(Elmar Carvalho)*
Meia-noite.
Metade Silêncio,
metade solidão.
Atravesso a praça das
Vitórias
Na hora dolorosa das
doze badaladas
Punhaladas que também
me atravessam.
Da casa de doze
janelas
doze donzelas me
espiam com olhares
que são setas de medo
que assustam e
extasiam.
Passadas pesadas
nos assoalhos de
tábuas
dos rugosos sobrados
se confundem
com o batuque tuc-tuc
e
com o atabaque
tac-tac
do meu desengrenado
coração.
A lua se esgueira e
espreita
das frestas das
nuvens.
Os fantasmas caminham
solenes, devagar,
visíveis e
invisíveis,
seres que são e não
são.
No horto do Pé de
Deus
visagens rezam
contritas.
No horto do Pé do
Diabo
assombrações
assombram
bichos e visitas.
À distância a casa da
pólvora
vigia em sua solidez
de pedra bruta.
Nos campanários de
antigas igrejas
algum falecido
sineiro repica
os sinos para si
mesmo.
Uma sonata se evola
de piano que já não
existe.
E persiste por pura
teimosia.
O suicida se insinua
no vão da escada de
vetusto sobrado.
Uma taça de prata
tilinta e se despedaça...
O relógio da catedral
parou no tempo que
continua:
a pátina rói as
bordas
da ferida do
mostrador e
mostra a dor das doze
badaladas.
Negros ainda esperam
abolição
absolvição nas
cercanias do Rosário
pelos pecados que não
pecaram.
As pedras antigas do
calçamento
são percorridas por
sombras
feitas somente de
alumbramento.
O vento que passa
não é vento: é
fru-fru
de saia de pessoa
morta
ou hálito de porta
de casa já demolida.
Da madona lágrimas
escorrem
e chovem sobre os
telhados...
Oeiras navega na
noite
de um tempo que não
termina.
De um tempo sem
medida, fugitivo
de ampulhetas e
relógios.
*Elmar
Carvalho é campo-maiorense, poeta, cronista, contista, critico literário, membro
da Academia Piauiense de Letras, Juiz de Direito aposentado e titular do Blog Poeta Elmar Carvalho.
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