![]() |
Cemitério Militar e Memorial Americano na Normandia(França) |
José Pedro Araújo
Hoje temos um dia perfeito para tratamos sobre este tema triste da história do município. Para algumas pessoas, sobretudo
os mais novos, o primeiro “Campo Santo” destinado para o sepultamento dos
mortos do velho Curador, foi o conhecido Cemitério de Santo Antônio, situado quase
no centro da cidade, à rua Cel. João Sena. Como já tratei em outro texto,
trata-se de um espaço em que convivem lado a lado o descaso com os nossos mortos,
com uma desorganização sem tamanho. Andar pelo interior daquele cemitério é uma
ação que exige muita vitalidade do visitante, pois não existem ruas ou alamedas
para a sua movimentação, tendo o incauto de saltar sobre catacumbas, pisar em sepulturas semi-abandonadas, ou mesmo se machucar em alguma cruz de braços pontiagudos
enquanto procura pelo seu morto a prantear. Como dever de ofício, gostaria de
afirmar que o desleixo com aquela necrópole não vem de hoje. Os atuais
administradores da cidade já herdaram o problema de administrações passadas, e
continuaram a tratar o velho cemitério no mesmo diapasão.
E em razão disto, a
desorganização do local tem feito com que sejam realizados sepultamentos de
pessoas em covas de há muito já habitadas. Como aconteceu recentemente, quando
a sepultura da minha irmãzinha Célia foi usurpada por determinada pessoa da
comunidade ao construir sobre ela um horroroso mausoléu. Acredito que, pelo tamanho
da coisa, outras tumbas tenham sido vilipendiadas também. Mas, devo admitir que
nesse caso houve um profundo descaso de quem deveria primar pelo zelo do espaço,
ao permitir que um túmulo tão antigo como aquele fosse “grilado”. Esse fato me
causou tanto constrangimento, e tanta dor, que esta é a segunda vez que trato
sobre ele. E como acontece em todos os outros lugares onde os mortos e seus
familiares são tratados com respeito, aquele cemitério não deveria permitir as
atividades de novos sepultamentos, a não ser que o destino do corpo fosse as
catacumbas familiares ali existentes e com espaço definidos para isto. Para os
novos, existem outros cemitérios.
Mas o assunto que me trouxe até
aqui, cujo o título acima evidencia, diz respeito ao primeiro sepulcrário
construído no velho Curador de outros tempos. E esse “Campo Santo”, não foi o Cemitério
Santo Antonio, mas um outro que ocupava espaço bem no centro da cidade, próximo
à antiga Capela de São Bento, templo substituído pela imponente Matriz de São
Sebastião.
Como é do conhecimento de todos, no
passado distante, os cemitérios eram administrados pela igreja católica, e construía-se
em uma das fontes de arrecadação de fundos das igrejas as taxas cobradas em
decorrência dos sepultamentos naquele local. Por essa razão, esses espaços eram
escolhidos bem ao fundo das igrejas, como se fossem o seu quintal. Alguns
defuntos, os mais abonados, eram sepultados no interior dos templos mesmo, nas suas
largas paredes, ou mesmo no piso destas. Suas famílias, naturalmente, tinham
que dispender uma quantia maior para ter essa permissão. Ou isso, ou a figura
ali sepultada deveria pertencer a uma casta privilegiada, como os antigos
nobres ou coronéis com larga folha de serviços prestados à paróquia. E isso
aconteceu até que houvesse a proibição, por motivos sanitários, de se sepultar
no interior dos templos ou em locais muito próximos de onde eram realizados os
cultos ao sagrado.
Quando primeiro cemitério do
Curador foi construído, esta prática não existia mais. E como a humilde capela
nem Cura possuía, coube à municipalidade a sua construção, ou mesmo tratou-se
de uma ação realizada pela própria comunidade, o que era mais provável. O certo
mesmo, é que essa necrópole também ficava a poucos passos da Capela de São
Bento, na rua Grande, onde hoje se situa a pomposa sede do Banco do Brasil, além
de algumas casas da região. Sob as paredes daquela casa de crédito estão
sepultados os primeiros defuntos do Curador. Sou tendente a acreditar,
inclusive, que não se procedeu de acordo com legislação pertinente para casos
de encerramento de cemitérios: após o encerramento das atividades de um cemitério,
os ossos dos que ali foram sepultados devem ser removidos e levados para um ossuário
construído no novo local para lá serem depositados. Mas a lei não chegava até o
Curador de então, e por essa razão, acredito que não se deu uma destinação mais
respeitosa aos primeiros mortos do Curador.
Um tio meu, já quase chegando ao
patamar do centenário, disse-me outro dia que se constituía em verdadeiro
martírio passar pela frente daquele cemitério depois que a escuridão cobria a
povoação ainda sem nenhuma iluminação noturna. Que existe até mesmo a história
de uma onça que se abrigava no interior daquele velho cemitério durante as
noites. Mas isso é história para outra ocasião. O fato é que o primeiro cemitério
do Curador ficava onde hoje é um dos pontos mais valorizados da cidade, e a
dois passos da principal praça da cidade.
Para finalizar esta crônica, devo
dizer que a escolha de uma data para prantearmos todos os nossos mortos advém desde
o século V. Mas a escolha do dia 2 de novembro só foi sacramentada já no
século XIII. E é uma data consagrada em todo o mundo cristão. Alguns povos,
como os mexicanos, por exemplo, fazem uma verdadeira festa nesta data, o povo
veste-se com aquelas feias fantasias com pinturas de toda a ossatura de um
cadáver, enquanto outros usam horrendas máscaras de caveira. E bebem, embriagam-se,
e disponibilizam comida e bebida para seus mortos.
Por aqui, obsequiamos nossos
finados com ramalhetes ou coroas de flores. E velas. Muitas velas, prática esta
dos que professam a fé católica. A tradição afirma que as coroas circulares,
atestam a vitória sobre a morte. E as velas acesas são para iluminar os
caminhos. É o que atestam os praticantes do catolicismo.
Para nós outros, bate uma saudade
sem igual dos nossos entes queridos que já partiram. É um dia, o de finados,
para refletirmos sobre o que nos resta da vida, e para uma mudança de foco,
caso entendamos que estamos transitando por errados e tortuosos caminhos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário