Antigas igrejas N.S.da Conceição(Barras) e Santo Antônio(C.Maior) by Portal Entretexto e Blog do Poeta Elmar Carvalho |
Chico Acoram Araújo
Funcionário Público, cronista, contista, historiador e poeta.
Ao amigo e grande mestre
Dr. Elmar Carvalho
Como barrense da gema, sempre tive
curiosidade em saber um pouco mais da história do meu torrão. Qual a origem, por
exemplo, do nome dado ao rio em que minha mãe lavou meus “coeiros”; onde
fisguei o primeiro peixe; paraíso em que me empanturrava de alegria nas suas águas
mansas e frescas, e lugar do meu primeiro pulo mortal. Mas também, lugar onde
observava o canto dos pássaros sobre as frondosas copas das matas ciliares; o voo
apressado do Martim Pescador, de plumagem verde-azul reluzente, plainando sobre
as águas e sempre aguardando o momento oportuno para, em queda livre, mergulhar
e fisgar seu almoço. Local, por fim, do nado lento e mortal do jacaré, sempre à
espreita, nas sombras soturnas das árvores descaídas das ribanceiras do rio.
Pois bem, segundo nosso prestigiado
escritor e historiador Wilson Gonçalves, em seu Dicionário Enciclopédico
Piauiense Ilustrado, o rio Maratoã, como era antigamente grafado, significa o
riacho da Pedra Grande, em língua indígena. Isso tem sentido, uma vez que em
alguns trechos do rio enormes rochas afloram e permitem, no período de verão, a
travessia de pessoas e animais.
Ao descrever o rio da minha infância,
lembrei-me do excelso poeta Da Costa e Silva em seus versos “SOB OUTROS CÉUS”, que
magistralmente canta o rio Parnaíba em Amarante:
IV
“Eu sou tal qual o Parnaíba: existe
Dentro em meu ser uma
tristeza inata,
Igual, talvez, à que no
rio assiste
Ao refletir as árvores,
na mata...
O seu destino em
retratar consiste,
Porém o rio tudo o que
retrata,
De alegre que era, vai
tornando triste,
No fluido espelho móvel
de ouro e prata...
Parece até que o rio
tem saudade
Como eu, que também sou
desta maneira,
Saudoso e triste em
plena mocidade.
Dar-se em mim o
fenômeno sombrio
Da refração das árvores
da beira
Na superfície trêmula
do rio ...”
Foi este desejo de conhecer mais
sobre a história do meu torrão, o que me levou a escrever uma crônica com o
título “Barras do Marataoan: o Retorno”, publicada, recentemente, em Folhas
Avulsas(josepedroaraujo.blogspot.com.br), e no blog de Elmar Carvalho (poetaelmar.blogsport.com.br).
Nesse escrito, conto um pouco da história de Barras, a origem do epíteto de
terra dos governadores e dos poetas, e elenco alguns dos ilustres barrenses
nascidos às margens do Marataoan. Para escrever esse artigo, recorri ao grande
poeta e escritor Elmar Carvalho em sua crônica ensaística “Barras – terra dos
governadores e de poetas e intelectuais”.
No texto que ora escrevo, volto a
falar um pouco mais sobre as origens de Barras, dando um enfoque histórico
sobre os precedentes da fundação e povoamento de Barras em meados do século
XVIII, e, sobre o seu entrelaçamento com Bitorocara, antiga fazenda de
propriedade de Bernardo de Carvalho e Aguiar, pai de Miguel de Carvalho e
Aguiar, ambos considerados fundadores da cidade de Campo Maior e Barras do
Marataoan, respectivamente. Trato aqui, portanto, da relação que existe entre
estas duas importantes cidades fundadas, a primeira, pelo valoroso Mestre de
Campo, e a segunda, pelo seu filho.
Como relatei em minha crônica
anterior, Barras surgiu a partir de uma fazenda de gado conhecida como
Buritizinho, que se tornou povoado tempos depois. O proprietário dessa fazenda
chamava-se Miguel de Carvalho Aguiar, filho do lendário Mestre de Campo
Bernardo de Carvalho e Aguiar fundador da fazenda Bitorocara que ficava
encravada nas confluências dos rios Longá (Bitorocara) e Surubim hoje município
de Campo Maior.
