sábado, 28 de junho de 2025

De Curador a Presidente Dutra – uma caminhada longa e difícil.



Curador anos 40

 

José Pedro Araújo (*)

Lá se vão 81 anos desde que o interventor Paulo Martins de Sousa Ramos assinou o Decreto-Lei 820, em 30 de dezembro de 1943, ato que elevava o Curador à categoria de município. Verdadeiramente, o citado ato governamental se tratava de um instrumento oficial emitido a cada quatro anos pelo governo para definir a nova Divisão Administrativa do estado maranhense. Era um ato corriqueiro, então. Nessa resolução administrativa, que tinha validade de 1º de janeiro de 1944 a 31 de dezembro de 1948, muitos municípios foram criados, enquanto alguns outros perderam o status antigo e voltaram a integrar o território de outro município mais importante. Vivíamos o tempo da ditadura Vargas, período em que as casas legislativas se achavam de portas cerradas; daí que a Lei de costume, discutida e votada pelos senhores deputados, havia sido substituída por um decreto-lei que continha apenas a vontade única do chefe do executivo. Mas a luta por reconhecimento do povoado Curador vinha de longe, desde quando os primeiros moradores chegaram por ali na segunda metade do século XIX, e fixaram-se em casebres de pau-a-pique e palha de babaçu.   

Esse edito, a que nos referimos no início do parágrafo anterior, foi o passo inicial que conferiu à comunidade, situada no interior mais profundo da região conhecida como Japão maranhense, poderes e independência, desligando-o do seu município-mãe, Barra do Corda. Afirmo que foi o passo inicial porque a solenidade oficial de elevação da Vila à categoria de município somente se daria no dia 28 de junho do ano seguinte, seis meses após a publicação daquele diploma legal. Passou aquele dia a ser considerado como data oficial que ensejou o início da nossa caminhada de maneira independente, desligado que fomos do imenso território barra-cordense; aquele que consideramos o dia primeiro da nossa caminhada solo.

O interventor Paulo Ramos não se fez presente ao ato oficial, talvez porque preferisse participar das festividades de elevação de algum outro novo município mais próximo da capital, posto que muitos outros foram criados naquela mesma data; talvez porque chegar até a sede do velho Curador não era uma tarefa muito fácil. Melhor dizendo, era tarefa das mais difíceis, visto não possuirmos estradas em condições minimamente trafegáveis. Até mesmo para se deslocar de Barra do Corda até a sede da povoação do Curador, naquela época, praticamente só se fazia montado em alimárias, e assim mesmo utilizando-se de um volteio insano que aumentava a distância entre esses dois pontos em quase oitenta quilômetros, comparativamente ao percurso que temos hoje. Estrada sinuosa, como já afirmei, tinha esta via a obrigação de passar por quase todas as povoações mais importantes do município, o que quase dobrava a distância entre os dois pontos que se queria atingir. O relatório emitido pelo governo, em decorrência da viagem de inauguração de várias estradas de rodagem pelos sertões, viagem empreendida pelo governador Magalhães de Almeida, no ano de 1928, registrava que o trecho inaugurado pela citada autoridade entre a vila de Curador e Barra do Corda media longos 176 quilômetros. Mas isso não foi impedimento para o interventor barra-cordense, Jamil de Miranda Gedeon, fazer-se presente à solenidade. Provavelmente havia se deslocado até a Vila de Curador montando em algum animal de sela. Já a autoridade máxima do estado, preferiu enviar o senhor Secretário Municipal da cidade de Vargem Grande para substituí-lo no ato que reuniu toda a população da vila.

Hoje em dia, trafegando pela BR 226, a distância entre a sede do município de Presidente Dutra e a de Barra do Corda não ultrapassa os 98 quilômetros de extensão. Magalhães de Almeida, naquela vigem de inauguração de caminhos que chamava de estradas, foi o primeiro governador do estado maranhense a pisar em terras curadoense. Isso aconteceu no distante ano de 1928, já citado. E para registrar a sua passagem pelo povoado, existem fotografias, talvez as primeiras imagens registradas da região e eternizadas na celulose. Bem-merecida a homenagem àquela autoridade prestada pelos presidutrenses, que deu à sua principal artéria, o nome daquele ilustre conterrâneo.

