quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

Histórias de bebuns, cachaceiros e outros bichos da mesma espécie. (1)

                     José Pedro Araújo

Todos nós temos perdida na mente a lembrança de algum bêbado famoso. O assunto, que pode ser considerado como uma verdadeira tragédia para os familiares do indigitado pé-de-cana, pode se constituir em situações verdadeiramente hilariantes para outros. Da minha infância, guardo a imagem do velho João Tufo a perambular pelas ruas do nosso Curador, amedrontando as crianças com a sua figura caricata, suja, corpo cheio de feridas abertas e purulentas. Esse pobre homem andava rua acima, rua abaixo, cambaleante, cofo nas costas, a pedir esmolas mal o dia começava. Na minha ótica, parecia já estar embriagado quando o sol nascia no horizonte. Nada sei da sua origem, apesar de dizerem ser ele uma espécie de Quincas Berro D’Água, o rei dos vagabundos da Bahia, relatado nos escritos de Jorge Amado. Mas, lembro-me que quando morreu causou grande comoção na sociedade local, já acostumada com a sua figura inofensiva e bonachona.

 Vem da mesma época também outro personagem marcante. Era um negro velho, carapinha branca qual chumaços de algodão, chamado Preto Olegário. Não sei da sua origem também, mas era figura conhecidíssima na cidade. Passava os dias em total estado de embriaguez, batendo às portas de todos os bares da cidade em busca de quem lhe pagasse um copo da cruel para beber. Era comum vê-lo no final da tarde caído em alguma calçada, abraçado com alguns trapos que sempre carregava consigo. E onde caía, ali passava o resto da noite, ao relento e sob o orvalho. Ou banhado pelas torrenciais chuvas que caiam no período invernoso. Vem desse período uma frase com viés racista que se usava quando era colocada uma espiga de milho verde para assar, e ela ficava queimada, deixando à mostra aquela crosta escura: “Ih! o Olegário passou o pé”, afirmavam as crianças, numa alusão à cor da pele do pobre homem. Vez por outra, quando estava incomodando demais, o velho Olegário era recolhido pela polícia e passava a noite em uma das celas da cadeia velha, situada na Praça Diogo Soares. Ali, certa vez, o nosso conhecido “Pé-inchado” dormiu para nunca mais acordar. Foi velado na própria delegacia, onde o vi prostrado sobre uma porta de madeira arrancada de um portal. Foi enterrado como indigente. Ninguém veio lhe reclamar o corpo ou chorar por ele. (Continua no próximo post).

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