quinta-feira, 16 de agosto de 2018

Teresina 166 Anos - a aposta de um visionário

Conselheiro Saraiva, fundador de Teresina


José Pedro Araújo
A história da transferência da capital do Piauí de Oeiras para Teresina é do conhecimento de todos, especialmente dos piauienses. Quanto às dificuldades enfrentadas pelo Conselheiro Saraiva, então Presidente da Província, nem tanto assim. E não me refiro somente à questão de falta de recursos financeiros como principal entrave. A reação da parte dos oeirenses para manterem a capital na sua cidade foi tremenda e quase resvala para a violência pura, com riscos para a própria vida do Presidente em questão. A situação de Saraiva junto ao Imperador Pedro II também não era das mais confortáveis, tal o número de reclamações que os parlamentares piauienses, a maioria originários de Oeiras, levavam até aos ouvidos do mandatário maior da nação. A história oral chega a afirmar mesmo que o Imperador ficou muito agastado quando soube da promulgação da Lei que sacramentava a transferência da capital para Teresina: “é isso que eu ganho ao nomear um menino inexperiente para dirigir uma província como o Piauí”, teria dito. Se afirmou isso, não podemos confirmar, mas não há dúvidas de que seus ouvidos ficaram incomodados com tantas reclamações que recebeu pelo ato praticado pelo seu indicado.

O que se sabe mesmo é que Saraiva era um homem determinado e com uma visão de futuro muito aguçada, pois não foram poucas as vezes que se tentou mudar a sede do governo de Oeiras, e não se conseguiu. A última vez que tal intento ocorreu elegia-se como nova sede do governo a povoação de São Gonçalo (Regeneração), sem que lograssem êxito. Quando viram que Saraiva se mostrava irredutível, e com algum apoio no parlamento, alguns ainda aventaram a possibilidade de transferência da sede para... São Gonçalo, que não ficava tão distante assim da velha capital. Mas o Conselheiro os enfrentou com argumentação na ponta da língua para não se render aos apelos dos refratários à mudança. Vislumbrava mesmo a utilização do Rio Parnaíba como meio para retirar a província do atraso e, ao mesmo tempo, evitar que o Piauí continuasse a ver todas as transações econômicas da região ser negociadas em Caxias, próspera cidade maranhense.

O parlamento da província ainda tentou levar a coisa na manha e postergar a transferência, mas Saraiva reagiu a tempo e incluiu no relatório encaminhado em 1º de julho de 1852 aos parlamentares, um rol de motivos que não deixava dúvidas quanto às vantagens da mudança sugerida, nem quanto à sua determinação de procedê-la. Deixemos que fale então:

  “Quando vontade tivesse de esquecer agora assunto tão importante, para entregá-lo sem reflexão à vossa sabedoria, e experiência, era nisso embargado pela necessidade que tendes dos conhecimentos práticos indispensáveis para considerar uma matéria de tão subida gravidade”.

“No meu anterior relatório, manifestei muito explicitamente quanto pensava a respeito dessa questão, e cada vez mais me tenho convencido de que a mudança da capital, é a primeira necessidade da Província, e que cumpre-vos satisfazer à esta necessidade de uma maneira que mais se harmonize com os nossos recursos, e com os interesses, que devem ser de alguma forma consultados”.

“Não sei por que, Senhores, a Assembleia passada entendeu em sua sabedoria conveniente o adiamento de um projeto, que nesta casa foi elaborado em atenção a essa ideia, e isso tanto mais reparo mereceu, quando em épocas mais remotas o Corpo Legislativo quase que sem convicção de exequibilidade de execução das leis a respeito, votou-as com suma facilidade. Como Administrador, cumpro meu dever, trazendo a este recinto o que penso em benefício da Província; e se a mudança da capital só pode oferecer-me desgostos e sacrifícios, porque ela exige trabalhos avultados para sua realização, e necessidade de se ofender até os interesses de amigos, força é reconhecer que é preciso muita dedicação aos interesses públicos para que alguém queira tomar sobre seus ombros.”

“Confesso que a tenho promovido com empenho; porque a mudança da capital é uma dessas medidas que tem necessidade para o seu triunfo de esforços grandes, e de uma calculada perseverança da parte de seus amigos, e devo dizer-vos ainda agora, Senhores, que deveis contar com esses esforços; porque não serei eu quem, convencido da vantagem imensa da mudança da capital da Província, recue diante de sacrifícios, e de embaraços, enquanto me restarem forças para suportar aqueles, e meios legítimos e honestos para remover a estes”.

“Em vossas mãos está, pois, a solução dessa questão que prende a atenção da Província inteira, e como apenas hoje os inimigos dessa medida só lhe opõe a objeção de se a querer realizar para um lugar inconveniente, e com precipitação, me parece necessário insistir sobre essa circunstância”. 

“Quanto a mim a mudança da capital para o Poti há de produzir a navegação em grande escala no rio Parnaíba; há de dar à Província um importante ponto comercial; e há de possuir uma civilização grande, porque há de ter riqueza, e há de ficar ligada por navegação a todos os municípios da Província, e a todos os grandes centros de civilização do Império”.

...


 “Assim, pois, Senhores, votai a lei, se achares é isso a bem da Província. Votai, sem vos esquecerdes de nela consignar todos os meios indispensáveis para sua execução”.

“Não gosto de arbítrio; porém o arbítrio é necessário em semelhantes medidas: porque elas jogam com circunstâncias imprevistas, que tem de ser convenientemente atendidas”.

Vinte dias depois a lei estava aprovada e sancionada. Apesar de muito jovem, 29 anos apenas, o Conselheiro Saraiva era um homem determinado e mostrou isso ao se contrapor às principais lideranças políticas da Província, que advogavam a manutenção da capital em Oeiras; ou com os parnaibanos, que queriam a instalação da sede do governo no litoral. Saraiva provou ser um homem também de visão ao propugnar pela localização da capital bem no centro do território piauiense.

O Piauí deve muito a esse baiano ilustre. Nenhum piauiense tem dúvidas, hoje, que criou uma bela e estratégica cidade na Chapada do Corisco. Salve o 16 de agosto! Salve José Antonio Saraiva! (Texto Publicado originalmente no Portal MaisPiaui.com)               

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