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O autor e os amigos |
Luiz
Thadeu Nunes e Silva(*)
O
que mais tenho lido nos últimos tempos é sobre as relações
humanas. Assunto que me fascina. Gosto de saber como o ser dito
‘humano’ se relaciona com familiares, vizinhos, colegas de
trabalho, do colégio, enfim, como ele interage em cada grupo social,
com sua tribo.
Sou Engenheiro Agrônomo por formação, em princípio, mais
afeito aos números frios, cálculos e estatísticas. Mas, com o
passar dos anos, minha atenção e curiosidade se voltaram para as
relações interpessoais. Como giramundo, o que mais chama minha
atenção é como as pessoas se relacionam umas com as outras em
diferentes partes do mundo. Em todos os lugares em que chego, sento
em café, no final da tarde, para observar o frenesi das pessoas,
após um dia de trabalho.
Na
semana passada estive em Curitiba, cidade que amo, e sempre que posso
retorno. Fui para entrevistas, divulgação do livro “Das muletas
fiz asa”. Como de costume, hospedei-me com Edilson Castro, um cara
muito especial, bom papo, discreto e acolhedor.
Conheci Edilson, ainda no século passado, em 1996, quando fui
a trabalho pela primeira vez à capital do Paraná. Encontrei-o em um
ônibus a caminho de Cascavel, no interior do estado. Íamos a
trabalho. Em Cascavel nos hospedamos no mesmo lugar. Daí nasceu
nossa amizade, que já dura 26 anos. Tive a oportunidade de
hospedá-lo uma única vez, em 1997.
Nascido
e criado na tórrida Porto Velho, Rondônia, Edílson foi transferido
para Curitiba, pelo Incra, onde fixou morada, se adaptou ao frio, e
optou por viver seus dias de tranquilidade e mansidão, sendo a
melhor companhia para si.
Nas
muitas conversas que tivemos nesses dias em que me acolheu, falou-me
do grupo de amigos que ele tem. São todos solteiros, alguns
divorciados, outros nunca casaram. O que têm em comum? A vontade de
permanecerem em suas individualidades, conectados uns aos outros
pelos laços da amizade. Se falam todos os dias pelo WhatsApp, se
reúnem sempre que podem.
Curitiba é tida como uma cidade fria,
não apenas pelo clima, mas também pelas relações interpessoais.
As pessoas pouco se visitam, não interagem entre si. No condomínio
onde mora, há mais de 20 anos, Edílson fala com poucos vizinhos, e
ainda assim, cumprimentos protocolares.
Perguntei se ele já
pediu um pouco de café ou açúcar, em uma necessidade, para um
vizinho de porta.
“Nunca,
jamais, nem sei o nome de algum deles, me respondeu ele”.
“Lá
em São Luís, se faltar tomate, café, açúcar ou cheiro verde, dou
apenas seis passadas, bato na porta da vizinha e ela me socorre, lhe
respondi”.
Não
moro onde não falo com as pessoas. Não fiz votos de silêncio.
Tenho necessidade de falar. Não moro onde não posso bater na porta
da pessoa ao lado, quando precisar. Tenho lido sobre pessoas que
passam que passaram toda uma vida ao lado de outras, morreram e nunca
souberam nem o nome. Isso jamais aconteceria comigo, minha
curiosidade não deixa. Tô fora. Não sou o cara que tem “um
milhão de amigos”, mas gosto de me conectar com pessoas. Tenho
amizade longevas, que faço questão de manter.
Fiz
aniversário no dia 07 de dezembro, completei 64 anos de aprendizado.
Sigo pela estrada da vida na tentativa de compreendê-la um pouco.
Falando e ouvindo pessoas. Havia combinado com um pequeno grupo de
amigo do Colégio Batista, que no dia 08/12, feriado religioso, os
reuniria em nossa casa para celebração da data.
Tudo
certo, bolo e quitutes encomendados, Heloísa, minha companheira de
jornada teve uma crise de enxaqueca, que a levou à emergência de um
hospital. Coloquei no grupo de WhatsApp “Amigos do Batista, os
bons”, comunicando o adiamento do encontro e o motivo.
