhice principalmente, um  contínuo e  intermitente  flashback. Já deram conta disso, leitores da minha geração? Foi quiçá por esses motivos que sempre quis ler o  livro, de resto,  ainda excelente,  em muitas dimensões de leitura,  para o nosso tempo, que é Idade, sexo e tempo, de Alceu Amoroso Lima (o Tristão de Atahyde, 1893-1983). Tanto para mim  é bom  que voou lê-lo mais outra vez.

   Comprei o jornal. Elza, sempre atenta às vitrines,  . Gosta de ver  as novidades de  bijuterias, assim como  de jóias, colares,  anéis,  pendentes,  brincos. Esqueci de  mencionar que Elza adora também  ver artigos de cama e mesa, toalhas,    lençóis, cobertores,  colchas,   travesseiros, fronhas.   Tudo muito  caro.É a crise. Tudo agora é culpa da crise, quando a culpa cabe aos responsáveis pela crise cujos nomes os leitores já sabem quais  sejam se estiverem  habituados a ler os meus textos  neste  Blog que assino    desde 2009.

   Paramos um pouco dentro do shopping. Fomos sentar num banco vazio  defronte de uma salão de beleza. O movimento no salão estava regular. Ficamos  sentados, apreciando  o ir e vir de pessoas no corredor  ladeados de  lojas  bonitas  e muito  limpas. Dei uma  olhada geral na primeira página do jornal com várias chamadas  a colunas  e a reportagens.

  Em seguida,  abri  na coluna de Ferreira Gullar. Lia a crônica  “O banal maravilhoso,”  que fala de  animais ressaltando-lhes as qualidades e usando como contraponto o ser humano como  o único a animal  a  que nasce com  a potencialidade  intelectual de  admirar  pintura,  música poesia, de fabricar máquinas.  Entretanto,  os bichos  lhe são sempre caros, não há dúvida e por isso deixa implícito  o seu  enorme  afeto  por eles, sobretudo pelos que  demonstram maior  interação com  seus  donos.

  No final da crônica, um pouco abaixo,  uma nota na qual   poeta de Poema sujo refere a um  represália recente   do  poeta, ensaísta  e tradutor  Augusto de Campos. Gullar  declara que não vai mais responder a nenhum  insulto  do Augusto, irmão do grande  tradutor Haroldo de Campos (1929-2003). Não quer mais  bate-boca com quem  ele chama de “Augusto,  o Furioso.”

   A briga dele  com  o  intelectual  paulista se prende a questões  de um disse-não disse  relacionadas  a Oswald de Andrade (1890-1954),  ou mesmo à época em que Gullar, a princípio poeta concretista (1956), depois, se afasta dessa vanguarda do grupo paulista e lança o movimento poético  Neoconcretismo (1957), juntamente com  Reynaldo Jardim (1926-2011).

   Todavia,  desta vez, o embate  é  de natureza  política, uma vez que Gullar  descasca o petismo  enquanto que o outro  é a favor  do Lula e da Dilma. Reitera  Gullar na nota que não leu nem vai ler a catilinária do Augusto. Gullar, quando quer, é mordacíssimo  apenas usando  poucas  palavras. Pelo visto,  entre petistas e não petistas  não há espaço para o jogo dialético visto que  a ideologia   petista só  funciona na base do extremismo,   da cegueira  e da idolatria   alimentada  pela cegueira   do fanatismo.


  Último passo do passeio ao shopping: entrei  na livraria e comprei dois livros: uma obra  de Erich  Auebach (1892-1957) e um  volume de uma língua estrangeira que há anos cultivo com maior intensidade.Voltamos  para casa. Já era noite.

