Estacionamento de bicicletas em Amsterdã |
José Pedro Araújo
Certa noite, encontrei pedalando
pelas ruas de Teresina um grande número de pessoas. Talvez ultrapassasse a meia
centena. Em tremenda algazarra, seguiram em frente em passeio que não sei
quando acabaria, nem onde. A visão daquela confraria alegre, roupas coloridas
de malha, magrelas de todos os tipos e gosto, me fez lembrar uma frase que ouvi
certa vez: “é como andar de bicicleta. Quem aprende, não esquece jamais”. E me
deu uma vontade louca de me integrar a um desses grupos de ciclistas que
aproveitam a noite fresca e calma da cidade para passear pelas suas ruas.
E como gosto sempre de pesquisar
os assuntos que transformo em crônica, tomei conhecimento de como surgiu a
bicicleta, e em que ano. Fiquei surpreso em saber que o primeiro protótipo inventado
tem quase a idade do descobrimento do Brasil: é de 1690. Um francês de nome
Siorai construiu a primeira invenção totalmente de madeira, e pôs-lhe o nome de
Celerifero(do latim Celer(rápido) + fero(transporte). Sem pedal, o troço não
era muito confortável, pois o usuário teria que pôr a invenção em movimento
impulsionando-a através dos pés em contato com o chão. A bicicleta com pedal, selim e pneus, como temos hoje, só surgiu em 1880,
também na França, depois de uma acentuada evolução que passou pela mão de
muitos inventores. Acredita-se que a primeira bicicleta que se tem registro no Brasil,
foi trazida ao país por Antonio da Silva Prado Júnior, um paulista rico que
apaixonou-se pela invenção e importou a primeira magrela ainda no último quarto
do século 19.
Portanto, desde muito as pessoas vem
aprimorando esse invento importante que se espalhou pelo mundo como uma grande
sacada, facilitando o deslocamento das pessoas e reduzindo o tempo que levavam,
muitas vezes, de casa para o trabalho, e vice-versa. Na Europa, por exemplo, a
bicicleta é tão importante que em muitas cidades ocupa uma posição de destaque
até mesmo em relação aos pedestres. Certa
vez, transitava pelo centro de Amsterdam, na Holanda, quando o nosso guia nos
chamou atenção para o fato de estarmos utilizando a faixa da calçada que era
privativa dos ciclistas. Alertou-nos ainda que, caso provocássemos qualquer
acidente mais sério com alguém que pedalasse uma das milhares de bicicletas que
transitavam pela cidade, teríamos que arcar com as despesas do seu tratamento
médico. Ali a lei protegia o ciclista até mesmo em detrimento dos pedestres. A
quantidade de bicicletas que víamos estacionadas na cidade era uma coisa que
chamava a atenção, tal o seu número alarmante.
Voltando ao nosso caso, fiquei
apenas com uma preocupação: será que ainda consigo pedalar uma magrela dessas
com destreza? Apesar de pedalar sempre uma bicicleta ergométrica que tenho em
casa, nunca mais me dispus a utilizar um artefato desses pelas ruas. E então,
como sempre faço, veio-me à mente o tempo em que comecei a aprender a trafegar
numa dessas belezuras pelas ruas do Curador. Tudo aconteceu quando, ai por
volta dos meus nove ou dez anos, tomei conhecimento que um morador da cidade
havia retornado de uma temporada fora do município, e, à falta de um emprego
fixo, adquirira dez bicicletas Monark para alugar. O criador da empresa
informal, estabelecida na Travessa Pedro Sereno, foi o Carmélio Belisário, de
conhecida família presidutrense. E, até onde sei, a ideia gerou bons frutos,
pois sempre que íamos em busca de uma delas, tínhamos que esperar que alguém
retornasse e e devolvesse uma delas.
Tomei tombos fantásticos até
ganhar a destreza necessária para me manter firme na sela, nada que fosse tão
dolorido quanto uma vez que fiz um papelão na frente de algumas garotas. Em um
passeio de final de tarde, pedalava uma velha bicicleta que havia ganhado do meu
pai, lá pelo largo de São Sebastião, quando alguns colegas resolveram circular
pelo pátio da igreja, ainda no tempo que o circundava as muretas originais que
prestavam uma beleza inigualável ao conjunto arquitetônico que compunha o belo
templo. Por lá circulavam algumas garotas, e queríamos mostrar o nosso veículo.
