Foto by Carlos Magno |
Quando o interventor maranhense Paulo Martins de Souza Ramos, assinou o
Decreto-Lei nº 820, vivíamos o penúltimo dia de dezembro do ano da graça de
1943. E foi através deste importante diploma legal que passamos da condição de Vila
para a de Cidade. Nascia, assim, o município de Curador, fruto do trabalho
incansável de um grupo de nordestinos que vislumbrou, naquele lugar, ares
propícios para a construção de um venturoso futuro. Às margens da famosa lagoa
fincaram raízes e passaram a erigir a cidade que sonharam para si e para os
seus descendentes. Costumo dizer que entre estes pioneiros não tínhamos grandes
fortunas, ricos fazendeiros ou empresários poderosos, mas tão somente um povo pobre
em busca de um horizonte novo.
Mas a longa espera ainda não terminaria naquele mês. Somente no dia 28
de junho do ano seguinte de 1944, proceder-se-ia a instalação, de fato, do novo
município. A data comemorativa de aniversário da cidade passou a ser a do dia que
antecede àquele destinado a um dos santos festeiros de junho, São Pedro. Não
demoraria também, e através da Lei 208, de 18 de dezembro de 1948, o município
teria o seu topônimo alterado e passaria a se chamar Presidente Dutra, uma
homenagem ao Presidente da República, Eurico Gaspar Dutra.
Na tentativa de resgatar aquele dia festivo para todos os
presidutrenses, veio-me a ideia de publicar algumas informações sobre o período
em que o auspicioso acontecimento se deu. Se regredíssemos no tempo e
pousássemos a nossa nave na Praça da Matriz, logo observaríamos que o nome dela
não era São Sebastião, e que em lugar da igreja portentosa que vemos ali,
existia apenas uma capela simples, construída em adobe cru. O santo padroeiro
também era outro: São Bento. Não encontraríamos ali também o belo prédio do convento
das irmãs; nem os edifícios dos correios e da prefeitura antiga estavam lá. O
da prefeitura, aliás, também não está mais lá. Com o título “Duas fotografias
históricas da Praça São Sebastião”, publiquei aqui, no dia 19 de fevereiro
deste, duas imagens que mostram exatamente como era o largo de São Bento
naquele dia festivo de elevação da cidade.
Como já afirmei em parágrafo anterior, a cidade estava sob intenso clima
do período junino, e por esta razão algumas famílias mais festivas já arrumavam
na parte da frente de casa lenha para as fogueiras em homenagem a São Pedro, festividade
que aconteceria no dia posterior. Algumas até enfeitavam trechos de rua com
bandeirolas e balões de papel de seda. Aquela
noite seria fresca, como todas as noites de junho, e a lua apareceria Crescente
no céu.
O ano de 1944 foi bissexto, e muito tenso,
por conta das notícias que chegavam do continente europeu devastado pela
guerra. E a população ficou sabendo de antemão que o interventor Paulo Ramos
não se faria presente às festividades de elevação da cidade, por duas razões:
primeiro porque não seria politicamente uma boa estratégia, vez que outros
municípios foram criados naquele mesmo período e frequentar um apenas não seria
justo. Depois, no dia seguinte, estaria inaugurando uma importante obra no rio
Mearim: uma ponte flutuante. Enviou, então, um aliado político que ocupava o
cargo de secretário da prefeitura municipal de Vargem Grande para presidir a
solenidade.
Nesse período, como já afirmei, o mundo estava ligado às noticias
veiculadas pelo rádio, pouquíssimos rádios, é bem verdade, sobre o
prosseguimento da 2ª Grande Guerra, conflito que já se arrastava desde 1938 e
que já havia causado a morte de milhões de pessoas. A 06 de junho, por exemplo,
os combatentes aliados haviam desembarcado no litoral da França, na região da
Normandia, data que passou a ser conhecida como o Dia D. Foi, de fato, um
grande feito que principiou a derrocada dos exércitos do bloco inimigo formado
por Alemanha, Itália e Japão, os chamados países do Eixo.
Nesse mês de junho também a população do Brasil inteiro vivia a
expectativa do embarque dos primeiros pracinhas brasileiros para lutar na
Itália. Quatro dias depois da solenidade de elevação de Curador à condição de
município, cerca de 5.096 brasileiros embarcaram no navio americano de
transporte de tropas, o General Mann.
Por aqui, o Maranhão viva momentos de grande aperto financeiro no seu
orçamento, é o que se pode ver no relatório apresentado pelo interventor Paulo
Ramos ao congresso estadual. Vivia também uma época difícil no quesito
exportações, que tinha como principais produtos da sua pauta, o arroz, o
algodão, o babaçu, mas também alguns produtos inimagináveis, como peles de Tejo,
de Cobra, de Gato Pintado e de Onça, e até mesmo Penas de Aves, Rapas de Sola e
Resina de Jatobá, entre outros produtos de somenos importância.