sexta-feira, 22 de julho de 2016

O Caçador de Pipas

Foto Arq. Google




José Pedro Araújo
Já falei, em alguma das minhas crônicas anteriores, que sou louco por pipa, ou papagaio, no dizer dos maranhenses da região central deste imenso e belo estado. Tão louco, que até bem pouco tempo, já homem barbado, sonhava empinando um Suru de cores brilhantes sob o céu azul de maio. Mas a minha loucura foi mais além: tentei passar para os meus filhos o gosto pela arte pipeira, porém, o sucesso foi apenas parcial. Apenas o filho do meio ainda se anima com os papagaios e, quando o inverno se vai e chegam os ventos, compra um ou outro em uma esquina qualquer da cidade, onde alguns abnegados tentam ganhar alguns trocados comercializando este instigante produto lúdico.
A propósito disto, num sábado desses, estava eu curtindo minha preguiça, estirado em uma rede na sala de estar de minha casa, quando meu filho chegou com um papagaio novinho em folha e me convidou para empiná-lo. Saltei da rede de pronto, espantei a preguiça para longe, e o acompanhei até a esquina mais próxima. É claro que empinar papagaio não é mais a mesma coisa. Os fios elétricos estão por toda parte atrapalhando o voo livre dos artefatos voadores, para desgosto da criançada. Mas, o primeiro problema foi decidir com meu filho quem iria empinar a pandorga e quem deveria segurar o bicho no alto para facilitar a decolagem.  
Problema resolvido, coube-me a tarefa menos nobre de ser o co-piloto, ou seja, o coadjuvante na empreitada de fazer o bicho subir aos ares. Estava iniciada a brincadeira. Um pouco destreinado, meu filho demorou um pouco a livrar a pipa dos fios e da copa das árvores. Parece ser assim como andar de bicicleta. Perde-se a habilidade, mas não o jeito. E assim, o nosso brinquedo subiu aos ares, não sem antes resolvermos um pequeno problema de equilíbrio, já que o bicho teimava em querer rodar. Já viu se tivéssemos que colocar um rabo nele! Seria desmoralizante para alguém que se arvora de ser um grande expert no assunto.  
Passado algum tempo, aproveitando a sombra de uma árvore, imaginei que a brincadeira poderia se tornar mais agradável: corri até a minha casa e apanhei na geladeira uma cerveja véu-de-noiva, coloquei-a em um isopor e voltei para debaixo da árvore. Dava umas lanciadas no papagaio e, após instantes de pura veneração, voltava para tomar outro gole da minha gelada. Descobri a pólvora: a combinação empinar papagaio/tomar uma cervejinha estupidamente gelada, em um dia de folga, é uma das coisas mais relaxantes que eu conheço. Pura delícia.  
Mas, justificando o título acima, volto a afirmar que fui um dos maiores caçadores de pipa no Curador. Quem já brincou de empinar papagaio sabe que existe uma regra imutável na função: “Artigo Único: se a linha do teu papagaio se romper, ou mesmo, se alguém a cortar, quem conseguir apanhá-lo será o seu novo dono”.
Pelo que parece, funciona assim em todo o mundo. Quem já leu o best seller O Caçador de Pipas, sabe do que eu estou falando. Um dos pontos altos da trama desenvolvida pelo autor é sobre a habilidade do menino Hassan em caçar as pipas que tinham suas linhas cortadas. Da mesma forma, quando criança, consegui me apropriar de muitas pipas que caiam na região da lagoa do Curador. Como os ventos sempre sopram de sul para norte, ou seja, da praça da igreja para a praça da bomba, os papagaios empinados no largo do mercado e região, sempre eram levados pelo vento e caíam nas imediações da lagoa, quando tinham suas linhas quebradas. E eu, sabedor disto, ficava a olhar para o céu procurando alguma pipa perdida. Depois, era correr para o local onde sabia que elas sempre caíam e, depois de muito custo, pois elas sempre se embaraçavam nas árvores, apanhá-las e sair mostrando o troféu.
Na verdade, meu interesse maior era pela linha que ela carregava, cujo preço era muito alto para os meus padrões. Tanto fazia ser linha zero ou linha oito, a torcida era para ter o maior tamanho possível. Bons tempos aqueles, quando o céu ficava coalhado de papagaios coloridos e seus besouros roncadores. São lembranças como esta que me levam ao meu tempo de criança, época em que as responsabilidades se restringiam a estar em casa na hora das refeições e tomar banho nos finais de tarde.  
Deitar nas calçadas, com o olhar fixo no céu azul, vendo lá no alto uma pipa brincalhona fazendo travessuras, era um programa que me deixava muito feliz.  
As crianças de hoje quase não brincam mais com elas. Elas passam as horas de recreio deitadas em algum sofá, sem exercitar os músculos. E por esta razão, mostram-se, a maioria, obesas e entediadas. Se me propusesse, algum dia, dirigir os destinos de uma cidade, por menor que ela fosse, criaria a praça dos papagaios, um espaço bem amplo onde a criançada pudesse por em prática suas habilidades aeronáuticas. Naquele espaço, seriam proibidas as concentrações políticas ou religiosas. Não se permitira também a montagem de barracas ou quiosques para comercializar outro produto, que não o material para a confecção de papagaios ou gostosos lanches, a ser devorado nos intervalos entre o empinar de um Suru e outro.
A propósito do título acima, um dos meus irmãos, tão aficionado como eu pelos papagaios, me lembrou que o menino Hassan da história de Khaled Housseni, sofreu violência nas mãos de uns meninos maus quando apanhava um papagaio perdido. Esta, aliás, foi uma das passagens mais tristes da bela história. Menos mau que por aqui não existia gente de tão má índole. Tirando alguns arranhões e/ou ferroadas de insetos, nada de mal nos acontecia.
o por toda a parte, atrapalhando o veclamaçnha casa, quando meu filho chegou com um papagaio novinho em folha e me convidou par  

