quinta-feira, 3 de setembro de 2015

É o Salve-se Quem Puder




Dia desses vinha para casa dirigindo o meu carro em meio a um trânsito horroroso quando, repentinamente, saído do nada, um sujeito me ultrapassou pela direita e, cruzou minha frente. Caso não tivesse acionado os freios do veículo rapidamente, teria atropelado o sem noção. Para meu desespero, o homem levava na garupa da sua moto uma mulher, que deveria ser a sua esposa, e duas crianças mais: uma esmagada entre ele e a mulher, e outra encarapitada sobre o tanque de combustível do seu veículo. E ele prosseguiu tranquilamente como se nada tivesse acontecido, sumindo em meio ao trânsito congestionado. De minha parte, fiquei a agradecer a Deus por, felizmente, nada de mal ter-lhe acontecido. Mas, ainda demorei-me alguns minutos até que os nervos me voltassem ao lugar.

Momentos depois, outro susto. Dois rapazes em uma motocicleta pequena, quase sem forças para conduzir os dois malucos, atravessaram na minha frente e quase bateram no carro que trafegava ao meu lado. E ante uma buzinada furiosa do motorista, o rapaz que trafegava na garupa fez gestos obscenos com as mãos, enquanto o seu colega furava o sinal vermelho logo mais afrente. Parecia até que o inferno tinha aberto as suas portas nesse dia e os diabos estavam todos soltos, tal a loucura que se via no trânsito naquela manhã.

Voltei para casa imaginando o porquê de tudo isso. Até parece que as pessoas não se importam de perder a vida em acidentes estúpidos, ocorridos em decorrência da sua falta dos cuidados mais elementares. Não bastam os idiotas que trafegam em possantes camionetas, como se tivessem marcado hora com o improvável, ou com a própria morte. De alguns anos para cá surgiram as motocicletas para quadruplicar as estatísticas de acidentes de trânsito. Fruto de governos irresponsáveis, que franquearam as portas do país às indústrias chinesas que produzem este veiculo de duas rodas, essas máquinas tem entupido os hospitais, e também as casas funerárias, de jovens ainda na flor da idade. A propósito disto, outro dia ouvi o diretor do hospital de urgência de Teresina afirmar que quase 80% das internações ocorridas naquele nosocômio tinha origem nos acidentes de trânsito. E que cerca de dois terços desses, devia-se a acidentes ocasionados por motociclistas.  É o apocalipse. Os hospitais não possuem mais vagas para receber portadores de doenças corriqueiras, como infarto, por exemplo. Os corredores estão repletos de macas com gente com braços, pernas e cabeças enfaixados, não sobra espaço para outro tipo de paciente.

Nunca dirigi uma motocicleta. E transitei na garupa de uma, pouquíssimas vezes. Não confio em um veículo em que o seu para-choque é a própria testa do condutor. Quando rapaz, meus três irmãos possuíam moto, e eu um carrinho velho, mas que me transmitia um pouco mais de confiança. Inquirido por um deles por que não aceitava dirigir a sua moto, que ele considerava uma coisa muito legal, respondi-lhe que estava exatamente ali a razão de não querer pilotar o seu bólido: medo de gostar de andar nele.

Não sou um inimigo dessas bichas assassinas. Desde que usadas com responsabilidade e por alguém com um mínimo de conhecimento e responsabilidade. Acho até que elas são um meio de transporte que, se bem utilizado, é de uma utilidade a toda prova. Diminuiu distâncias para quem mora no interior, e facilitou o deslocamento de muitos trabalhadores de casa para o trabalho. Mas, a forma com que muitos a dirigem, coloca em cheque qualquer serventia que elas possam ter. Isso, aliado à irresponsabilidade e desídia de quem tem por obrigação fiscalizar o uso delas.

Contudo, além de não tomar nenhuma providência para diminuir, pelo menos, o número de mortes pelo uso irregular desse veículo automotor, ainda escancaram as portas da nação à entrada desses trambolhos provenientes da China. Quase todos os meses se inauguram uma nova montadora chinesa no Brasil. E as concessionárias que vendem motos já estão chegando às pequenas cidades do interior, franqueando a venda delas a quem se dispuser a pagar R$ 100,00 de entrada e espetar o saldo devedor em até setenta e duas vezes. Seis anos. Quando terminarem de pagar, o diabólico veículo já terá virado sucata. E o comprador, se ainda estiver vivo, pagou três motos ao invés de uma que comprou.

O discurso dos defensores das motos, sobretudo, dos homens do governo, é o de que só reclamam delas os barões, aqueles que podem comprar carros de luxo. Será? Conversem com as milhares e milhares de mães que viram seus filhos e filhas partirem para a eternidade ainda no auge da sua juventude. Ouçam o que tem a dizer os pais de família que, por não conseguirem segurar os filhos longe dessas bicicletas motorizadas, hoje choram a sua morte precoce e estúpida.

Sylvester Howard Roper tinha outra intenção quando inventou a bicicleta acoplada com um motor a vapor em 1867. Roper foi também a primeira pessoa a morrer sobre uma motocicleta. Dizem que faleceu ao participar de uma corrida com algumas outras pessoas. Seus adversários corriam em bicicletas comuns, enquanto ele testava a sua nova invenção. Seus adversários terminaram a corrida com vida, apesar de saírem derrotados na pista. 

Em minhas viagens para outros países tenho verificado que poucas pessoas fazem uso da motocicleta. E quando isso acontece, protegem-se da melhor maneira possível. Antes que digam que isso só acontece em países ricos, afirmo que certa vez, no Chile, conversava com o empregado do hotel em que me hospedava, e indaguei-lhe o porquê de ver tão poucas motocicletas na cidade. Ele me respondeu que num passado remoto existiam muitas motos trafegando no país. Mas que, como o número de mortes no trânsito, provocado por motociclistas, havia aumentado consideravelmente, o Estado havia endurecido as regras para alguém adquirir um desses bólidos. Não bastava agora, o indivíduo ter dinheiro, tinha que atender a uma série de exigências até poder comprar uma delas. O Chile é também um país emergente. Só que as autoridades de lá se preocupam mais com a vida dos seus habitantes.

Por aqui, nos espelhamos na Índia, na China e nos países da África. Mas, como sempre, somos muito criativos: inventamos o moto táxi. Para quem não possui a possibilidade de se acidentar por não possuir uma moto. Não tardará, e veremos nas ruas das nossas cidades o tuk tuk indiano. Clamem aos Céus!

Nenhum comentário:

Postar um comentário