segunda-feira, 1 de agosto de 2016

Um Morro Chamado... Pé-do-Morro.

Creation Rute Barros


                                                                                                          José Pedro Araújo

As montanhas(serras), assim como o mar, possuem um fascínio especial quando pensamos em construir aquela casinha simples, caiada de branco, com uma varandinha na frente e um pequeno jardim com flores multicoloridas que se abram o ano inteiro, para o descanso nos finais de semana. Mais que isso: em volta dessa casinha, gostaríamos de plantar algumas fruteiras da nossa predileção e, se o sujeito for um pouco mais exigente, criar algumas poucas vaquinhas de leite e alguns ovinos para abastecer-nos de leite e de carne, especialmente por ocasião dos churrascos.

Depois é só deitar-se em uma rede com varandas bem vistosas e apreciar a paisagem que se descortina gratuita à nossa frente, observando-se lá no fundo algumas serras azuis que se perdem no horizonte. Pronto, está armado o ambiente sonhado por dez entre dez brasileiros. Não é preciso lembrar que as regiões serranas são muito famosas pelo seu clima ameno, chegando mesmo a fazer frio em determinada época do ano. Como exemplo podemos citar a serra Gaúcha (Canela e Gramado), no Rio Grande do Sul; da Ibiapaba e da Meruoca, no Ceará, ou mesmo a Serra dos Matões, na região de Pedro II, no Piauí, como pontos de atração turística que veem aumentar a cada ano o fluxo de pessoas que procuram essas regiões no período equivalente ao nosso inverno tropical. Quem já esteve nessas localidades sabe que é de tirar o fôlego a paisagem que costuma se formar nesses locais.   

Comecei essa crônica falando das grandes elevações existentes em outros estados, para dizer que, no que pese não nos situarmos em uma região montanhosa, temos também as nossas serras, como a do Criolí, a serra dos Poços e a da Boa Vista,  que são muito pouco exploradas por nós. Nesses lugares, posso afirmar com absoluta certeza, o clima é bem mais apetecível do que o temos na cidade, e chega a fazer um friozinho gostoso nos meses que vão de maio a agosto. Mas eu quero me referir aqui é a respeito de um pequeno morro, uma elevaçãozinha simples mesmo, que tinha um poder de sedução muito grande quando eu era criança: o Pé-do-Morro.  

O chamado Pé-do-morro, que a maioria dos moradores do meu Curador conhece, é um pequeno monte que se situa ao norte da cidade, logo depois de outra elevação chamada de Alto-da-Balança. Quando criança, eu costumava observar da calçada de minha casa aquela elevação pontuda qual um seio debutante, apontando resoluto para o céu, coberto por uma vegetação luxuriantemente verde. Era sair na porta de casa, olhar para a esquerda e lá estava o meu monte Kilimanjaro, eterno, sem neve no topo, é bem verdade, mas desafiante, a uma distância que me parecia quase ao alcance das minhas mãos. Demorei muitos anos para conhecer de perto aquele ícone que me atraia tanto.

Mas, certo dia, em companhia de um amigo, resolvemos ir caçar Nambu no Pé-do-morro. Saímos de casa logo depois do almoço. Tempo quente, sol queimando e fazendo com que as árvores perdessem a maioria das suas folhas, mas era o período ideal para caçar as nossas Nambuzinhas.

Com uma espingarda Bate-Bucha e uma capanga com muita munição à tira-colo, botamos o pé-na-estrada com muita disposição.  Caminhamos muito para chegar até o sopé do nosso morro, aonde chegamos ai por volta das três horas da tarde. Nunca imaginei que aquele morro que parecia tão perto da minha casa, ficasse, na realidade, tão distante. Mas a visão daquela elevação tão perto de mim valeu com sobras o sacrifício de chegar até ali. Fiquei absolutamente encantado com o porte elevado das árvores que se distribuíam morro acima. E fiquei ali parado, observando aquele acidente natural que sempre me pareceu tão desafiante, a ponto de perder o contato com o meu colega de caçada, e quase me perder.  

Noviço na profissão de caçador, não cheguei a disparar um único tiro nas Nambus, que, ao ouvirem o barulho que eu fazia na folhagem seca, levantavam vôo antes que eu pudesse me aproximar delas. Analisando hoje o ocorrido, com a consciência que possuo em relação à preservação da nossa fauna e flora, voltei da caçada com um lucro enorme: não consegui abater nenhum daqueles pássaros, mas conheci um dos lugares mais bonitos que eu já vira até então. O que não entendo é o porquê de não merecer de nós um nome próprio, continuando a ser conhecido como Pé-do-morro, simplesmente.

Há algum tempo atrás, em companhia de um irmão, fomos de carro até a sede de uma fazenda que fica no sopé daquele morro. E, para desgosto meu, vi que toda aquela vegetação majestosa foi derrubada e em seu lugar plantaram-se capim. Que desperdício! Remover aquelas árvores tão belas, os ipês, os cedros, os angicos, os jatobás e as sapucaias, ainda por cima para plantar capim em seu lugar! Foi uma péssima troca, sem se falar que naquele momento cometeu-se um crime ambiental capitulado em lei, por se tratar aquele local de uma área de PRESERVAÇÃO PERMANENTE.

A gravura que ilustra o texto é um trabalho da saudosa Rute Barros, uma das nossas maiores e mais talentosas artista plástica. Já falecida. Nesse trabalho, ela representou uma bucólica comunidade rural. O quadro hoje me pertence e embeleza a minha sala de visitas.          

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