terça-feira, 19 de julho de 2016

Ariston Costa - Uma Estrela Emergiu no Céu do Curador



                                                                                                                                    José Pedro Araújo
Altino Gomes da Costa


Tenho me debruçado nesses últimos tempos a escrever sobre algumas famílias do jovem município de Presidente Dutra, especialmente aquelas que se destacaram politicamente nesses seus 72 anos de emancipação política e administrativa. Nos textos publicados até aqui toquei de leve em um desses agrupamentos familiares cujo cognome é Arapuá. Pois a família sobre a qual pretendo discorrer hoje, mais especialmente um de seus membros, pertencente à vasta população desse clã. Refiro-me ao mais surpreendente deles, Ariston Costa.  Antes, porém, quero tecer alguns comentários sobre seu pai, Altino Gomes da Costa.
Altino Gomes era Arapuá, entretanto, apesar do sobrenome, não era um Gomes de Gouvêia. E apesar de não ser parente de Honorato Gomes de Gouvêa, foi quase sempre seu aliado político. Quase sempre porque, nas primeiras eleições para prefeito do Curador, era aliado de Virgolino Cirilo de Sousa, conforme o registrado em uma nota de apoio ao Interventor maranhense, Saturnino Belo. A nota ao qual me refiro foi publicada no jornal “Diário de São Luís”, de 06.08.1946, e Altino subscreve-a como novo partidário do PSD, juntamente com Virgolino Cirilo, Nelson Sereno, Adalberto Macedo, José Elias Almeida, Durval Cunha Santos e Pedro Francisco Salvador. Fazia parte da cúpula do partido.
O mesmo jornal, em matéria publicada no dia 09/03/1949, noticia que Altino Gomes fez a sua adesão ao PST, novo partido criado no estado por Vitorino Freire: “Acaba de aderir ao PST, o Sr. Altino Gomes, conceituado comerciante e influente político no município de Presidente Dutra. O novo membro vinha militando na UDN, sendo suplente de vereador por essa corrente política”. Infere-se desta nota que o político presidutrense saía do grupo político denominado Oposições Coligadas, para apoiar a ala vitorinista. Acredito ainda, que a partir deste momento Altino Gomes deixou a fracção de Virgolino Cirilo de Sousa e passou para o lado da de Honorato Gomes. Também se observa que ele havia disputado as eleições para vereador do novo município do Curador, não tendo, contudo, logrado êxito.
 Nascido na região do Curador em 1905, sua família tinha origem em São João dos Patos, entretanto. Comerciante e pecuarista, foi Juiz de Paz e líder político desde os primórdios do município.  Mas Altino notabilizou-se por ser o pai de Ariston Costa, um das estrelas mais fulgurantes a nascer no velho Curador.
Ariston Costa
Ariston Costa nasceu no povoado de Curador, município de Barra do Corda-MA, em 30.12.1931, iniciando-se nas primeiras letras com os mestres-escolas que substituíam os colégios tradicionais que ainda não possuíamos. Com o passar dos anos, e para prosseguir com os seus estudos, partiu para a capital maranhense, ingressando no Liceu Maranhense. Em São Luís também, entrou para o 24º Batalhão de Caçadores do Exército, onde prestou serviço militar ainda no início dos anos 50. Depois disto, mudou-se para o Rio de Janeiro e entrou para a Faculdade de Engenharia, passando a residir em uma residência que abrigava estudantes do seu estado, bancada pelo Governo do Estado do Maranhão. Foi colega de república de Jackson Lago, ex-governador, já falecido, e do atual Senador João Alberto de Sousa. Não chegou a concluir o curso de engenharia, pois logo estava de volta ao Maranhão, passando a atuar como advogado provisionado, em uma época em que essa profissão era muito comum, especialmente em cidades interioranas, e em decorrência da falta de profissionais formados nessa área das ciências humanas.
