quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

Todo Dia É Ano Novo!




Autor desconhecido.

Todo dia é ano novo
Entre a lua e as estrelas
num sorriso de criança
no canto dos passarinhos
num olhar, numa esperança...

Todo dia é ano novo
na harmonia das cores
na natureza esquecida
na fresca aragem da brisa
na própria essência da vida.

Todo dia é ano novo
no regato cristalino
pequeno servo do mar
nas ondas lavando as praias
na clara luz do luar...

Todo dia é ano novo
na escuridão do infinito
todo ponteado de estrelas
na amplidão do universo
no simples prazer de vê-las.

Nos segredos desta vida
no germinar da semente
Todo dia é ano novo
nos movimentos da Terra
que gira incessantemente.

Todo dia é ano novo
no orvalho sobre a relva
na passarela que encanta
no cheiro que vem da terra
e no sol que se levanta.

Todo dia é ano novo
nas flores que desabrocham
perfumando a atmosfera
nas folhas novas que brotam
anunciando a primavera.

Você é capaz, é paz
É esperança
Todo dia é ano novo
no colorido mais belo                                                                                                                                  dos olhos dos filhos seus...

Você é paz, é amor, alegria de Deus.
Não há vida sem volta
e não há volta sem vida
no ciclo da natureza
neste ir e vir constante
No broto que se renova
na vida que segue adiante
em quem semeia bondade
em quem ajuda o irmão
colhendo felicidade
cumprindo a sua missão.

Todo dia é ano novo...portanto...feliz ano novo todo dia!

terça-feira, 29 de dezembro de 2015

O Tesouro dos Jesuítas

Aspecto da região onde acredita-se está o tesouro escondido


Reinaldo Coutinho
Romancista, contista e cronista.

          Distante uns 40 km da cidade de Oeiras, antiga capital da Província do Piauí, visitamos um conjunto de afloramentos areníticos do lugarejo Brejo, já próximo ao município de Nazaré do Piauí. O local é um extenso pediplano arenoso e pedregoso, típico de semiárido, com vegetação esturricada de caatinga.

         As plantas são pequenas, tortuosas, de folhas pequenas e espinhentas. Destaca-se ali o faveiro, gameleira e cactáceas. Dado a inclemência climática e os solos incultos, o local é escassamente habitado. Uma pequena cascata, de uns seis metros de queda a pique, ameniza o calor dos excursionistas durante as curtas chuvas de verão.

          Aquele relevo ruiniforme nos descortina com arcos, torres, a "pedra do sete", o "pinguim e o cachorro", além de outras formas curiosas e pitorescas de erosão. 

          Na base de um boqueirão os sertanejos nos mostraram um misterioso "portão de pedra", de origem natural. A abertura é abobadada e dá acesso a uma lúgubre e estreita caverna, onde pululam os irrequietos e fétidos morcegos. No lado esquerdo do túnel há uma estranha fenda vertical, entulhada artificialmente por pequenos blocos de pedra, que parecem intocados há séculos. 

        Tudo indica que o entulhamento veda outro salão natural, de dimensões desconhecidas. O salão subterrâneo possui alguns “respiradouros”, talvez naturais, talvez artificiais.

      O nosso guia, caboclo das redondezas, nos confidenciou a tradição corrente no lugarejo de que aquelas pedras, arrumadas em posição tão especial, foram colocadas ali por jesuítas para esconder alguma preciosidade, durante as perseguições pombalinas de 1759.

       Pensam os crédulos sertanejos que ali haveria uma botija jesuítica, repleta de cobiçadas patacas de ouro e prata ou de reluzentes joias, à espera de algum explorador resoluto ou desencantador, decidido a remover o misterioso entulho pétreo.

        Trata-se da velha tradição nordestina, que vê a presença inaciana em qualquer sinal anormal dos sertões, tipo pinturas rupestres, rochedos inusitados, cavernas, megalitos... Restaria saber o que os escassos jesuítas do Piauí-Colônia fariam em lugar tão ermo...

