Didi e sua mãos calejadas |
Elmar Carvalho(*)
Quando eu voltava ao meio dia e
meia para casa, vi o Didi a trabalhar na casa de um dos meus vizinhos. Estava
literalmente com as mãos na massa, razão pela qual elas estavam sujas de
argamassa. Enquanto o Didi trabalhava, meu vizinho enxugava uma cerveja
estupidamente gelada, a olhar o trabalho.
Parei o carro, para
cumprimentá-los. Fiz menção de pegar na mão do Didi, mas ele negaceou, dizendo
que suas mãos estavam sujas. Respondi que elas estavam sujas para ele próprio,
mas para mim estavam mais limpas do que as de certos engravatados, mais limpas
do que os colarinhos de certos políticos, sobretudo do Distrito Federal.
Conheço-o faz vinte e cinco anos,
desde que vim morar no conjunto Memorare, onde resido até hoje, onde eu e minha
mulher criamos nossos dois filhos. Ele ganha a vida prestando pequenos serviços
aos moradores, sempre respeitador e bem-humorado, sem nunca se queixar, sem
nunca se maldizer.
Conquistou a estima e a amizade
de todos. Às vezes, amanhecia sem um centavo no bolso, mas nunca demonstrava
preocupação, e tudo acabava dando certo para ele. Didi sempre me faz lembrar as
palavras de Cristo, quando falava que as aves não têm celeiro, mas nunca lhes
falta o que comer; que os lírios do campo não fiam e não tecem, mas que nem
Salomão, em toda a sua glória, se vestia como um deles.
Didi é mais milionário do que
muitos arqui-milionários porque pouco possui, mas o que tem lhe é o bastante, e
nasceu desprovido da ganância e da ambição. Portanto, tem o reino do céu, aqui
mesmo na terra. Sem dúvida, é um bem-aventurado.
(*) Elmar Carvalho é juiz
aposentado, poeta e membro da Academia Piauiense de Letras.
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