Ariston não voltaria logo a residir na sua terra natal, tendo se fixado primeiramente em Mirador, cidade maranhense situada no sertão, e lá conheceu a jovem Iraci, que viria a ser a sua esposa e mãe dos seus filhos. De volta a Presidente Dutra, passou a atuar em toda a região, em especial nos municípios que se acham em volta deste. A política partidária que já estava no seu sangue, passou a ocupar espaços também na sua mente e na sua alma. No vácuo de uma disputa eleitoral entre o governador Newton Bello e o deputado Federal Eurico Ribeiro, cuja principal base eleitoral era justamente a região de Presidente Dutra, Tuntum, Dom Pedro e circunvizinhanças, surge a figura do jovem advogado Ariston Costa. Com o apoio do prefeito de Presidente Dutra, Honorato Gomes, e do governador do estado, Newton Bello, que tinha como meta minar as bases eleitorais do deputado Eurico Ribeiro na região, o jovem presidutrense lançou-se com toda a força e gana política em busca dos votos dos eleitores da região do Japão, e logrou êxito logo na sua primeira tentativa.
Importante lembrar que Presidente Dutra e Tuntum, foram os principais redutos em que Ariston amealhou mais votos. Em Tuntum havia uma disputa renhida entre a família Léda, capitaneada pelo ex-prefeito Ariston Léda, com o apoio do seu sobrinho Eurico Ribeiro, e do prefeito Luiz Gonzaga Cunha. E em Presidente Dutra, a oposição ao prefeito Honorato Gomes, formada pelos Léda, que já haviam dirigido o município em duas oportunidades (Ariston Léda e o irmão Adir Léda), além do grupo dos Sereno, já sem o antigo poder de outrora, e de mais um apanhado de pequenas lideranças, que, somadas ao vice-prefeito Valeriano Américo de Oliveira, e apoiada por Eurico Ribeiro, formaram um novo grupo político que iria dirigir o município por longos anos, como já falamos em crônicas anteriores.
Pois foi nesse ambiente de duras disputas que surgiu a figura emblemática de Ariston Costa. Apoiado por Honorato Gomes, em Presidente Dutra, e pela numerosa família Arapuá e pelos adversários dos Léda e dos Cunha em Tuntum e região, Ariston conseguiu expressiva votação, suficiente para lhe conduzir a Assembleia Legislativa do Estado como o primeiro deputado estadual presidutrense. Presenciei certo dia um discurso de Ariston Costa através de uma amplificadora em Tuntum. Estávamos visitando um amigo de meu pai naquela cidade, Sr. Joaquim Morais, ele próprio um dos opositores dos Léda e apoiador de Ariston Costa, quando começamos a ouvir a radiofônica transmitir um discurso duro, recheado de ataques ao grupo que governava o município. Impressionado com a virulência da mensagem, mas e, sobretudo, com o poder da oratória de quem falava naquele instante, perguntei ao meu pai quem era o orador. E ele, sorrindo diante da minha curiosidade, respondeu que era Ariston Costa quem discursava. Estávamos em plena campanha eleitoral, e o clima beligerante era possível de ser sentido no ar, na pele, quase ao ponto de tocá-lo dom a ponta dos dedos. Foi preciso a intervenção do exército brasileiro na região para que as eleições pudessem acontecer em um clima de relativa segurança.  
Jovem Ariston Costa
O final dessa história todos já sabem. Foi trágica e triste. Ariston elegeu-se, e com a força do seu discurso e do seu poder de articulação, logo foi nomeado vice-líder do governo na assembleia legislativa do Maranhão. Contudo, usou do poder que detinha de forma demasiada, fruto da idade, pois contava com apenas 31 anos quanto foi guindado ao posto de primeiro deputado estadual presidutrense, e ao de vice-líder da situação. Pelo que consta, Ariston utilizou tudo isso para tentar minar as forças dos seus opositores, em um período conturbado, quando os militares tomaram conta do país.
