segunda-feira, 24 de fevereiro de 2025

Rachel Giusti Fleming, adeus

 

Imagem do Google


Luiz Thadeu Nunes e Silva(*)

Já́ tinha pensado em dois temas para escrever a crônica deste final de semana. Escolheria entre o primeiro mês de governo de “Donald Trump e a diplomacia do coice”, que está́ colocando de pernas para o ar um mundo já caótico, sem respeito ou empatia por ninguém. Com apenas trinta dias de governo, completados em 20/02, Trump à frente do país mais rico e poderoso do mundo, parece que está há décadas no poder. Ninguém nem lembra mais quem foi Joe Biden, o fraco presidente americano, por quatro anos. Ou escreveria sobre a insana guerra entre Rússia e Ucrânia, que segundo dados não oficiais, ceifou 80 mil vidas, e 400 mil feridos, torrando bilhões de dólares. A guerra entre Rússia e Ucrânia completa três anos, na próxima segunda-feira, 24 de fevereiro.

Mas resolvi mudar e escrever sobre uma pessoa muito especial. Na terça-feira, 17/02, acordei e vi nas redes sociais o comunicado de que Rachel Guisti Fleming havia feito a passagem no dia anterior. A morte sempre deixa um vazio, especialmente quando não estamos esperando. Não conheci Rachel pessoalmente, mas ficamos próximos pelas redes sociais. Ela era irmã de Lílian Giusti, colega dos bancos escolares do Colégio Batista, que voou ao encontro da morte, de forma trágica, quando éramos adolescentes.

Ao saber que Rachel era irmã de Lilian, enviei-lhe uma solicitação de amizade, que logo me adicionou. Quando começamos a conversar, Rachel morava em Brasília. Acompanhei seus derradeiros dias na Capital Federal, a mudança para Petrópolis, RJ. Nos falávamos todos os dias. Comentávamos nossos cotidianos, falávamos sobre São Luís do Maranhão, que ela não visitava há tempo. Culta e inteligente, me mandava vídeos de músicas, que gostava. Muito Jazz e Bossa Nova. Sempre uma nova versão de um clássico. Coisa de gente fina. Leitora voraz, me indicava livros. Cinéfila, me dava dicas de bons filmes, especialmente europeus ou iranianos.

Comospolita, viajada, falávamos de lugares que já tínhamos pisado, destacando algo pitoresco. Fluente em línguas estrangeiras, era uma enciclopédia.

Mãe, avó e bisavó coruja, falava dos filhos, netos e dos bisnetos, com alegria e orgulho da prole. Recentemente havia enviado um vídeo com os bisnetos em pura farra. Não houve tempo de lhe enviar fotos de Heitor, meu neto, recém nascido.

Quando lhe enviava minhas crônicas, gentil e generosamente fazia comentários que me deixavam feliz e grato.

Recentemente, enviou-me uma mensagem, em que estava muito preocupada, pois recebera um aviso, via celular, para ficar alerta por causas das fortes chuvas na região serrana do Rio. Era final de tarde, e toda a população local recebera a mesma mensagem. “Luiz, é muito preocupante tudo isso, não temos para onde ir”, dizia a mensagem. Mais tarde, mais tranquila, disse que tudo se acalmara.

Quando lhe falei que estava passando por um problema, logo me perguntou: “Como posso ajudá-lo?”, oferecendo-me coisa rara em tempos líquidos, -atenção.

Dezembro fui ao Rio, viagem rápida, pensei em ligar-lhe, e se possível, subir a serra para conhecê-la, tomarmos um café, desfrutar de sua companhia. Não o fiz.

A morte tem essa maldade. É uma ruptura, nos priva do convívio, deixa além de saudades, muitas indagações. Quantas perguntas sem resposta, quantas coisas que não saberei de minha amiga Rachel, que um dia de chamei de Clarice Lispector, e que ela sorrindo me disse “não mereço tamanha importância”.