         O avançado e penumbroso horário não nos permitiram uma investigação mais profunda naquele antro escabroso. O que seria mesmo encontrado ao se remover aqueles blocos empilhados da furna? Um reluzente tesouro ou carcomidos manuscritos? Ou talvez uma necrópole indígena? Ou talvez...

sábado, 26 de dezembro de 2015

Mais Algumas Fotografias para o Álbum da Cidade


PK em dia de fog londrino (by Sukarno Cruz)
          O fotógrafo Sukarno Oliveira Cruz gosta de registrar suas viagens em fotos que disponibiliza para os amigos no Panoramio. São dele as duas fotos que hoje publicamos e que trazem imagens de pontos e situações diferentes da cidade de Presidente Dutra. 
          A primeira foto acima, mostra a praça São Sebastião em uma manhã de final de inverno. Uma espessa neblina cobria a cidade, dando-lhe uma característica de cidade serrana. Atrapalhando(?) a imagem, temos a famigerada caixa-d'água que secciona a praça bem ao meio. O pior de tudo é que o monstrengo construído faz hoje parte da sua paisagem, como um monumento ao mau gosto. Mas, o que já era ruim, ficou pior com a construção de outro monumento em homenagem à feiura: um coreto horripilante que toma boa parte do espaço público. Tem utilidade? Pode ser, mas poderia ter sido projetada por um arquiteto mais preocupado com a beleza e com as formas das suas criações.

           A segunda foto abaixo documenta o antigo Largo da Bomba. Nesse local já funcionou uma zona comercial muito importante, pois abrigava também as agências de ônibus que transitavam pela cidade. Hoje a região perdeu importância em decorrência da transferência da rodoviária para o bairro Campo Danta. No lado direito da foto, à frente do cidadão que aparece na foto, funcionou também o primeiro posto de gasolina da cidade. 
Largo da Bomba. Ao fundo o Oton Hotel (by Sukarno Cruz)

quinta-feira, 24 de dezembro de 2015

Natal Sertanejo

Decoração de Natal em Teresina (Foto: cidadeverde.com)


 José Pedro Araújo
Se o Natal é uma festa cristã – e essa deve ser a sua verdadeira essência -, não é menos verdade que é também a festa do comércio, período em que os empresários vendem como em nenhuma outra época, momento para troca de presentes e de grande felicidade. Atestam os historiadores que o dia 25 de dezembro foi escolhido pelo Papa Júlio I, aí por volta do Século IV, para comemorar o nascimento de Jesus Cristo, transformando uma festa que nasceu pagã em um ato religioso. Inicialmente realizada para coincidir com a Saturnália dos romanos e com as festas germânicas e célticas do Solstício do Inverno, viu a igreja uma oportunidade de ouro para comemorar e divulgar o nascimento do Filho de Deus. E a figura do Papai Noel recaiu sobre uma personagem que, dizem, de fato existiu: o Bispo São Nicolau, nascido na Grécia no século III.

Transitando um pouco pela história, vamos encontrar que a fama de bom velhinho do bispo foi ganha quando ele ficou sabendo que um certo cidadão da sua cidade, que possuía três filhas, por não ter condições de pagar o dote do casamento delas, resolveu vendê-las à medida que iam atingido a idade própria para o casamento. Constrangido e penalizado com aquela situação, o tal velhinho foi até lá, incógnito, e arremessou pela janela uma pequena bolsa de couro cheia de moedas de ouro que caiu justamente sobre uma meia que havia sido posta para secar na lareira. Procedeu da mesma forma com a segunda filha. E o pai das moças, profundamente agradecido por aquele gesto humanitário, ficou na espreita  para descobrir quem era o benfeitor que havia impedido que ele praticasse aquele ato que tanto lhe feria o coração. Descoberto a figura de São Nicolau, saiu ele a divulgar o nome desse generoso bom velhinho. Assim, por esse tempo, a imagem que se tinha era a de um velhinho vestido de bispo e não com as vestes em vermelho brilhante como hoje o conhecemos.  