Em uma de suas ações mais duras, fez com que o exército conduzisse coercitivamente para São Luís os prefeitos de Tuntum e de Presidente Dutra, além de outros adversários seus. A ação desagradou a muitos e poderosos adversários, o que culminou com a sua cassação. Esses fatos que resultaram na interrupção do seu mandato não estão muito claros para mim. Há uma certa cortina de dúvidas a obstruir os reais motivos da cassação do mandato do nosso primeiro deputado eleito, pois em nenhum das relações que constam os políticos cassados no Maranhão, aparece o nome de Ariston.
Mas, esse não seria o problema maior pelo qual passaria o jovem deputado. Enquanto trabalhava pela sua reabilitação política, Ariston continuava a atuar na região e a amealhar inimigos políticos também. E quando se achava próximo de conseguir o seu intento, qual seja o seu retorno ao mandato de deputado, Ariston foi barbaramente assinado por um pistoleiro de aluguel quando transitava pela cidade de Dom Pedro, com destino a São Luís. A história desse assassinato que abalou a população de Presidente Dutra e região, já contei no meu livro “De Curador a Presidente Dutra – história, personalidades e fatos”. Não pretendo descrevê-la aqui.
Ariston Gomes da Costa foi uma estrela fulgurante que brilhou nos céus do Curador, mas que partiu cedo, aos 33 anos de idade, vítima do ódio e do rancor que insistia em cobrir de dor o povo ordeiro da região, e de encharcar de sangue a terra bendita e fértil do nosso velho Curador. Menos mal que, ultimamente, as disputas eleitorais têm sido travadas no campo das ideias e do poder de convencimento. Apesar de duros, renhidos, muitas vezes injustos, os embates eleitorais, apesar de deixar sequelas, dividir amizades antigas e emplacar mágoas profundas, ficam apenas nisso. 
Presidente Dutra, e região, viveu tempos de violência avultada desde o princípio, quando ainda se chamava Curador, foi o que tentei mostrar nas diversas crônicas que publiquei nesse espaço. Contudo, esse comportamento que beirava a insanidade, não era primazia da nossa região. Ao contrário, era um prolongamento do que ocorria, desde tempos imemoriais, em todo o país, e de modo especial no nordeste brasileiro, quando o coronelismo atuava de forma dura e cruel para manter-se no comando dos poderes locais. As práticas violentas travadas em Grajaú para manter o mando na política, entre os Léda e os Costa Araújo, foram estendidas até as terras do Curador, e aqui fizeram seus estragos. Todavia, quem se der ao trabalho de lançar um olhar sobre as famílias que se engolfaram tantas vezes em lutas violentas para conquistar o poder regional, verá que hoje elas convivem pacificamente, até mesmo se entrelaçaram familiarmente, através do casamento de alguns de seus descendentes. Isso só prova que o tempo é de fato o senhor da razão. Os excessos, as porfias sangrentas, devem ser mantidos longe das disputas eleitorais. Sempre e para o bem da democracia!
Com esta última crônica, encerro o meu “Projeto 28 de Junho”, que até já entrou sem controle por metade do mês seguinte. Tentei aqui relatar os fatos históricos acontecidos na cidade com base nas minhas pesquisas, no depoimento de pessoas amigas, e na minha própria  percepção dos fatos acontecidos. Não me detive em exprimir ideias preconcebidas, apaixonadas, ou de valor, sobre os fatos aqui relatados. Não tinha, e nunca tive, esse propósito. Quis, como já externei aqui, apenas ressuscitar fatos acontecidos na região, impedindo que eles caíssem em completo esquecimento. Mas, volto a repetir, o meu verdadeiro propósito é provocar a juventude da minha terra, para que vá fundo na elucidação dos acontecimentos e não deixem que a história da brava gente do nosso Curador venha a submergir no negro mar do esquecimento. Por tudo o que fizeram, de bem ou de mau, não merecem eles cair no esquecimento.