Aparecer, como se diz hoje. Mas a minha bicicleta era muito pesada, guidão
duro, e ao fazer uma conversão, terminei indo de encontro à mureta e quase me
esborrachei no chão. A minha barbeiragem não passou despercebida para uma das
garotas ali presentes, exatamente aquela que eu mais queria impressionar. Ela acorreu
a mim e perguntou-me se eu estava bem. Envergonhado disse que sim, que eu havia
me distraído e havia batido na mureta. Nada sério, no entanto. E ela, não sei
se a título de gozação, disse-me que parecia que eu ainda estava aprendendo a
pedalar. Suprema vergonha. Sai dali correndo, e nunca mais voltei para tentar
outra vez.
Hoje em dia, existem bicicletas
que só são acessíveis a poucas pessoas, pelo muito que custam. A mais cara
delas, e que empalma o pomposo nome de The
Beverly Hills Edition, com o quadro em ouro, custa módicos U$ 1.000.000,00
(hum milhão de dólares). Mas existe uma bicicleta mais baratinha, fabricada
pela grife francesa Hermès, a mesma das gravatas e bolsas famosas, a Le Flanneur, que custa a bagatela de
9.077 euros(ou cerca de R$ 30.000,00 reais). Meu filho, Ricardo Araújo, um
grande apreciador do produto, possui uma bicicleta para a sua aventura em
trilhas da zona rural de Teresina, que me disse valer algo em torno dos R$
3.500,00 reais. Uma nova custaria algo em torno dos R$ 6.000,00 reais. Baratinha se comparada com essas que enumerei
acima. Aliás, certa vez, em viagem para Piracuruca, no norte do estado, dei
carona para ele e outros dois amigos. Pensavam em fazer trilha nas dependências
do Parque Nacional de Sete Cidades. Transbike acoplado na traseira do carro, chegamos
à cidade ainda cedo. E logo os três jovens retiraram seus transportes, vestiram-se
a caráter, completaram a indumentária com o capacete e as luvas, e partiram
para a aventura. São 22 km de distância até o parque.
No caminho, ao pegarem um retão
muito longo e plano, avistaram outro ciclista que pedalava uma magrela bem
usada, dessas muito comuns. Resolveram aumentar a velocidade e acompanhar o
rapaz para algumas perguntas sobre o trajeto a tomar. Mas ele, ao olhar para
trás e avistar aqueles três sujeitos todo paramentados, forçou o pedal da sua
Monark e disparou pela estrada. Por mais esforço que fizessem, os três
ciclistas e suas modernas e apropriadas bicicletas não viram mais nem o vulto
do colega que eles, pejorativamente, chamam “canela seca”. Ficaram na poeira,
desmoralizados.
De outra vez, ao fazerem uma
trilha nas imediações da capital, passaram por uma comunidade rural, onde um
grupo de homens jogava conversa fora sob a copa de uma árvore. Ao avistarem
aqueles jovens ciclistas passarem todos paramentados, bermuda, luvas, camiseta
e capacete apropriados para a prática, um deles não se conteve e falou: “óia,
aqueles abestados andam tudo enfeitado!”.
Para fechar a crônica, já que uma
história puxa outra, meu filho, seguido de um grupo numeroso de amigos, resolveu
fazer trilha pelo vizinho município de Altos. Iam em busca de uma cachoeira que
fica em outro município vizinho, Alto Longá. E ao chegarem lá, deslumbrados com
a água que caia do alto das pedras, resolveram tomar banho. Não demorou e
apareceu um grupo de homens em um velho Chevete e anunciaram um assalto.
Fizeram uma limpa. Levaram relógios, celulares e carteiras (quase sem dinheiro).
Mas nem pensaram em levar com eles as bicicletas que valiam uma fortuna. Melhor
para os meninos.
O certo disso tudo, é que pedalar
uma magrela dessas é um hábito bastante saudável e que, muito a propósito, vem
fazendo sucesso novamente.
Beleza, Dr. Araújo. Bem lembrado, da nossa magrela. A Maior alegria que tive, mais de quando comprei uma hilux ok, foi quando adquiri uma, em 1973 (monork verde). Muito me ajudarou a arranjar uma paquera na Praça Saraiva. Abr.
ResponderExcluirBoa lembrança! AhAhAh!
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