| Imagem extraída do Google |
José Pedro Araújo (*)
Esses dias que correm são de uma
malvadeza tremenda. Refiro-me ao tempo, não a outros problemas da vida atual. E
então me pergunto se o tempo já era assim, tão desumano, quando eu ainda era
uma criança. No velho Curador, correndo descalço pelas ruas incandescentes e poeirentas,
ou embrenhado na mata em busca de passarinhos, não me lembro de meu corpo
padecer tanto quando nos dias atuais. O calor terrível que hoje me martiriza,
já era tão grande assim, quando não havia a presença do ar-condicionado, e nem
mesmo de um ventilador? Não sei responder a essa pergunta, pois as imagens que
me vem à mente são de um frescor consolador. Além do mais, quando o sol
castigava demais, sempre havia o riacho Firmino ou mesmo as pequenas lagoas que
se formaram às margens da rodovia recentemente construída, a nos fornecer as
suas águas dadivosas, espantando para longe o calor.
Dávamos como certo, que neste mês
de novembro, as primeiras chuvas já apareciam por lá. Esparsas, talvez três ou
quatro borrifos que mal dava para aplacar o calor do vento e faziam com que a
terra se tornasse mais agradável de se pisar. Mas elas sempre estavam por ali. Dois
de novembro, então, Dia de Finados, quando choramos os nossos que partiram, era
um desses dias em que já se saia de casa com um guarda-chuvas nas mãos, pois
havia a certeza de que o céu derramaria água sobre a terra. Pois os últimos
dois de novembro têm fugido a essa regra. Nada de chuvas, apesar de algumas
nuvens escuras terem ocupado espaço no firmamento, para depois seguirem
mansamente em direção ao oeste, sem derramar uma gota sequer.
Nesse tempo também, os
agricultores da minha região já haviam preparado as suas roças, feito a
derrubada de praxe da mataria, e até aproveitavam-se do tempo seco para atochar
fogo na galharia ressecada. Quanto aos retardatários, aqueles que não confiavam
na regra imposta, arrependiam-se de não terem tido a cautela de praxe, e se
preparavam para os próximos dias de estio, quando então também tacavam fogo nas
suas derrubadas. Era isso, ou corriam o risco de perderam o tempo ideal, pois
as chuvas do final do mês já vinham mais intensas e amiudadas, impedindo que as
árvores caídas secassem e aceitassem o fogo que iria contribuir para a limpeza
do terreno, preparando-o para receber as sementes.
Hoje em dia, não sabemos ao certo
quando as chuvas cairão, molhando a terra e refrescando o ar. Os
meteorologistas até já se aproveitaram do You Tube para divulgar as suas
notícias sobre o clima, mas nem sempre acertam. Estão sempre procurando
explicações nas condições climáticas para justificar os seus erros. Hoje, por
exemplo, teríamos um pouco de chuva aqui em Teresina, diziam, coisa leve, mas
que deixaria o ar mais respirável. Até vi algumas nuvens brigando contra o sol desde
o começo da manhã, mas não creio que as minhas plantas venham a receber a
dádiva da água caindo sobre elas ainda no dia de hoje. E à tarde, e até na
primeira parte da noite, o calor vai se acentuar e nos torturar. Essa é outra
diferença que sinto. Parece que a cidade se aquece muito mais quando o sol vai
embora e a noite se derrama sobre ela. Nunca vi nada igual. O calor às oito da
noite é mais intenso do que a temperatura que tivemos às três da tarde. Por
quê? A pergunta que faço é para mim mesmo, não quero uma resposta dos ambientalistas
ou de seus contrários. Já chega de ouvir sandices de um e de outro lado. Mas de
uma coisa eu tenho certeza: a manhã esteve um pouco mais fresca que as dos dias
anteriores. Bastou uma ameaça de chuva para o calor amainar e o vento derramar
sobre nós um leve frescor.
A cada ano que passa clamo mais
pela chegada das chuvas. Olho para o nascente com a esperança de que de lá
venha uma nuvem carregada de gotas de água para serem derramadas sobre a cidade
que se debate tristemente entre o calor e a esperança. Enquanto isso, vamos
sofrendo também para honrar os elevados boletos que a empresa energética
depositou na nossa caixa de correspondência. A conta da água também sofre uma
grande elevação nesse período, chegando quase a dobrar. Ainda bem que não
precisamos ligar o aquecedor de água, pois o líquido já desce do chuveiro tão
quente que temos que praticar um grave desperdício, deixando que ela escorra por
um bom tempo até se tornar mais acessível.
Voltando ao meu velho Curador,
recordo-me ainda de que a água que usávamos para tomar banho, e que era
coletada no poço que tínhamos no nosso quintal, era mais fresca e não nos
queimava o cocuruto como a que sai da tubulação que abastece a nossa rua. Eram
tempos difíceis, sem água encanada, sem energia elétrica durante o dia, mas
parece que convivíamos mais facilmente com o clima.
É certo que o período de chuvas,
ou os invernos, como chamamos por aqui, trazem também os seus infortúnios, como
as nuvens de muriçocas que invadem as nossas casas, a queda da energia que nos
deixa no escuro, os alagamentos, até mesmo as ventanias que muitas das vezes
nos causam sérios problemas. Mas nada rivaliza com as temperaturas escaldantes
que nos afligem nos dias atuais. E é por isso que olho para o levante todos os
dias na esperança de que aquela nuvenzinha fraca que se forma se junte às suas
colegas e formem nébulas carregadas de água. Conto os dias para que isso
aconteça.
E quando o inverno vem, fico a
contar o tempo, preocupado de que o verão logo voltará. Teremos novos verões em
breve, é o que me vem à cabeça. E olha que eu não planto roças, não crio
animais, não faço nada disso. Imaginem só se eu me preocupasse com a sede dos
meus animais ou com a secura dos meus roçados!
Acontece, como dá para notar, que
sou um admirador da chuva, daqueles que invocam um dia chuvoso como “um belo
dia”, e não como um “dia feio”, como costumam proferir os sulistas. Daí, também, ir na contramão dos irmãos Goncourt,
escritores franceses citados por Montello no seu ótimo Diário Completo, quando
dizem que “Na província, a chuva é uma distração”, para destacar o tédio ou
falta de ocupação dos provincianos. De minha parte, prefiro humildemente admirar
o fenômeno natural como uma das mais belas oferendas da natureza para os seres
humanos. Para mim, é como se gotas de prata estivessem sendo lançadas do alto
para enriquecer os meus dias.
Porém, as notícias que acabo de
ler no jornal local é de que Teresina terá uma semana de intenso calor e baixa
umidade. Porque eu fui dirigir o meu olhar para o You Tube!
(*)
José Pedro Araújo
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