sexta-feira, 15 de julho de 2016

A Família Carvalho de Sousa - Presença Massiva e Atual no Poder



José Pedro Araújo

Ciro Evangelista de Sousa
Das maiores famílias que pontificaram ou ainda marcam presença na política partidária em Presidente Dutra, resta falar sobre este ramo do que genericamente chamamos de “os Arapuás”. Arapuás é na verdade um grande conglomerado familiar, se é que podemos usar o termo para designar um grande número de famílias que foi se juntando para formar uma só, composta por vários sobrenomes. E são tratados por esta designação por agirem tal qual uma espécie de abelha que habita na região, cuja maior característica é a coesão, o aguerrimento, a zanga e a capacidade de proliferação monumental. Tão monumental que se espalham por vários municípios, dentre estes, Tuntum e Santa Filomena, além de Presidente Dutra. Mas é sobre um ramo dessa grande colmeia que eu quero tratar hoje, os Carvalho de Sousa.

                Esse ramo familiar foi formado por Ciro Evangelista de Sousa, que vem a ser o pai de Jean, Jurandy, Juran e Jurivan Carvalho, políticos com grande ascendência política em Presidente Dutra nos últimos tempos, sobretudo. Ciro Evangelista era proprietário rural e ingressou na Câmara Municipal de Presidente Dutra, como vereador, na eleição de 1976. Cidadão afável, com largo trânsito entre os da sua terra, marcou a chegada da família ao poder local nesses últimos anos. Aproximei-me dele no período em que estudei com o seu filho, Jean Carvalho, em Teresina. Deste modo, nas férias frequentava a sua fazenda situada na BR 226, próxima à do meu pai. Como ele residia na propriedade, era raro o sábado em que não passava o dia por lá para degustar alguns capotes e tomar um garrafão de vinho Sangue de Boi na companhia de alguns amigos do seu filho Jean.

         Ciro, como já afirmei, representava uma família numerosa, e fazia parte do grupo político de oposição a Valeriano Américo desde muito tempo, como um dos seus principais representantes. Mas somente nas eleições de 1976, quando a ala política da situação trabalhava para eleger Lindomar Lucena, foi que ele resolveu se lançar na disputa por um cargo de vereador, pelas oposições. E foi eleito logo nessa tentativa, mostrando a força da sua representação. Cidadão simples e de gestos refinados, não teve dificuldades para seguir nessa nova empreitada da vida, mas passou rapidamente o bastão aos filhos quando achou que eles estavam prontos para representar a grande família Arapuá, agindo nos bastidores. Estava presente, deste modo, no grande grupo de oposição que levou Remy Soares ao poder, mas pôs em seu lugar na Câmara Municipal o filho Jurandy, naquela eleição de 1982. Dai em diante ficou a observar a chegada dos irmãos Carvalho ao poder do ponto de observação mais estratégico: o seio da família.

Jean Carvalho de Sousa
             Jean Carvalho de Sousa, o filho mais velho, médico por formação e político por herança genética indissociável, já foi alvo de uma crônica isolada aqui neste blog, pelo muito que representou na política local. E por esta razão, no devo me deter mais ao seu nome. O segundo da família, Jurandy, como já relatei, foi quem recebeu o bastão das mãos do pai, Ciro, e tomou assento na Câmara Municipal logo na sua primeira disputa. Na eleição seguinte, já fora do grupo de Remy, partiu para uma eleição à prefeitura municipal concorrendo contra seu antigo aliado no pleito que seu concorrente, Agripino Campos Neto, foi eleito. Foi derrotado nesse primeiro momento, mas nas eleições seguintes, em 1992, elegeu-se prefeito municipal de Presidente Dutra. Jurandy Carvalho se lançou candidato a prefeito naquelas eleições com a autoridade de quem havia amealhado uma montanha de votos na corrida eleitoral anterior para prefeito, quando havia concorrido com outros dois candidatos: Agripino Campos, médico, pela situação, e Adenor Lira, outro médico, apoiado pelo grupo de Valeriano Américo.

Jurandy Carvalho de Sousa
             Na seguinte eleição, tonificada a sua candidatura com novas alianças, inclusive pelo grupo político de Valeriano Américo, e tendo Lindomar Lucena como candidato a vice-prefeito, Jurandy concorreu com a esposa de Remy Soares, Irene Soares, obtendo uma vitória avassaladora, baseando o seu discurso na alternância de poder e no favorecimento das camadas mais pobres da população. Interrompia-se, depois de duas administrações seguidas, a predominância do grupo de Remy Soares, mas, não por muito tempo, como vimos em crônicas anteriores.

            A administração de Jurandy Carvalho foi voltada para a educação, ocasião em que reformou muitas escolas em todo o município, dando especial ênfase à melhoria da qualidade do ensino e na ampliação do número de alunos matriculados. Foi durante o seu período administrativo que se deu grande impulso no ensino de 2º grau em escolas do próprio município. Além disto, trabalhou pela melhoria na urbanização da cidade, como a transformação de parte da BR-226 em avenida, constituindo-se aquele trecho em importante artéria comercial, a Avenida José Olavo Sampaio. Outra obra de grande significância foi a construção do terminal rodoviário “Dep. Ariston Costa”, aspiração antiga dos moradores do município.

