quarta-feira, 9 de outubro de 2024

A PAZ AGORA RESIDE NO ARRAIAL

 

Prédio da Prefeitura Municipal de P. Dutra - MA


José Pedro Araújo

Em tempos não muito distantes de nós o título acima não encontraria lugar em um texto qualquer que fosse elaborado após o transcurso de eleições na minha aldeia. Ao contrário, ainda hoje estaríamos chorando pelos nossos entes queridos que haviam sido feridos ou até mesmo tombado durante as disputas eleitorais processadas no velho Curador. Foi por conta disso que ganhamos a pecha de cidade violenta onde as discussões políticas acabavam invariavelmente em tiroteios e, não raro, com mortos a serem pranteados. Poderíamos dizer também, para aliviar um pouco as nossas consciências, que esse mesmo tipo de querela, que não tinha nada de democrática, ocorria em todo o país naqueles anos, e de um modo mais acentuado, em todo o nordeste do país. Em São Luís mesmo, aclamada como sede culta do nosso estado, a decantada Atenas brasileira, os casos de violência corriam solto durante os pleitos eleitorais, culminando, em certa época, com dezenas de casas incendiadas e tiroteios alarmantes no perímetro que envolve o palácio do governo, e levavam semanas. Contudo, para os pasquins partidários que circulavam na capital, nos altos sertões a violência envergonhava o povo maranhense em decorrência dos confrontos sangrentos praticados naquelas plagas.

Pois é. Saímos das eleições ocorridas domingo passado, com um saldo bastante positivo. Nenhum crime de morte foi praticado no velho município. As discussões foram travadas tão somente no âmbito dos discursos inflamados e, diga-se de passagem, com alguns pescoções distribuídos pelos quatro cantos do município, mas sem que o sangue escorresse pela terra. Alguns até podem dizer que pescoções, murros pesados, são desferidos até mesmo em festas de família, e por que não em disputas pelo voto?  É verdade também que muitas futricas, mentiras vergonhosas, e até mesmo conchavos que envergonham a boa política, foram disseminados no período que antecedeu o domingo das eleições. Mas isso maltrata, magoa, e até deixa sequelas profundas nas pessoas atingidas, mas logo será esquecido. Nas próximas eleições, quem magoou, esquecerá; e o magoado, fará de conta que nada de grave ocorreu, pois estarão juntos com o seu agressor, no mesmo palanque. Alguns dirão que isso é normal, desde que foi instalado o pluripartidarismo desbragado, quando dezenas de partidos foram criados e, nesse caso, praticamente ninguém mais ganha eleições sem fazer coligações com outros partidos. Isso nos serve de consolo?

Assim ocorreu no nosso município. Grupos políticos que travaram disputas ferozes nas eleições municipais passadas, se juntaram nestas eleições, e aí os inimigos já eram outros, nossos aliados de outras refregas. Famílias se dividiram, lutaram umas contra as outras como se nunca estivessem estado juntas. Isso é a democracia, dirão. Mas de qual democracia estamos falando, se as disputas se dão no campo dos interesses pessoais e não por ideologia? Talvez precisemos mudar o significado do termo criado pelos gregos para caracterizar os embates entre adversários que defendiam ideias contrárias. Até mesmo os conceitos que passaram a definir esses grupos em disputa, direita e esquerda, hoje até são usados à larga, talvez mais até do que no passado, mas não dizem muito do que os caracterizava no passado. E vou além. Na minha humilde opinião, só servem mesmo para que os líderes políticos instiguem seus partidários para o confronto com os seus adversários. Adversários, como já afirmei lá para trás, que em eleições passadas militavam nas mesmas trincheiras. Aproveitando para justificar a minha posição que, deverá ser contestada por muitos que vierem a lançar olhos sobre este despretensioso texto, exemplifico o que afirmei mostrando que aqui em Teresina, cidade em que resido, o Partido dos Trabalhadores se aliou com um universo de outras agremiações que podem ser rotuladas de qualquer coisa, menos de partidos de esquerda. Logo ele que em eleições já distantes, se negaram a se juntar com algumas outras rotuladas de direita. E se nos dedicássemos a perder alguns minutos do nosso tempo para levantar o passado de alguns dos candidatos mais em evidência alojados no Partido dos Trabalhadores, veremos que outro dia mesmo, estavam eles defendendo aguerridamente as cores do extinto PDS/PFL, agremiações políticas que defendiam encarniçadamente o governo militar que mandou no país por longos vinte e quatro anos, e que eles hoje rotulam de ditadura.

Hoje devemos comemorar no nosso município de Presidente Dutra o fato de sairmos destas eleições com o couro intacto, com a saúde em dia para podermos esperar o próximo pleito daqui a dois anos e, quem sabe, sairmos pelas ruas da nossa cidade abraçados, ou pelo menos ombreados, com alguns dos nossos adversários destas eleições que se encerraram no domingo passado. E viva a democracia brasileira! Com as suas incongruências e os seus sofismas grudentos e maledicentes. Mas é essa a que temos, e devemos agradecer por levarmos as nossas disputadas apenas para o campo das palavras, não através dos desforços que já nos deram muitos motivos para derramarmos lágrimas.   

4 comentários:

  1. É verdade! Texto bem realista!! Parabéns, meu irmão. 🙏🏻👏🏻👏🏻👏🏻

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  2. Um bom e oportuno texto, caro José Pedro Araújo

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    1. Fico honrado com a leitura e pelas suas palavras.

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