Dia desses
vinha para casa dirigindo o meu carro em meio a um trânsito horroroso quando, repentinamente,
saído do nada, um sujeito me ultrapassou pela direita e, cruzou minha frente. Caso
não tivesse acionado os freios do veículo rapidamente, teria atropelado o sem
noção. Para meu desespero, o homem levava na garupa da sua moto uma mulher, que
deveria ser a sua esposa, e duas crianças mais: uma esmagada entre ele e a
mulher, e outra encarapitada sobre o tanque de combustível do seu veículo. E
ele prosseguiu tranquilamente como se nada tivesse acontecido, sumindo em meio
ao trânsito congestionado. De minha parte, fiquei a agradecer a Deus por,
felizmente, nada de mal ter-lhe acontecido. Mas, ainda demorei-me alguns
minutos até que os nervos me voltassem ao lugar.
Momentos
depois, outro susto. Dois rapazes em uma motocicleta pequena, quase sem forças
para conduzir os dois malucos, atravessaram na minha frente e quase bateram no
carro que trafegava ao meu lado. E ante uma buzinada furiosa do motorista, o
rapaz que trafegava na garupa fez gestos obscenos com as mãos, enquanto o seu
colega furava o sinal vermelho logo mais afrente. Parecia até que o inferno
tinha aberto as suas portas nesse dia e os diabos estavam todos soltos, tal a
loucura que se via no trânsito naquela manhã.
Voltei para
casa imaginando o porquê de tudo isso. Até parece que as pessoas não se
importam de perder a vida em acidentes estúpidos, ocorridos em decorrência da
sua falta dos cuidados mais elementares. Não bastam os idiotas que trafegam em
possantes camionetas, como se tivessem marcado hora com o improvável, ou com a
própria morte. De alguns anos para cá surgiram as motocicletas para
quadruplicar as estatísticas de acidentes de trânsito. Fruto de governos
irresponsáveis, que franquearam as portas do país às indústrias chinesas que
produzem este veiculo de duas rodas, essas máquinas tem entupido os hospitais,
e também as casas funerárias, de jovens ainda na flor da idade. A propósito
disto, outro dia ouvi o diretor do hospital de urgência de Teresina afirmar que
quase 80% das internações ocorridas naquele nosocômio tinha origem nos
acidentes de trânsito. E que cerca de dois terços desses, devia-se a acidentes
ocasionados por motociclistas. É o
apocalipse. Os hospitais não possuem mais vagas para receber portadores de
doenças corriqueiras, como infarto, por exemplo. Os corredores estão repletos
de macas com gente com braços, pernas e cabeças enfaixados, não sobra espaço
para outro tipo de paciente.
Nunca dirigi
uma motocicleta. E transitei na garupa de uma, pouquíssimas vezes. Não confio
em um veículo em que o seu para-choque é a própria testa do condutor. Quando
rapaz, meus três irmãos possuíam moto, e eu um carrinho velho, mas que me
transmitia um pouco mais de confiança. Inquirido por um deles por que não
aceitava dirigir a sua moto, que ele considerava uma coisa muito legal,
respondi-lhe que estava exatamente ali a razão de não querer pilotar o seu
bólido: medo de gostar de andar nele.
Não sou um
inimigo dessas bichas assassinas. Desde que usadas com responsabilidade e por
alguém com um mínimo de conhecimento e responsabilidade. Acho até que elas são
um meio de transporte que, se bem utilizado, é de uma utilidade a toda prova. Diminuiu
distâncias para quem mora no interior, e facilitou o deslocamento de muitos
trabalhadores de casa para o trabalho. Mas, a forma com que muitos a dirigem,
coloca em cheque qualquer serventia que elas possam ter. Isso, aliado à
irresponsabilidade e desídia de quem tem por obrigação fiscalizar o uso delas.
Contudo, além
de não tomar nenhuma providência para diminuir, pelo menos, o número de mortes
pelo uso irregular desse veículo automotor, ainda escancaram as portas da nação
à entrada desses trambolhos provenientes da China. Quase todos os meses se
inauguram uma nova montadora chinesa no Brasil. E as concessionárias que vendem
motos já estão chegando às pequenas cidades do interior, franqueando a venda
delas a quem se dispuser a pagar R$ 100,00 de entrada e espetar o saldo devedor
em até setenta e duas vezes. Seis anos. Quando terminarem de pagar, o diabólico
veículo já terá virado sucata. E o comprador, se ainda estiver vivo, pagou três
motos ao invés de uma que comprou.
O discurso dos
defensores das motos, sobretudo, dos homens do governo, é o de que só reclamam
delas os barões, aqueles que podem comprar carros de luxo. Será? Conversem com
as milhares e milhares de mães que viram seus filhos e filhas partirem para a
eternidade ainda no auge da sua juventude. Ouçam o que tem a dizer os pais de
família que, por não conseguirem segurar os filhos longe dessas bicicletas
motorizadas, hoje choram a sua morte precoce e estúpida.
Sylvester
Howard Roper tinha outra intenção quando inventou a bicicleta acoplada com um
motor a vapor em 1867. Roper foi também a primeira pessoa a morrer sobre uma
motocicleta. Dizem que faleceu ao participar de uma corrida com algumas outras
pessoas. Seus adversários corriam em bicicletas comuns, enquanto ele testava a
sua nova invenção. Seus adversários terminaram a corrida com vida, apesar de
saírem derrotados na pista.
Em minhas
viagens para outros países tenho verificado que poucas pessoas fazem uso da
motocicleta. E quando isso acontece, protegem-se da melhor maneira possível.
Antes que digam que isso só acontece em países ricos, afirmo que certa vez, no
Chile, conversava com o empregado do hotel em que me hospedava, e indaguei-lhe
o porquê de ver tão poucas motocicletas na cidade. Ele me respondeu que num
passado remoto existiam muitas motos trafegando no país. Mas que, como o número
de mortes no trânsito, provocado por motociclistas, havia aumentado
consideravelmente, o Estado havia endurecido as regras para alguém adquirir um
desses bólidos. Não bastava agora, o indivíduo ter dinheiro, tinha que atender a
uma série de exigências até poder comprar uma delas. O Chile é também um país
emergente. Só que as autoridades de lá se preocupam mais com a vida dos seus
habitantes.
Por aqui, nos
espelhamos na Índia, na China e nos países da África. Mas, como sempre, somos
muito criativos: inventamos o moto táxi. Para quem não possui a possibilidade de
se acidentar por não possuir uma moto. Não tardará, e veremos nas ruas das
nossas cidades o tuk tuk indiano. Clamem aos Céus!
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