De acordo com o Pe. Cláudio Melo,
Miguel de Carvalho de Aguiar, natural do Rio São Francisco, Bahia, veio para o
Piauí por volta de 1714, atraído pela vocação do pai, sendo-lhe companheiro
inseparável nos momentos mais duros, partilhando de suas canseiras, angústias e
glórias.
É provável que nesse período Bernardo
de Carvalho e Aguiar tenha aconselhado ao filho a instalar sua primeira fazenda
nas ribeiras do rio Marataoan, uma região de águas abundantes, ricas pastagens,
e distante aproximadamente 16 léguas (imperial) da fazenda Bitorocara. É
razoável presumir-se que o pai tenha vendido ou doado a Miguel de Carvalho
Aguiar uma razoável quantidade gado, bem como autorizado que alguns de seus escravos
e moradores fossem ajudar a instalar uma fazenda na barra do Maratoã, na
localidade Buritizinho, hoje cidade de Barras, onde muito prosperou.
Miguel de Carvalho e Aguiar tornou-se
um abastado fazendeiro da região. Conforme se verifica em seu testamento,
transcrito no livro “Barras, Histórias e Saudades” de autoria do ilustre
barrense Antenor Rêgo Filho, Miguel de Carvalho declara, dentre outras coisas,
ser possuidor de uma grande fortuna:
“Declaro que todo monte de minhas fazendas possuirei
quarenta mil cruzados, pouco mais ou menos, a saber, quatro fazendas, uma
chamada da BARRAS, NA RIBEIRA DO RO MARATAUAN, NO LONGÁ, e outra chamada Campo
(inelegível), e outra chamada São Francisco e outra chamada Arraial, todas na
ribeira do Parnaíba, com terras próprias, com todos os gados vacuns e cavalares
do meu ferro (inelegível), que dentro delas se acharem (inelegível) mais
fábricas a elas pertencentes.
Item: mais ouro e prata e roupas, selas, bancos, mesas e mais trastes que
(inelegível) partes para dentro se acharem.
Item: mais 19 escravos, a saber: ...”.
Miguel de Carvalho tinha a patente de
Coronel e foi construtor da primeira capela de Barras do Marataoan, onde foi
sepultado. Conforme Wilson Carvalho Gonçalves, no seu dicionário já citado, o
início da construção dessa capela ocorreu em meados do século XVIII sob a
invocação de Nossa Senhora da Conceição. Gonçalves diz ainda que esse templo
foi a célula geradora do povoamento da localidade, em redor do qual se formaram
os primeiros sítios, currais e fazendas. A igreja foi, portanto, a primeira
forma de ocupação da povoação de Barras do Marataoan.
Em abril de 1730, morre seu pai
Bernardo de Carvalho e Aguiar, no Maranhão, muito pobre e como muitas dívidas. O
Pe. Cláudio Melo afirma que, por razões desconhecidas, Miguel de Carvalho
abandonou o pai, no final de sua vida, deixando-o em extrema pobreza. O Coronel
Miguel sente a morte do pai, ao tempo em que lamenta que uma riqueza imensa se
diluiu e se transformou em dívida. Sobre esse fato, apenas declarou:
“Nada herdei, por isso não sou obrigado a
pagar seus débitos”.