No campo esportivo, o Moto Clube começaria nesse ano a sua escalada rumo
ao heptacampeonato maranhense de futebol, no que pese o Sampaio Correia ter
feito um esquadrão de respeito para jogar aquele campeonato.
Chegado o fim do mês de junho, a novíssima cidade de Curador se agitava
freneticamente, e as pessoas acorriam apressadas pelas ruas poeirentas para o
local em que seria celebrada a solenidade de elevação. De certo, vestiam-se com
as suas melhores roupas. Homens trajando camisas na cor clara, mangas
compridas; mulheres envergando vestidos bem abaixo dos joelhos, rendados. Lá
encontrariam, além do senhor representante enviado pelo interventor federal, também
o prefeito de Barra do Corda, Jamil de Miranda Gedeon, município do qual fomos
desmembrado; participava também da solenidade o deputado pelo PR, Manoel Gomes,
um dos representantes da região na
câmara legislativa estadual, e também o coletor estadual José Lúcio Bandeira de
Melo, que viria ocupar o cargo de primeiro interventor do novo município criado
até a nomeação de um político local.
Dentre os moradores que acorreram ao local do evento, alguns tiveram
seus nomes registrados na história ao assinarem o livro de Ata, instrumento que
documentou a solenidade de elevação da Vila de Curador à condição de cidade.
São eles:
Virgulino Cirilo de
Sousa, Luiz Gonzaga de Sousa, Gil Arruda Léda, Adalberto
Macêdo, Pedro Sereno, Antônio Macêdo, Salomão Soares, Gerson
Sereno, Antônio Alves Quirino, Arlindo Paulo da Silva, Nacôr
Gomes da Silva, Abdon de França, Deusamar Melo Lima, Judite
Rios, Delta Falcão, Francisco Barros, Zilda Barros Menezes,
Valdir Menezes Silva, Eleusina Carvalho Araújo, Frei Gomes,
Joana Lima de Macêdo, Eduardo de Melo Falcão, Josefino Marques
Monteiro, Sebastião Gomes de Gouveia, Cícero Macêdo, João
de Deus Ferreira, Ilídio Fialho, Anastácio Melo, Nelson
Sereno, João Silva, Ataliba Almeida, Ataliba Moreira Lima,
Pedro Neto, Miguel Araújo de Carvalho, Valeriano Américo de
Oliveira, Áurea Melo Lima, Maria Nogueira, Teresinha
Menezes, Jovina Sousa, Maria da Cruz Menezes, Zilda Araújo
Melo e Ambrozina Barros.
- Os nomes estão na mesma
ordem de assinatura que aprecem na ata lavrada.
É certo também que centenas de pessoas que
estavam presente ao ato não quiseram ou não puderam assinar a histórica Ata como
testemunha. Mas entraram igualmente para a história ao participar daquele ato
cívico de tamanha importância para o Curador.
No período mais festejado pelos nordestinos: o das
“festas-dos-santos-mais-queridos”, o chamado período junino, começava a nossa
caminhada solo, isolados agora do município-tronco, Barra do Corda. Foram
tempos difíceis, de absoluta carência, faltos de tudo o que era mais urgente
para nos tornarmos uma cidade na acepção da palavra. Faltava-nos desde a
experiência para instalar um simples modelo administrativo no novel município,
e até os recursos necessários para viabilizar a construção dos prédios públicos
que abrigariam aqueles a quem escolheríamos para cuidar da administração
municipal.
Carecíamos ainda do instrumental necessário para viabilizar atendimento
de saúde aos nossos residentes, e também de prédios escolar de qualidade para
ministrar as primeiras letras para os nossos cidadãos mais tenros. E para
complicar mais ainda, estávamos a mais de trezentos quilômetros da capital.
Como construir tudo o que precisávamos sem os recursos necessários para
tal, e com um orçamento diminuto e insuficiente? Com determinação e esperança no
futuro, logo descobriríamos através dos nossos próprios erros, lançando mão do
método simples das tentativas. E logo estávamos com os nossos primeiros prédios
públicos construídos. Nossas ruas tomaram um jeito mais urbano, sem aquela
feição de caminho para pedestres. Os moradores começaram a cuidar mais das suas
moradias, levantando casas com um padrão de qualidade mais apurado, e conforto
e habitabilidade visíveis. Em breve a cidade tomaria ares de modernidade.
Recorro a Fernando Pessoa, o insigne poeta português, para encerrar esta
crônica:
DA MINHA ALDEIA vejo
quanto da terra se pode ver no Universo...
Por isso a minha aldeia
é grande como outra qualquer.
Porque eu sou do tamanho
do que vejo
E não do tamanho da
minha altura...
Terra querida, parabéns pelo seu aniversário!
Nenhum comentário:
Postar um comentário