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O autor com os amigos à mesa |
Heloísa foi medicada, melhorou, e no sábado, 10/12, consegui
reuni-los finalmente. Nem todos puderam vir, alguns tinham
compromissos prévios. Mas, os que vieram, fizeram a festa. Em torno
da mesa, estavam Solange, Viviane, Lys com Maurício, Yara com Carlos
Alberto; e Conceição, que a partir desse encontro passou a fazer
parte do especial e alegre grupo. Condição para entrar no grupo:
“amar a vida, ter leveza, ser sábio na arte do bem viver”.
Dizia
minha saudosa mãe Dinha, que os bens mais preciosos que alguém pode
oferecer a outro são seu tempo e sua atenção. Ela partiu cedo,
sigo bebendo de sua sabedoria.
Agora, estávamos nós reunidos, a rebobinar a memória,
contando caso e causos de um passado de mais de 55 anos. Tempos de
crianças, memórias afetivas, lembranças que alimentam o espírito,
que rejuvenescem a alma. Somos do tempo em que dividíamos a mesma
carteira de madeira escura. Levantava-nos todas as vezes que a
professora entrava na sala. Tempos em que se jurava a bandeira;
tempos de respeito e disciplina.
O
que para alguns deles era programado para durar duas horas, o
encontro entrou pela madrugada. E, faltou tempo para passar em
revista muitos assuntos. Falamos da vida, alegrias e tristezas, e de
sua finitude. Solange Carneiro, deu uma aula de vida, ao recordar a
partida de Flávio, amor de sua vida. Solange falou da morte com
suavidade e lirismo. Ouvi-la me dignifica. Ela entendeu o real
sentido da vida. Como cristã, sabe colocar em prática os
ensinamentos do DEUS VIVO.
Como os amigos do Colégio Batista são ilhéus, ou seja,
nascidos na Ilha do Amor, somos parentes diretos dos caranguejos.
Quando se puxa um, vem outro. As conversas são como cantiga de
grilo, ‘interiça’, não acabam nunca. Se costura um assunto no
outro.
As
horas se passaram, os assuntos se sucederam; falamos do passado,
vivemos e vivenciamos o presente, marcamos novo encontro para o
futuro.
Coisa
boa é alguém reservar seu precioso tempo e sua atenção para jogar
conversa fora, sem pesar ou medir as palavras, rir frouxamente.
Vivemos e vivenciamos momentos únicos e especiais, que enquanto
escrevo, já fazem parte do passado.
Quão bom é ser acolhido por pessoas especiais que o destino
se encarregou de unir lá no final da década de 60, e que o tempo,
com sua magia, fez questão de preservar. Entramos pela madrugada
celebrando a vida, alimentando a amizade, gargalhando de nossa rica
trajetória. A caminhada para chegar até aqui é fruto da construção
baseada no respeito e admiração de uns pelos outros. Essa amizade,
não é tão somente rara, mas também fruto da vontade de ter a
companhia do outro.
O
tempo, o senhor da razão, segue seu curso, impávido, e nesta manhã
de domingo, 11 de dezembro de 2022, só posso dizer a cada um de
vocês, em primeiro lugar, muito obrigado pela atenção, carinho,
gentileza e generosidade de cada um, em compartilhar juntos, o que
maioria das pessoas não tem mais: tempo para sorrir, para conversar,
para compartilhar momentos indeléveis e inesquecíveis.
Em um
mundo cada vez mais corrido e descartável, onde tudo tem preço, e
nada tem valor, ter amizades longevas e duradouras é um privilégio
reservado a poucos. Vocês aqueceram o meu coração, obrigado pela
atenção e acolhida de cada um de vocês.
(*)
Luiz Thadeu Nunes e Silva, Engenheiro Agrônomo, Palestrante,
escrevinhador, cronista e viajante. O latino-americano mais viajado
do mundo com mobilidade reduzida, visitou 151 países em todos os
continentes da terra. Autor do livro “Das muletas fiz asas”.
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