Creation Rute Barros |
José Pedro Araújo
As montanhas(serras),
assim como o mar, possuem um fascínio especial quando pensamos em construir
aquela casinha simples, caiada de branco, com uma varandinha na frente e um
pequeno jardim com flores multicoloridas que se abram o ano inteiro, para o
descanso nos finais de semana. Mais que isso: em volta dessa casinha, gostaríamos
de plantar algumas fruteiras da nossa predileção e, se o sujeito for um pouco
mais exigente, criar algumas poucas vaquinhas de leite e alguns ovinos para
abastecer-nos de leite e de carne, especialmente por ocasião dos churrascos.
Depois é só deitar-se
em uma rede com varandas bem vistosas e apreciar a paisagem que se descortina
gratuita à nossa frente, observando-se lá no fundo algumas serras azuis que se
perdem no horizonte. Pronto, está armado o ambiente sonhado por dez entre dez
brasileiros. Não é preciso lembrar que as regiões serranas são muito famosas
pelo seu clima ameno, chegando mesmo a fazer frio em determinada época do ano.
Como exemplo podemos citar a serra Gaúcha (Canela e Gramado), no Rio Grande do
Sul; da Ibiapaba e da Meruoca, no Ceará, ou mesmo a Serra dos Matões, na região
de Pedro II, no Piauí, como pontos de atração turística que veem aumentar a
cada ano o fluxo de pessoas que procuram essas regiões no período equivalente
ao nosso inverno tropical. Quem já esteve nessas localidades sabe que é de
tirar o fôlego a paisagem que costuma se formar nesses locais.
Comecei essa crônica
falando das grandes elevações existentes em outros estados, para dizer que, no
que pese não nos situarmos em uma região montanhosa, temos também as nossas
serras, como a do Criolí, a serra dos Poços e a da Boa Vista, que são muito pouco exploradas por nós. Nesses
lugares, posso afirmar com absoluta certeza, o clima é bem mais apetecível do
que o temos na cidade, e chega a fazer um friozinho gostoso nos meses que vão
de maio a agosto. Mas eu quero me referir aqui é a respeito de um pequeno
morro, uma elevaçãozinha simples mesmo, que tinha um poder de sedução muito
grande quando eu era criança: o Pé-do-Morro.
O chamado
Pé-do-morro, que a maioria dos moradores do meu Curador conhece, é um pequeno
monte que se situa ao norte da cidade, logo depois de outra elevação chamada de
Alto-da-Balança. Quando criança, eu costumava observar da calçada de minha casa
aquela elevação pontuda qual um seio debutante, apontando resoluto para o céu,
coberto por uma vegetação luxuriantemente verde. Era sair na porta de casa,
olhar para a esquerda e lá estava o meu monte Kilimanjaro, eterno, sem neve no
topo, é bem verdade, mas desafiante, a uma distância que me parecia quase ao
alcance das minhas mãos. Demorei muitos anos para conhecer de perto aquele
ícone que me atraia tanto.
Mas, certo dia, em
companhia de um amigo, resolvemos ir caçar Nambu no Pé-do-morro. Saímos de casa
logo depois do almoço. Tempo quente, sol queimando e fazendo com que as árvores
perdessem a maioria das suas folhas, mas era o período ideal para caçar as
nossas Nambuzinhas.
Com uma espingarda
Bate-Bucha e uma capanga com muita munição à tira-colo, botamos o pé-na-estrada
com muita disposição. Caminhamos muito
para chegar até o sopé do nosso morro, aonde chegamos ai por volta das três
horas da tarde. Nunca imaginei que aquele morro que parecia tão perto da minha
casa, ficasse, na realidade, tão distante. Mas a visão daquela elevação tão
perto de mim valeu com sobras o sacrifício de chegar até ali. Fiquei absolutamente
encantado com o porte elevado das árvores que se distribuíam morro acima. E
fiquei ali parado, observando aquele acidente natural que sempre me pareceu tão
desafiante, a ponto de perder o contato com o meu colega de caçada, e quase me
perder.
Noviço na profissão
de caçador, não cheguei a disparar um único tiro nas Nambus, que, ao ouvirem o
barulho que eu fazia na folhagem seca, levantavam vôo antes que eu pudesse me
aproximar delas. Analisando hoje o ocorrido, com a consciência que possuo em relação
à preservação da nossa fauna e flora, voltei da caçada com um lucro enorme: não
consegui abater nenhum daqueles pássaros, mas conheci um dos lugares mais
bonitos que eu já vira até então. O que não entendo é o porquê de não merecer
de nós um nome próprio, continuando a ser conhecido como Pé-do-morro,
simplesmente.
Há algum tempo atrás,
em companhia de um irmão, fomos de carro até a sede de uma fazenda que fica no
sopé daquele morro. E, para desgosto meu, vi que toda aquela vegetação
majestosa foi derrubada e em seu lugar plantaram-se capim. Que desperdício!
Remover aquelas árvores tão belas, os ipês, os cedros, os angicos, os jatobás e
as sapucaias, ainda por cima para plantar capim em seu lugar! Foi uma péssima
troca, sem se falar que naquele momento cometeu-se um crime ambiental
capitulado em lei, por se tratar aquele local de uma área de PRESERVAÇÃO
PERMANENTE.
A gravura que ilustra
o texto é um trabalho da saudosa Rute Barros, uma das nossas maiores e mais
talentosas artista plástica. Já falecida. Nesse trabalho, ela representou uma
bucólica comunidade rural. O quadro hoje me pertence e embeleza a minha sala de
visitas.
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