Foram os holandeses, no século XVII, que levaram para os Estados Unidos a tradição de distribuir presentes para as crianças usando a lenda de São Nicolau(Sinter Klaas). Depois disso, dois escritores americanos se encarregaram de impulsionar a fama do bom velhinho, por eles chamado de Santa Claus. O primeiro, Washington Irving, em 1809, escreveu um livro em que enaltecia as qualidades de Papai Noel, um velhinho bonachão, que montava um cavalo branco voador e arremessava presentes pelas chaminés. O segundo escritor, poeta e professor, Clement Moore, em 1823, além de enaltecer ainda mais a aura mágica descrita e popularizada por Irving, trocou o cavalo de Papai Noel por um trenó puxado por renas voadoras.  

Mas a figura de Papai Noel, só foi de fato definida quando o desenhista, também americano, Thomas Nest, fez a primeira ilustração do bondoso velhinho descendo pela chaminé, mas ainda do tamanho de um duende, tal qual vinha sendo divulgado desde muito tempo. Somente anos mais tarde, a imagem foi mudando, crescendo, e ficando mais barriguda, com cabelo, barba e bigodes longos e brancos, e a aparecer no pólo norte. Mas, o Papai Noel como nós conhecemos hoje, foi inspirado pelo artista Habdon Sundblon, que se inspirou em um velho vendedor aposentado para realizar uma campanha para a Coca-Cola em 1931.  

Aqui em terras do Curador, o nosso Natal começou a ser comemorado de maneira simples e sem muita pompa. À falta de nozes e castanhas, do panetone e do peru de natal, as famílias se serviam de iguarias simples baseadas em produtos da terra, como o porco e a galinha caipira. Sem a iluminação feérica das grandes metrópoles, por nos faltar lâmpadas e energia elétrica, tínhamos que nos contentar com a luz dos candeeiros e, mais tarde, com a do potente Petromax. Assim, como realizar uma autentica ceia de natal?

Lembro-me que quando criança, eu ficava maravilhado com os cartões de natal enviados para a minha família por alguns missionários americanos e canadenses. Mostravam paisagens belíssimas, com a neve cobrindo as casas e os vastos pinheirais, e com Papai Noel voando em seu trenó puxado por renas, cheio de presentes embrulhados em papel brilhante, amarrados por belíssimos e multicoloridos laços de fita. Os cartões vinham com mensagens impressas em inglês, com palavras para mim desconhecidas (Merry Christmas, Santa Claus, Christmas Tree, Jingle Bell, Candle, Candy Cane, Christmas Pudding, Stocking, Gift, Presents, Sleigh, Star, Light e Happy Holydays – tudo escrito com letras em vermelho e verde brilhante).

Na minha casa não tínhamos o hábito de realizar a ceia à meia noite. Seguíamos todos para a Igreja Cristã para participar de um culto especial, com a apresentação de um auto de natal, que muito nos emocionava. A árvore de natal, ao invés de um pinheiro, planta inexistente em nossas florestas, era substituída por um frondoso galho de pitombeira cheio de cachos com o fruto maduro (o enorme galho só era trazido no dia da festa, para manter as suas folhas vivas e brilhantes). O galho trazido era decorado com luzes e enfeites natalinos. Era uma festa belíssima, bem ensaiada e que, com o tempo, virou atração para a cidade inteira, ocasião em que a comunidade enchia o templo para assistir à linda apresentação que os membros da Igreja Cristã Evangélica de Presidente Dutra dedicavam anualmente aos seus concidadãos na noite de Natal.  

O Natal continua a ser, sim, uma festa cristã, onde as famílias se reúnem para louvar e festejar o nascimento de Jesus Cristo, o Filho de Deus. É também um período para reflexões e de redirecionamento das nossas vidas, substituindo tudo de ruim e mal feito que fizemos no ano que passou, por coisas novas e voltadas para o bem. Tempo para louvar Aquele que deu a Sua Própria vida para salvar nós pecadores e redirecionar o nosso futuro. Tempo, enfim, de Paz, Amor e Alegria no seio das famílias.

