José Pedro Araújo
Quando se pensa que já se viu de tudo em matéria de
covardia e falta de escrúpulos, mais um fato carregado de extremada violência
veio atemorizar e assaltar os moradores de Presidente Dutra, mostrando que a
mente humana é capaz de engendrar atrocidades que nem o mais selvagem dos
animais de outras espécies seria capaz de cometer. É sabido, contudo, que o
homem, apesar de toda a aparência de civilidade que possa aparentar, transforma-se
em algo perigoso e capaz de cometer ações repletas de grande violência em
fração de segundos, depois de mostrarem-se calmos e controlados a vida inteira.
Torna-se por isso, em um dos animais mais nocivos a viver nessa natureza já
repleta de outros animais violentos. Estes últimos, pelo menos, só atacam para
saciar a fome de que estão acometidos, enquanto os outros, os ditos humanos, apesar
de terem sido dotados de um cérebro que lhes permite pensar, são capazes de
cometer violências contra o seu semelhante que beira o inimaginável.
Faço essas
primeiras considerações para, finalmente, relatar um caso que abalou a cidade e
que atingiu pessoas da própria comunidade. Nesse período eu passava minhas
férias escolares no Creoli do Joviniano, onde meu pai possuía um comércio e um
depósito para compra de arroz e babaçu.
Fiquei particularmente apreensivo com o fato, porque, ainda criança,
gostava de caçar passarinhos nas imediações do povoado e soube que o assassino
que praticou o ato que contarei a seguir havia fugido para as matas, para aquela
direção em que eu me encontrava.
A tragédia a
que me refiro se abateu contra uma senhora idosa, mãe de um proprietário rural
chamado bastante conhecido e que privava da amizade do meu pai e que, por esta
razão, frequentava muito a nossa casa.
Este fato de
extrema violência aconteceu mais ou menos assim, se a minha memória não me
trai: Uma senhora já idosa criava uma garota, que estava na época com seus 16
ou 17 anos, a quem considerava como verdadeira filha, cercando-a de todos os
cuidados e cumulando-a de muitos agrados. E essa jovem, nesta idade em que os
homens as assediam muito, estava de namoro com um rapaz, não me recordo se
conhecido da comunidade ou se se tratava de alguma pessoa de passagem pela cidade.
O certo, é que
o namoro esquentou e chegou naquele ponto onde os dois não se contentam mais somente
com beijos e abraços, e daí vem a necessidade de prosseguir mais um pouco para
frente. Como a senhora já idosa dormia cedo, cansada da labuta diária, a moça
combinou com o rapaz que aparecesse em casa logo após a dona da casa se
recolher para dormir. A casa, se não me falha a memória, situava-se no São
Benedito, aprazível bairro muito próximo ao centro da cidade, portanto. A casa,
contudo, ficava isolada fato que a tornava apropriada para um encontro furtivo.
Naquele dia
fatídico, noite já alta, o rapaz apareceu de acordo com o combinado. E, diante
das circunstâncias, ao se sentirem sozinhos, o clima ficou muito aceso para o
casal. O certo é que fizeram muito barulho e acordaram a pobre senhora. Assustada
com o que lhe pareceu ser a ação de algum ladrão, a idosa preocupou-se coma a
segurança da moça e gritou pelo seu nome enquanto se acercava do quarto onde a
mesma dormia.
Sempre
clamando pela moça, a pobre senhora adentrou ao dormitório. Ela que, segundo
contam, também era cega, portanto não poderia jamais identificar se havia
alguém mais no quarto, pelo menos seria incapaz de reconhecer quem estava lá,
além da moça. O sorrateiro visitante, apavorado com a presença da velha
senhora, apropriou-se de uma grande faca peixeira que sempre carregava consigo
e desferiu profunda facada no tórax da mulher, matando-a quase instantaneamente. Acabava de acontecer um dos crimes mais
bárbaros que se tem notícia na região. A vida de uma pobre velha indefesa foi
ceifada por um indivíduo sem escrúpulos e sem o menor respeito pela vida do seu
semelhante. Nem mesmo o fato daquela senhora já possuir idade para ser a sua
avó, foi motivo suficiente para aquele facínora pensar duas vezes antes de
cometer tamanha atrocidade.
Não foi
difícil para a polícia identificar o assassino, pois a moça, descontrolada, e
com a terrível problema de consciência, frente ao acontecido, acordou toda a
vizinhança com seus gritos estridentes. E logo uma caçada policial sem precedentes
na região, espalhou-se em todas as direções, buscando a captura do frio
assassino. A crueza do fato extremo levou a comunidade a percorrer as trilhas de
toda a zona rural juntamente com a polícia, até que, ao fim do terceiro dia,
aprisionaram o delinquente nas imediações de um povoado não muito distante da
cidade. Toda a população da cidade e do campo se envolvera na sua captura, tal
a sordidez do crime cometido por ele.