          O que se viu depois foi uma grande alternância de poder no município. Jurandy não conseguiu fazer o seu sucessor, perdendo a eleição para o próprio Remy Soares, de quem já havia sido aliado, mas elegeu o médico Joaquim Figueiredo na eleição seguinte, em 2000. Na outra eleição, em 2004, foi a vez do grupo de Remy voltar ao poder, tendo sido eleita a sua viúva, Irene Soares, que se manteria no poder por oito anos consecutivos, devido ao advento do instituto da reeleição. Nessa última eleição, Irene Soares venceu o empresário Raimundo Carvalho, em composição formada com o PT. Concorreu ainda nesse pleito, o empresário José Fernando Gonçalves de Sá, que ficou em terceiro lugar no pleito.

Juran Carvalho de Sousa
Juran Carvalho, irmão de Jurandy e de Jean, concorreu à prefeitura municipal nas eleições municipais que ocorreram em 2008, contra a candidata Irene Soares, que tentava a sua reeleição, e perdeu, apesar da grande quantidade de votos obtidos. Na eleição seguinte, de 2010, para os cargos do legislativo, e também Governador e Presidente da República, uma candidata da terra, Priscylla Sá, concorreu para deputada estadual e ficou com a primeira suplência na sua coligação. Priscylla assumiria o mandato por alguns meses. Ocorreu nessa eleição um fato único, quando a imensa maioria do eleitorado local votou na candidata da terra sem observar em qual ala política ela militava.

Juran Carvalho voltaria a disputar as eleições de 2012 para prefeito municipal contra quatro outros candidatos e ganhou, ficando em segundo lugar o empresário Raimundo Carvalho. Como prefeito, tem feito uma administração profícua, realizando muitas e variadas obras por todo o município. Com ênfase na periferia da sede, tem promovido o asfaltamento de ruas e cuidando do saneamento de outras tantas, além de trabalhar pela construção da sede definitiva da prefeitura municipal e do centro administrativo, obras em que se instalarão, além do gabinete do prefeito, as secretárias municipais. Político habilidoso, Juran enfeixou uma coligação ampla para as eleições que ocorrerão neste ano, quando tentará a sua reeleição.

Jurivan Carvalho de Sousa
           Jurivan Carvalho de Sousa é outro filho do chefe do clã formado por Ciro Evangelista de Sousa, a pontificar na política presidutrense. Eleito para o cargo de vereador nas eleições de 2004 tem renovado o mandato em eleições sucessivas, de 2008 e 2012, para a câmara municipal. Jurivan Carvalho é o quarto membro da família a ocupar um posto de vereador no legislativo municipal, tendo sido precedido no cargo pelo próprio pai, Ciro, e pelos irmãos Jean e Jurandy. Atualmente ele ocupa o posto de Presidente do legislativo municipal.

          Desde as eleições de 1976, a família dispõe de um vereador na tribuna do palácio legislativo municipal, às vezes dois, como na 14ª legislatura, no quadriênio 2005/2008, quando tinha assento em duas das nove cadeiras de vereador pelo município. 
José Henrique S. Lima
           Para aquele pleito, além de Jurivan Carvalho, um primo em primeiro grau, José Henrique de Souza Lima, advogado, preocupado com as causas ecológicas, também ocupava um cargo no legislativo municipal. José Henrique vinha de dois mandatados anteriores naquela casa, comprovando a força política da família. Nos últimos pleitos este primo em primeiro grau deixou de concorrer à vereança devido a forte concorrência que estabeleceu. Isso naturalmente trouxe desgaste nas relações familiares. O que se comenta hoje nas rodas políticas locais é que José Henrique não comunga mais dos mesmos interesses da família que se acha no poder. É o que vamos ver na campanha que se avizinha, e que promete ser uma das mais acirradas, como, de resto, tem acontecido nos últimos tempos.  
           O outro irmão, Juraildo, elegeu-se vereador no município vizinho de Senador Alexandre Costa. E no pleito seguinte, lançou-se a vice-prefeito logrando, a sua chapa, um empate com a chapa concorrente. Os adversários, contudo, ganharam as eleições pelo critério da idade.