quinta-feira, 27 de junho de 2024

NASCIA O MUNICÍPIO DE CURADOR EM MEIO A MAIS BRUTAL DAS GUERRAS HÁ 80 ANOS

Imagem de Caroline Soares de Araújo

José Pedro Araújo (*)

O mundo atravessava uma das fazes mais negras da sua história durante as décadas de trinta e quarenta, ocasião em que milhões de pessoas perdiam a vida em cruentos confrontos entre as forças nazistas e seus inimigos declarados, os aliados. O teatro em que se desenrolava tamanho morticínio, era o território europeu, e também parte do sofrido continente africano, para onde o conflito se estendeu. Enquanto isso, o Curador dormia o seu sono tranquilo, uma vez que as terríveis notícias quase não chegavam até o seu território, através das ondas das rádios. E rádio era um bem caro, difícil de ser adquirido, até mesmo pelos que detinham algum poder econômico. Por sua vez, não nos consta que algum conterrâneo tenha lutado naquele conflito tenebroso, o que fazia com que as famílias aqui estabelecidas não tivessem razões para chorar pelos seus filhos. E se o clamor das vítimas não chegavam com frequência até nós, o fragor das batalhas e o barulho dos canhões não penetravam pelos nossos ouvidos, já que as suas ações se desenrolavam longe do nosso continente, e apenas, eventualmente, nas costas do nosso país quando algum navio mercante começou a sofrer ataques dos alemães. Longe do litoral, escondido no centro da mata quase intransponível, e alheio às notícias dos jornais, o velho Curador se mantinha sem muitas informações acerca do horroroso conflito que custava a vida de tanta gente.  

E foi justamente quando a guerra estava na sua fase mais cruenta que o povo do Curador recebeu a notícia de que a Lei nº 820, de trinta de dezembro de 1943, que estabelecia a nova divisão territorial do Maranhão, reconhecia a nossa soberania, separando-nos do município de Barra do Corda. A notícia, que deve ter nos chegado com relativo atraso, dado à falta de comunicação com a capital do estado, veio pelas vias telegráficas e de forma muito resumida, como era praxe nos telegramas. Mas foi suficiente para encher de alegria toda a população. Talvez tenha havido comemorações mais acerbadas em algumas das casas das famílias mais importantes politicamente, com a distribuição de bebidas e comidas à larga para os convivas; e que o som do baião tenha empolgado mais do que nunca os nossos moradores que viam o fim do período junino se aproximar. Afinal, estávamos em véspera de São Pedro, um dos dias mais importantes no calendário junino.

Mas aí vieram os dias de angústia e dúvida. Entramos no ano de 1944 e nada de marcarem a data da nossa solenidade de elevação à categoria de município. Nada de conhecermos o nosso primeiro mandatário, aquele que iria dar início à história política e administrativa do novo município. A realidade continuava a mesma, ainda estávamos sob a chefia dos políticos de Barra do Corda, e sem orçamento próprio. Passaram-se 6 meses e não conhecíamos o nosso interventor. Nesse interregno a sede era tomada por notícias pouco verdadeiras, fuxicos e falácias sobre esse ou aquele nome para assumir os destinos políticos da novo município. Os grupos políticos já estavam devidamente definidos, só não sabíamos quem iria indicar o nosso primeiro mandatário, aquele que iria posar de chefe político do novo município. Imagine-se o vai-e-vem dos políticos em direção à capital com a intenção de obterem a primazia da indicação do nosso primeiro administrador.

Até que, certo dia, chegou até nós a notícia de que a data já estava escolhida. E seria a mesma para todos os novos municípios: 28 de junho daquele sagrado ano de 1944. E que, como o interventor estadual, Dr. Paulo Martins de Souza Ramos, não poderia se fazer presente em todos os lugares ao mesmo tempo, a nossa festa de elevação não contaria com a sua presença. Entretanto, mandou como seu representante, o Secretário da Prefeitura de Vargem Grande, Raimundo Ferreira de Souza para presidir a solenidade. Menos mal que estava presente também o interventor de Barra do Corda, Jamil de Miranda Gedeon, e o futuro deputado estadual Manoel Gomes, além de muitos cidadãos que logo estariam à frente dos embates locais. Manoel de Oliveira Gomes, aliás, se elegeria na 2ª eleição legislativa ocorrida em 1947, após a reabertura da Assembleia Legislativa, depois do seu fechamento pela ditadura Vargas, e daí em várias legislatura, contando sempre com o voto de boa parcela dos eleitores de Presidente Dutra.

Foi uma festa realizada com a presença maciça da população curadoense. Estava, enfim, criado o nosso município. Contudo, para nossa tristeza, ainda não veríamos oficialmente o nosso primeiro interventor, uma vez que o ato com a sua nomeação só seria assinado no dia 27 de julho de 1944, praticamente um mês depois da solenidade de elevação. E, como todos sabem, o escolhido pelas autoridades da capital foi o coletor estadual José Lúcio Bandeira de Melo, que na época prestava os seus serviços na coletoria da Vila de Curador. José Lúcio ficaria no cargo durante cerca de nove meses até que as brigas políticas começaram a se acirrar e a exigir um político da terra no posto de interventor. Desde então, viveu-se uma verdadeira enxurrada de nomeações e exonerações: mais sete interventores, sucessivamente, até o ano de 1948, ocuparam a cadeira número um da sede. Até que, neste ano, em 19 de janeiro, os curadoenses, finalmente, escolheram o seu administrador municipal através do voto direto. Elegeram o Sr. Ariston Arruda Léda. De lá para cá, muitos embates foram travados.

O atual prefeito, Raimundo Alves de Carvalho, é a vigésima primeira pessoa a tomar acento na cadeira de primeiro mandatário municipal de Presidente Dutra, mas somente o décimo-quarto escolhido diretamente pelos eleitores do município nesses setenta e dois anos já decorridos. Outros sete foram vice-prefeitos que tomaram assento por diversas outras razões, como a renúncia do prefeito legalmente escolhido, a morte de dois deles, ou em decorrência da cassação de um outro que havia sido legitimamente eleito.

Desde o dia 28 de junho de 1944, lá se vão 80 anos, desde a declaração de nossa maioridade. Já poderíamos ter atingido um melhor nível de desenvolvimento, mas não podemos nunca nos esquecer de que as lutas foram renhidas e dolorosas até que chegássemos ao ponto em que chegamos. Aquela vilazinha que se desligou do território barra-cordense e que não contava com escolas ou com atendimento de um único médico, hoje é referência nessas duas áreas. Hoje são muitos os hospitais e clínicas existentes, e um sem-número de faculdades em várias áreas do conhecimento educam a nossa população e a dos municípios circunvizinhos. Ao mesmo tempo, o município se transformou em polo regional de desenvolvimento no estado e hoje gera emprego para milhares de pessoas.

Parabéns, Presidente Dutra, pelos seus 80 Anos de Emancipação política!

(*)José Pedro Araújo é engenheiro agrônomo, funcionário público federal aposentado, historiador, cronista, romancista, e coordenador do blog Folhas Avulsas.

 

 

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