A fotografia que ilustre o presente texto, e que nos mostra a cidade nos seus primeiros anos após a sua elevação à categoria de cidade, nos dá uma ideia aproximada do que era ela no tempo do seu desligamento de Barra do Corda. A visão que temos é a de uma Rua Grande desnuda, sem calçamento, sem posteamento para rede elétrica, favorece a nossa imaginação e nos leva a pensar que por baixo daquele piso de terra não devia correr água encanada. Sem a mínima infraestrutura de serviço em prol de sua população, mostrava a nossa primeira rua a ser formada pelos nossos pioneiros, as enormes carências pelas quais passava a população naqueles tempos. Nessa época ainda, a educação se resumia a essa escola particular que vemos em destaque na foto, dedicada às estudantes de sexo feminino; e ao colégio São Bento, instituição criada para receber os rapazes da cidade. As duas, implantadas pelos capuchinhos que haviam se instalado pouco tempo antes na região. No mais, a educação se resumia aos mestres-escola que ainda atendiam a criançada da povoação.

Quando criança, andar pelas ruas sem calçamento ou correr por elas durante as chuvas pesadas que desabavam sobre a cidade, trazia-me uma sensação de completa liberdade e enlevo; para mim, nada faltava por ali, pois as brincadeiras de cada período me bastavam. Banhos de riacho no período invernoso, papagaios de papel colorindo o céu azul no período de estio, piões, bolas de gude, chuço, e os jogos de futebol em qualquer período, fizesse sol ou chovesse, completavam as minhas necessidades maiores.  Por outro lado, à noite, as brincadeiras de esconde-esconde ou as estórias de trancoso contadas com excesso de amedrontamento, supriam com folga a falta de energia elétrica.

Mas aí crescemos, e as exigências passaram a se apresentar muito maiores. Já não nos satisfazíamos somente com as brincadeiras.

O aniversário de Presidente Dutra vai além das celebrações; é um momento para refletir sobre os avanços que o município alcançou ao longo dos anos. Investimentos em infraestrutura, educação e saúde têm contribuído para o crescimento da cidade e o bem-estar de seus moradores. Mas ainda nos falta muito. Precisamos avançar em vários campos que ainda estão carecendo de melhorias, como a segurança, a falta de oportunidades para os jovens que chegam à idade em que comumente começa-se a laborar, por exemplo. Além disto, o abastecimento de água e a coleta e o tratamento de esgoto são ainda pontos que deixam muito a desejar em um município que cresce a olhos vistos e que clama pela melhoria desses serviços para se equiparar àqueles que possuem o seu tamanho em alguns estados brasileiros mais desenvolvidos.

Contudo, quem como eu viu as ruas da cidade às escuras, com a poeira levantada pelo vento invadindo as residências; quem, como eu, padeceu da carência de um atendimento médico banal, fato que nos fazia correr para a cidade de D. Pedro em busca do Dr. Armando Leandro, médico amigo e muito conceituado, à falta de profissionais do seu quilate na nossa cidade; há de convir que avançamos muito em vários campos, especialmente neste em particular. Hoje o município já dispões de três hospitais públicos que prestam a maioria dos serviços necessários à população. Ademais, clínicas médicas e odontológicas se espalham por vários pontos da cidade, e a maioria dos seus profissionais são nascidos nela. A cidade se tornou um polo regional importante na região central do Maranhão e é quase autossuficiente no campo da saúde.

Parabéns, Presidente Dutra! Estamos felizes com o que temos, mas queremos mais!

(*)

José Pedro Araújo é engenheiro agrônomo, funcionário público federal aposentado, historiador, cronista, romancista, e coordenador do blog Folhas Avulsas. 

Aviso: Junho é o mês de aniversário da cidade de Presidente Dutra. E por conta disso, por todo este mês estamos realizando uma promoção dos últimos exemplares do livro " Viajando do Curador a Presidente Dutra - história, personalidades e fatos". Se você residir em alguma das cidades onde o livro foi posto à venda, cada exemplar importará em apenas R$ 60,00 reais. Caso seja necessário o envio do livro para qualquer outra cidade do país, acrescentar mais R$ 15,00, que é o valor do frete. Portanto, durante os trinta dias de junho, o livro sairá por apenas R$ 60,00 reais. E poderá ser encontrado em Presidente Dutra, na Complast, em Teresina, nas livrarias Universitária e Entrelivros, e em São Luís, na livraria Amei, no Shopping São Luís. Como já informado, trata-se dos últimos exemplares que ainda dispomos em estoque. E aquelas pessoas que se interessarem pela história da região conhecida como Japão maranhense, tem a última oportunidade de adquirir o livro que traz também, resumidamente, a história do estado do Maranhão.