Feliz Natal a todos e Um Ano Novo Venturoso e Cheio de Grandes Realizações e Muita Paz no Coração!!!!!!!

  

segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

A Viagem dos Naturalistas Spix e Martius ao Piauí pelo Caminho das Boiadas

Gravura de Spix & Martius


José Pedro Araújo.

A abertura dos portos no Brasil aos estrangeiros, fato ocorrido após a chegada da família real em terras brasileiras, marcou também a vinda de uma leva de naturalistas ao país. Curiosos em desvendar os mistérios da exuberante fauna brasileira, mas também da flora majestosa que tanto atraía os estrangeiros, esses cientistas devassaram o país. Antes impedidos pelos dominadores portugueses de adentrarem ao novo mundo devido ao fechamento do território nacional aos estrangeiros, a abertura dos portos foi uma grande notícia que encheu de júbilo o mundo científico mundial. A esposa austríaca do Príncipe Dom Pedro, Arquiduquesa Leopoldina, trouxe para o país um séquito composto por muitos naturalistas, abrindo as portas do país à visitação de muitos e renomados cientistas.
Alguns deles passaram pelo Piauí, entre estes Carl Friedriche Philipp von Martius e Johan B. von Spix, que empreenderam viagem de reconhecimento da fauna e da flora brasileira em árdua jornada desde Salvador, na Bahia, passando por Oeiras, neste estado, pelo caminho conhecido como Estrada Real do Gado. Por esta via de acesso, equivalente a um simples caminho, circulavam as boiadas que saiam do Piauí com destino à feira de Capoame, nas proximidades da capital baiana. Transcorria o ano de 1818 e, na companhia de expressiva comitiva, carregando no lombo de burros pesada bagagem, partiram aqueles cientistas desde Salvador no dia 26 de fevereiro, acomodados em uma rude embarcação que os levaria até a vila de Cachoeira, inicio do penoso percurso. E já no dia seguinte, segundo seus próprios relatos, tomaram a estrada “de Capoeirussu, que segue a oeste e nordeste, na Comarca de Jacobina, e para a Estrada Real do Gado, por onde são tocadas as boiadas do Piauí(Spix e Martius, pág. 219).