A vida, em sua essência, é desmedida e gratuita. O tempo nos é concedido sem contrato, e a morte nos espera sem taxa de devolução. A partida inesperada de Rachel, que escolheu a elegância como marca de sua trajetória, deixou em mim, uma saudade de quem nunca vi pessoalmente, mas fez parte de alguns dos meus melhores dias, provando que a vida passa que nem o vento, mas só fica o que é sentimento. “A parte que parte não consegue por inteiro partir, mas a parte que parte um pouco fica, a que fica um pouco parte. Embora essas partidas nos partam, elas são partes da vida, e a vida não deixa de ser arte”, poema celta. Rachel era puro lirismo.

(*)

Luiz Thadeu Nunes e Silva é Engenheiro Agrônomo, escritor e globetrotter. Autor do livro “Das muletas fiz asas”.

Instagram: @Luiz.Thadeu


sábado, 8 de fevereiro de 2025

“A vida presta”


 

Luiz Thadeu Nunes e Silva(*)

 

Tenho dias vividos. Nasci em dezembro de 1958, na metade do século passado. Não sou velho; velho é o mundo. Quando nasci o mundo já existia, vou embora e mundo fica. Aprendi com a passagem do tempo que o mundo nunca acaba, quem acaba somos nós. O mundo se renova a cada dia. Me adaptei à passagem do tempo, e como diz Mário Lago, “Fiz um acordo com o tempo. Nem ele me persegue, nem eu fujo dele. Qualquer dia a gente se encontra e, desta forma, vou vivendo Intensamente cada momento”.

Aos 66 anos, recém completados, estou seminovo; tenho tesão pela vida.   O novo me fascina. Tenho fome e sede de conhecimentos.

Hoje tenho mais sonhos do que quando tinha 30. O bom é que há muito a aprender. Curso faculdade de jornalismo, terminei um MBA, começo um novo na próxima semana. Estou escrevendo um novo livro. Aprendendo culinária, mais próximo às caçarolas. Conhecimento nunca é demais, ao contrário, “Só sei que nada sei, e o fato de saber isso, me coloca em vantagem sobre aqueles que acham que sabem alguma coisa”, parafraseio Sócrates. Portanto, estou em boa companhia.

O bom de ter vivido um pouco mais é saber que já vi muita coisa. Vi boi voar algumas vezes. Presenciei coisas inimagináveis. Mas, como diz um amigo filósofo e bom observador da janela da vida: “Tudo que existe no mundo, tinha que haver no mundo”. Ouvi, em uma conversa memorável, do ex-presidente José Sarney. Ao 94 anos, quando alguém lhe conta algo inusitado, ele repente: “No Maranhão, há precedente”. Portanto, nada é novo. Nada é original, isso já aconteceu antes. Ainda mais no Maranhão, terra rica em lendas, causos e mistérios. “Terra em que até o tempo mente”, nas palavras do padre Antônio Vieira, que por essas bandas viveu, e presenciou muitas coisas diferentes.

Costumo dizer que se Gabriel Garcia Márquez, escritor colombiano, prêmio Nobel de Literatura de 1982, um dos expoentes do realismos fantástico, tivesse passado um tempo no Maranhão, sua obra seria mais, fabulosa, fecunda e rica.

Sou de uma época em tudo tinha conserto. Quebrava, logo se conservava. Estamos na época dos descartáveis. Sejam eletrodomésticos, roupas, calçados e/ou relacionamentos.

Como acredito no ser humano, otimista por formação e opção, acho que relacionamentos podem ser restabelecidos, restaurados. Depende das partes envolvidas.

Caro leitor, amiga leitora, você pode pensar que sou bobo, ou iludido. Talvez seja mesmo, mas também sou um entusiasta da vida. Ainda garoto eduquei o olhar para o belo. Em qualquer situação enxergo o lado bom da vida. Continuo acreditando que tudo tem conserto, basta mudar o olhar.

Muita coisa poderia mudar, renovar, revigorar, olhando em outra direção.

Tenho visto ao meu redor tanta gente pessimista. Me entristece. Acho que grande parte entrou em uma vibe ruim, em só olhar o lado negativo da vida. Esses precisam mudar o olhar, ter gratidão por cada dia vivido. Descobrir as boas coisas da vida. Saborear cada momento vivido. Para um ano que começou há pouco, informo que viver é mágico. Viver é bárbaro. Viver é dádiva.

O título da crônica roubei da multifacetada Fernanda Torres. Bem-aventurados os que descobriram que a vida presta.