Em seu livro, Antenor Rêgo Filho
observa que conta a lenda que um vaqueiro, andando a procura de uma rês desgarrada,
encontrou uma pequena imagem de Nossa Senhora da Conceição, talhada em madeira,
dentro de uma moita de tucum, localizada onde hoje está erguida a igreja matriz
de Nossa Senhora da Conceição, em Barras. Salienta ainda que o Coronel Miguel
de Carvalho e Aguiar, como fervoroso católico, deu início à construção de uma
capela em homenagem à mencionada Santa. Antes da conclusão da referida
construção o Cel. Miguel de Carvalho veio a falecer, deixando parte da sua
fortuna para um sobrinho de nome Manoel da Cunha Carvalho, filho de sua irmã
Antônia de Carvalho Aguiar que morava na Bahia. O inventário de Miguel de
Carvalho e Aguiar, datado de 9 de dezembro de 1749, revela que este não teve
filhos:
“Declaro que sou casado na cidade da Bahia
com dona (inelegível), da qual não tenho filhos nem outros alguns herdeiros
forçados, e depois de casado, pouco meses, vieram os parentes da dita minha
mulher e a tiraram violentamente de minha casa, com tudo quanto tinha trazido
de seu para meu poder e até o presente, não tenho feito vida material com ela.
Os motivos da separação do Coronel
Miguel de Carvalho e Aguiar com sua esposa são desconhecidos.
Alguns anos após a morte de Miguel de
Carvalho, seu herdeiro Manoel da Cunha Carvalho deu continuidade à construção
da capela.
Diz também Antenor Rêgo Filho que, em
1804, ao redor da capela de Nossa Senhora da Conceição já existiam algumas
casas de telhas e várias de palha. A dois de abril desse mesmo ano morre Manoel
da Cunha Carvalho, então dono de imensa quantidade de terras, herdadas, do tio,
deixando, em testamento, para Nossa Senhora da Conceição, uma vasta gleba de
terra, compreendendo uma légua em quadra, exatamente onde se localizava a
capela recém-construída, e a fazenda Buritizinho, incluindo mais, todo o gado
bovino e demais animais e benfeitorias. Daí a razão porque todas as terras onde
se localiza a sede do município de Barras pertenciam ao patrimônio da paróquia
de Nossa Senhora da Conceição.
Com o falecimento de Manoel da Cunha
de Carvalho, é nomeado Francisco Borges Leal Castelo Branco para a administração
do patrimônio da paróquia de Nossa Senhora da Conceição.
Em 1806, conclui-se a reforma e
pintura da capela, iniciando-se, assim, o povoamento da localidade. A fazenda
Buritizinho dava lugar à “POVOAÇÃO DAS BARRAS”. Três anos depois, existia já um
arruamento de várias casas, onde já havia um desenvolvimento da povoação; registra
Antenor Filho.
Segundo ainda Antenor Filho, em 22 de
agosto de 1819, Francisco Borges Leal foi substituído por José Carvalho de
Almeida, filho de Barras. E foi por iniciativa desse novo administrador, que o
Presidente da Província do Piauí, em data de 27 de setembro de 1826, solicitou
ao Governo Imperial a criação de uma Freguesia no povoado de Barras, e sua
elevação à categoria de Vila. Pela Lei Provincial de nº 656, de 2 de setembro
de 1836 e a Instrução da Presidência da Província, de 9 de setembro do mesmo
ano, foi a povoação erigida a Distrito de Paz.
Barras só veio ser elevada à
categoria de Vila em 24 de setembro de 1841, através da Lei nº 127 e, de fato
instalada, a 19 de abril de 1842.
Finalmente, pelo Decreto nº 01, de 28
de dezembro de 1889, do então Governador do Estado, Gregório Taumaturgo de
Azevedo, ilustre filho de Barras, foi elevada da categoria de Vila para a de
Cidade, com o nome de Barras do Maratahoan.
Assim, a história nos mostra que
Bitorocara tinha uma estreita ligação com a barra do Maratoã, ou seja, com a
minha Barras do Marataoan.
Sobre a
história da minha terra natal, faço aqui uma interrupção estratégica para não
cansar e não provocar tédio aos leitores que, por acaso, se dispuserem,
generosamente, ler esta crônica. Em outra oportunidade, quiçá continue eu a
recontar fatos históricos de Barras do Marataoan.
Maravilhoso o acaso que me colocou defronte esse texto tão rico em detalhes sobre minha amada cidade Barras do Marataoân.
ResponderExcluirParabéns amigo Acoram mais uma vez pela bela descrição do Rio que passa em sua terra. Muito bom. Abr
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