Nos dias seguintes, a trupe passaria por apertos indescritíveis que os levaria ao desespero - e à morte de um dos seus membros. Não apenas isto, mas também à perda de alguns animais de carga, em decorrência da falta de comida e água. Transitando por caminhos ermos e secos, viram com imenso desgosto a tropa de burros ir sendo dizimada, e todos os membros da comitiva padecerem de doenças e grande aflição. Devem ter se recordado que na Feira da Conceição, ainda ao findar o primeiro dia de viagem, foram aconselhados a desistir da viagem pelos moradores locais, uma vez que teriam de marchar durante sete dias até chegar a um local onde encontrariam água e comida para si e para a tropa. Mas, resolutos e desconhecedores da realidade que encontrariam a frente, decidiram prosseguir viagem até a localidade conhecida como Fazenda Rio do Peixe. Naquele ponto esperavam encontrar as condições necessárias para prosseguirem viagem até o Piauí.
Com o pensamento firmado apenas na esperança de cumprir com a missão a que estavam imbuídos, haviam se abastecido apenas de um pouco de milho e rapadura para alimentar a tropa de animais, munindo-se, também, de um depósito de água para combater a sede no difícil trajeto que teriam pela frente. A rapadura, segundo eles, serviria para “mitigar a sede” dos animais, experiência repassada para eles pelo guia da caravana. Encontrariam, porém, como haviam sido alertados, uma situação desoladora: a vegetação apresentava-se esturricada e os riachos e cacimbas completamente vazios, para infelicidade de todos. Nesse instante, o desespero já ia tomando conta dos membros da comitiva, e até mesmo os animais resistiam em prosseguir a marcha, à medida que adentravam mais fundo no sertão seco e sem esperança.
A situação era tão grave, que culminou com a invasão da casa de um velho sitiante, encontrado à beira do caminho, para roubarem o único pote com água que o ancião guardava escondido debaixo da cama. Este fato foi talvez o episódio que mais desagradou os cientistas estrangeiros durante o longo percurso que fizerem pelo país. Não havia como retroceder, contudo. E, pouco tempo depois, ganhariam novo alento ao serem informados de que o sofrimento deles terminaria quando chegasse a uma localidade denominada Coité. Nesse lugarejo, informaram-lhes, encontrariam uma cachoeira que brotava de uma rocha, onde poderiam se abastecer de água para o restante do percurso.
Cinco dias depois de terem iniciado a difícil viagem, chegaram à localidade de Coité, lugarejo onde ficava a tal cachoeira. E qual não foi à decepção do sofrido e angustiado grupo: a tal cachoeira informada não passava de um filete de água gotejando da fenda de uma grande rocha.
A água que caia preguiçosamente da pedra era insuficiente até mesmo para abastecer a população local que se aglomerava em torno dela, ávida pela presença do líquido precioso.
A situação que encontraram era muito aflitiva, dada à quantidade de pessoas que se encontravam agrupadas ali para apanharem água, gerando brigas e dissensões. E por conta disso, o juiz do lugar estava no comando de um grupo de homens armados para garantir a ordem e a paz do local, tão grande era a disputa por um simples copo de água. Mesmo assim, sem outro remédio, acercaram-se da rocha para concorrer com os nativos. Mas, quando chegaram perto da grande pedra, com a intenção manifesta de aumentar a concorrência com as trinta pessoas que esperavam desesperadas a sua vez, foram escorraçados para bem distante, tal era o desespero dos que já estavam por lá. Sem outra opção, seguiram em frente com os depósitos de água completamente vazios, tal como haviam chegado lá. Somente dois dias depois desse lamentável incidente, encontrariam água em decorrência de uma rápida chuva que havia caído na região. Haviam chegado à duras penas ao lugarejo conhecido como Imbuzeiro. A água era de péssima qualidade, mas, era água assim mesmo, mesmo suja. Nesse meio tempo, alguns animais já haviam morrido pelo caminho e outros estavam em situação tão precária que foram abandonados à sua própria sorte, uma vez que resistiram a dar um passo a mais. A febre e a diarreia tomavam conta do grupo, deixando as pessoas cada vez mais fracas e desesperadas. Não tinham outra opção, contudo, a não ser seguirem em frente.
Finalmente, no dia seguinte, chegaram a Rio do Peixe. Haviam conseguido atravessar a pior parte da viagem. Ali a vegetação era um pouco diferente, apresentava-se mais esverdeada, devido a algumas chuvas caídas. Já era até possível encontrar algumas ervas rasteiras, proporcionando algum alimento para os animais. Do mesmo modo, havia disponibilidade de água em cisternas encontradas pelo caminho. Logo depois estavam chegando às margens do rio Itapecuru, onde concluíram que, de fato, seus problemas se achavam agora bastante reduzidos, não havendo mais riscos de vida para homens e para animais.
Ao transporem a Serra da Itiúba, no dia seguinte, encontraram um grupo de vaqueiros que tocavam uma boiada com cerca de 300 animais, desde o Piauí, com destino à feira de Capoame. Foi a primeira que encontraram no caminho, e talvez a última, uma vez que, ao penetrarem no Piauí, deixaram a estrada real e tomaram outro caminho para Oeiras. Interessavam-se pela fauna e pela flora, além dos recursos minerais possíveis de serem encontrados no novo território que acabavam de conhecer.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

UM TRIBUTO A MEU PAI

Fotografia da autora com o pai



Régia Vitória Feitosa
Funcionária da Justiça Federal em Teresina, ex-professora da UFPI e presidutrense.