 

   

sábado, 21 de junho de 2025

Mais uma guerra em um mundo caótico

Teerã - Foto do autor

Luiz Thadeu Nunes e Silva (*)

Em andanças pelo mundo, desembarquei no aeroporto internacional Tehran-Iman, em Teerã, em uma madrugada de abril de 2017. O aeroporto fica a 50 km do centro da cidade, onde ficava o hotel. Para minha surpresa, encontrei uma cidade pulsante, fascinante e surpreendente. Durante cinco dias visitei os pontos históricos e turísticos da capital do antigo império persa. Com 10 milhões de habitantes, Teerã tem a mesma população de toda Israel. Com um povo acolhedor, é governada pelos sanguinários Aiatolás, tendo Israel como seu maior inimigo.

Noite de quinta-feira, 12 de junho. Dia dos Namorados. Após jantar, cheguei em casa e os canais de TV mostravam, ao vivo, o bombardeio de mísseis israelenses sobre Teerã, capital do Irã, em mais um episódio de ira entre os dois países do Oriente Médio. A memória me fez voltar no tempo.

Em um histórico belicoso, Israel e Irã protagonizaram por quatro décadas um conflito latente, com momentos de maior tensão abafados pelos Estados Unidos a fim de evitar uma guerra com consequências imprevistas no Oriente Médio. Mas, com o vigoroso ataque de Tel Aviv em solo persa, as camadas de contenção se esfacelaram.

A decisão do primeiro-ministro Binyamin Netanyahu de deflagrar "ataques preventivos" contra o Irã configura, pela legislação internacional, crime de agressão. Ao Conselho de Segurança da ONU, Teerã os classificou como "declaração de guerra" —exatamente o que o restante do mundo e até mesmo ambos os inimigos cáusticos tratavam de evitar. Se estamos perto de uma guerra de proporções desconhecidas, ainda é cedo para afirmar, mas o mundo está cada vez mais inseguro. Israel com seu poderio militar e precisão logística, durante dias seguidos de ofensiva destruíram alvos precisos e reduziram a capacidade de contra-ataque persa. A instalação nuclear de Natanz foi bombardeada, bases de lançamento de mísseis terra-terra foram atingidas e parte considerável do comando militar iraniana foi morta. A resposta do Irã com drones —a maioria deles abatida antes de atingir os alvos— e cerca de cem mísseis provavelmente não encerra a retaliação.

O Irã inevitavelmente sofreria consequências pelo brutal ataque do Hamas a Israel em outubro de 2023, agravado por sua retórica de destruição do Estado judeu e seu insistente avanço no programa nuclear com fins militares, sem contar os cerca de 200 mísseis lançados contra o inimigo em outubro do ano passado.

Antes, porém, Tel Aviv concentrou-se na destruição do Hamas, na Faixa de Gaza, do Hezbollah, no Líbano, e dos houthis, no Iêmen —grupos terroristas financiados pela teocracia persa.

Quem vê Israel e Irã trocando ataques em uma guerra com alto potencial destrutivo não imagina que os dois países já foram aliados próximos. E não faz tanto tempo assim. O Irã apoiou a criação de Israel, em 1948, e foi um dos primeiros países a reconhecer sua existência, na direção contrária de seus vizinhos árabes. Além disso, nos anos 1960, Irã e Israel viraram parceiros comerciais, exportando petróleo pelo oleoduto de Eilat Ashkelon, com gestão e lucros divididos entre ambos.

Israel e Irã foram aliados até 1979. A queda do xá da Pérsia, após anos de insatisfação popular, intensificados por protestos e greves, levando Reza Pahlavi a fugir do país e deixando o caminho aberto para a liderança de Khomeini.

O Irã se tornou uma república islâmica teocrática, revogando regras internas consideradas ocidentais demais e dando um cavalo de pau na política externa. Estados Unidos e Israel viraram os inimigos. Abraçando a causa palestina como forma de ganhar proeminência entre os países do Oriente Médio, o regime dos aiatolás, em um ato que simbolizava a mudança de postura, tomou a embaixada do estado judeu em Teerã e entregou para a Organização para a Libertação da Palestina (OLP).

A partir de então, o Irã deixou de reconhecer a legalidade de Israel e passou a pregar seu extermínio, financiando grupos acusados de terrorismo como o Hezbollah, no Líbano, e o Hamas, na Palestina.

É São João na Ilha do Amor, tempo de alegria, de arraial, de celebrar os festejos juninos. Tempo de brincadeiras, manifestações folclóricas, muita comida boa. Bomba e fogos por aqui, só de artifícios. Quão bom é estar longe das guerras.

(*)




Luiz Thadeu Nunes e Silva  é Engenheiro Agrônomo, escritor e Globetrotter. Autor do livro “Das muletas fiz asas”.

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E-mail: luiz.thadeu@uol.com.br