()*

Luiz Thadeu Nunes e Silva é Engenheiro Agrônomo, escritor, globetrotter. Autor do livro “Das muletas fiz asas”.

sábado, 1 de fevereiro de 2025

É no silêncio que a vida fala

Imagem de Edições Paulinas

 

Luiz Thadeu Nunes e Silva (*) 

Procuro me desligar quando a barulheira da vida me perturba, quando a carência me confunde, quando meu ar fica pesado.

Sempre me calo quando já disse tudo e não surtiu efeito, quando não fui compreendido. Incomodado, me mudo. Mudo de lugar, mudo de pessoas. Sempre sei onde fica a porta de saída.

Me afasto quando não enxergam que meu coração sangra, que meus olhos choram apesar de colocar sorrisos no rosto.

Me desligo quando estou entediado com a mesmice. Quando o mundo tenta me atropelar.

Sou do vento, das tempestades, do calor das intensidades...careço de voar! Vim ao mundo para ir cada vez mais longe. Por necessidade aprendi a voar. Aprendi fazer das muletas, asas; elas já me levaram para os todos os continentes do mundo.

Desapareço de mim mesmo quando não me reconheço.

Me silencio, me aquieto, e aos poucos volto a me encontrar.

Encontro respostas no tudo que ainda não sei, no nada que achei que sabia.

Talvez minhas incógnitas, reflexões, serão vozes determinantes, já que meu cérebro entende que precisa de mais.

Sei que viver pede mais, que o saber pede mais, que carinho nunca é demais.

A alma cansa de esperar brotar flores num jardim regado sem entusiasmo.

Espero impaciente por uma chuva de amor que regue com atenção o solo dos meus sentimentos. Assim, caminho.

Demorei para aprender:

Quando não abre, não é a tua porta. Quando não gira, não é a tua chave. Quando não passa, não é o teu comboio.

Quando não (te) ilumina, não é a tua luz.

Quando não torce (por ti), não é teu amigo.

Quando não cura, não é (ainda) o teu tempo.

Quando não serena, não é a tua paz.

Quando não tem certezas, não é a tua pessoa. E, quando não fica... não é o teu amor. Melhor deixar partir.

Aprendi que reconstruir é mais doloroso que preservar. Pois, ao reconstruir, vem à memória tudo como era antes, lembrando do que aconteceu naquele tempo, naquele lugar. Reconstruir surge muitas vezes de algo que estava em ruínas ou que havia chegado ao fim. Aí, vem o engano, que desta vez será diferente, na vil esperança de que desta vez tudo será diferente do que foi anteriormente. Aprender a reconstruir é viver novamente no mesmo ambiente, sendo a mesma pessoa, mas tentando fazer tudo de forma diferente.

“O infinito, esse velho enigma que tanto escapa à razão, não mora nas estrelas distantes nem nas eternidades prometidas. Ele se esconde, sutil, na epifania do instante que passa. É uma sombra translúcida que dança no tempo, um segredo que só se revela quando já não há mais olhos para vê-lo. Não está no vasto, mas no ínfimo; não na extensão, mas na profundidade do agora”, li recentemente, não gravei o autor.

Apenas um conselho, seja paciente com você. Se permita um descanso, um sorriso, um mimo qualquer.

Esqueça as coisas que te angustiam; abre a janela, namore o dia, gaste tempo com as pequenezas que lhe trazem paz. Seja paciente com você.

Não se cobre tanto, não queira acertar sempre, porque o caminho é longo, e os aprendizados, constantes.

Feche os olhos, ouça os sons da tarde caindo, começando outra vez.

É no silêncio que a vida fala. Esteja atento para escutar. Pare para ouvir os sons da natureza.

Desacelere o passo pra ver borboletas, passarinho no ninho, botão querendo ser flor. Reserve um tempo para contemplar um entardecer, para ouvir música, para ler um livro, para tomar um café, um vinho, um aguardente. Ou mesmo um bom banho. Limpo, tenha tempo para um encontro amoroso, dê e receba carinhos e carícias. Erotize sua vida. Sexo é o chocolate da vida.

Permita-se SENTIR.

(*) Luiz Thadeu Nunes e Silva  é Engenheiro Agrônomo, escritor e globetrotter, autor do livro “Das muletas fiz asas”.