          Em 14 de dezembro de 1914 – há exatos cem anos – nascia em Colinas (antiga Picos do Maranhão), aquele que um dia viria a ser meu pai. Filho de um cearense que migrara para o Maranhão por ocasião de uma forte seca em sua terra, veio a casar-se com Elvira Alzira, de cujo casal nasceram cinco filhos. Virgílio dos Reis Feitosa era o terceiro dessa prole.
          Ali viveu até a idade adulta, quando conheceu Carmosina, na vizinha cidade de São Domingos, vindo a casarem-se e fixarem residência em Colinas, onde nasceu o primogênito Ely.
          O casal, que era evangélico, sentindo o chamado ao ministério, mudou-se para a cidade de Barra do Corda. Lá ingressaram no Instituto Bíblico do Maranhão, onde se prepararam para tal mister.

          Após concluído o curso, e já com mais dois filhos – João Paulo e Boanerges – Virgílio e Carmosina mudaram-se para a cidade de Presidente Dutra, dando início a sua carreira ministerial, ele como pastor da primeira igreja evangélica daquela cidade – a Igreja Cristã Evangélica. Em fevereiro de 1963, faleceu Carmosina, deixando esta filha, ainda pequena. Em novembro de 1964, Virgílio contraiu novas núpcias com Lindalva Pacheco, de cuja união nasceu minha irmã Quênia.

          Meu pai foi pastor daquela igreja por mais de vinte anos, vindo a ajudar igrejas vizinhas como Tuntum e São Domingos. Foi como Secretário Executivo da AICEB – Aliança das Igrejas Cristãs Evangélicas do Brasil - que findou seu ministério. Trazia no seu carimbo: Virgílio dos Reis Feitosa, Pastor evangélico até a sua promoção à glória.
Meu pai tinha muitas habilidades – de dentista prático e protético, alfaiate fino, cosendo seus próprios ternos, tinha no sangue um “quê” político, vindo a integrar o primeiro grupo de vereadores presidente-dutrenses.
          Mas o que movia mesmo seu coração era o ministério pastoral. Uma coisa que até hoje me impressiona é como ele embargava a voz quando falava do sacrifício vicário de Cristo. Nos últimos anos, não mais como pastor titular daquela igreja, não deixava, todavia, de preocupar-se com aquele trabalho. À véspera da última viagem que fizera, da qual voltaria sem vida, meu pai pregou naquela igreja. Segundo o depoimento de um membro, seu sermão foi baseado em II Timóteo 4.7: “Combati o bom combate, completei a carreira, guardei a fé.” E continuou: “ Vocês, que ficam, precisam despertar para esta obra, continuar este trabalho”. Parecia saber o que o aguardava. Ao chegar à casa, sua esposa, que não fora ao culto, falou-lhe que ele havia demorado - talvez tivesse pregado demais -, ao que ele respondeu: “Eu precisava dar aquele sermão”.

          Três semanas antes de completar seus 60 anos, meu pai faleceu, vítima de um fatal acidente em Miranda-MA, quando de viagem de São Luiz a Teresina. Socorrido por um desconhecido (que mais tarde o identificamos como sendo delegado de Itapecuru-MA), foi levado ainda a São Luís, vindo a falecer três horas depois. A família só recebeu seu corpo graças ao reconhecimento feito pela secretária do Deputado Manoel Gomes – seu amigo – o qual lhe enviara, no dia anterior, um bilhete, que se encontrava no bolso da calça que usava, quando veio a falecer. Isto porque toda a sua bagagem ficara no ônibus em que viajava, inclusive a pasta de documentos. Seu corpo foi levado para a cidade de Presidente Dutra, onde foi sepultado.

          O tempo passa, hoje poucas são as pessoas daquela cidade, ou mesmo da igreja, que guardam a lembrança do ministro do evangelho pioneiro naquele local. Vale, contudo, relembrar aos outros aquele que jamais esquecerei. Até porque dele herdei muita coisa, com ele aprendi muito, apesar de ter convivido tão pouco. Naquele dia 14 de dezembro nasceu alguém que um dia ouviu o chamado: “A quem enviarei, e quem há de ir por nós?” e prontamente respondeu: “Eis-me aqui, envia-me a mim”.



Pr. Virgílio é o segundo da direita para a esquerda(foto extraída do livro Nossas Raízes)